Arnaldo Neto
04/05/2022 19:48 - Atualizado em 04/05/2022 21:14
O juiz Glicério Angioli, responsável interinamente pela 2ª Vara Cível de Campos, determinou a suspensão dos processos administrativos que poderiam culminar na perda dos mandatos dos 13 vereadores de oposição na Câmara de Vereadores, como foi adiantado (aqui) pelo Ponto Final de 20 de abril, na nota “Eremildo, o Idiota (II). A concessão da liminar foi deferida nesta quarta-feira (04), determinando que o presidente da Casa, Fábio Ribeiro (PSD), comprove em 72 horas a suspensão do ato administrativo. A atual Mesa Diretora abriu os processos alegando que os vereadores da oposição faltaram a pelo menos cinco sessões dentro do mês de março, o que feriria o artigo 14 da Lei Orgânica do município. O magistrado, seguindo parecer do Ministério Público, aponta a inconstitucionalidade da lei que dá base aos processos administrativos. Segundo o magistrado, “a perda de mandato legislativo deve seguir regramento nacional” e a não concessão da tutela de urgência neste caso colocaria em risco os mandatos dos vereadores.
A eleição da Mesa Diretora da Câmara teve início no dia 15 de fevereiro. Fábio Ribeiro tinha um documento assinado por mais 12 vereadores, que o apoiariam à reeleição. O número era o suficiente para garantir a vitória. Porém, no plenário, o vereador Maicon Cruz (PSC), que assinou com Fábio, votou em Marquinho Bacellar (SD), assegurando a vitória do líder de oposição. O resultado chegou a ser proclamado. Porém, no dia seguinte, Fábio anunciou que a votação estava suspensa e, posteriormente, a Mesa anulou a votação. O episódio abriu uma das maiores polêmicas no Legislativo goitacá, que se arrasta até hoje.
Em protesto, os vereadores de oposição — Abdu Neme (Avante), Anderson de Matos (Republicanos), Bruno Vianna (PSD), Fred Machado (Cidadania), Helinho Nahim (Agir), Igor Pereira (SD), Nildo Cardoso (União), Luciano Rio Lu (PDT), Maicon Cruz, Marquinho Bacellar, Marquinho do Transporte (PDT), Raphael Thuin (PTB) e Rogério Matoso (União) — começaram a faltar às sessões. E justificaram suas ausências. Ao mesmo tempo, judicializaram o caso, tentando uma liminar (negada, por ora) para retomada imediata das sessões.
Por outro lado, a Mesa Diretora deu início aos processos administrativos contra o grupo dos 13, indeferindo as justificativas dos vereadores de oposição, abrindo espaço para ampla defesa. Os vereadores voltaram a comparecer às sessões, marcadas por muita confusão, e entraram novamente na Justiça, pedido a suspensão dos processos de cassação — que é a liminar deferida nesta quarta. De acordo com o presidente Fábio Ribeiro, em recente entrevista, os processos, no momento, estavam "no armário", enquanto a base tentava um acordo com a oposição, com o objetivo de deixar a retomada da eleição da Mesa para o fim do ano.
A oposição ainda entrou com um requerimento pedindo a destituição do presidente da Casa, Fábio, e do vice, Juninho Virgílio (União). O rito interno do Legislativo está para ser concluído. O acordo entre a oposição e a base previa, também, parar com o andamento dos processos de cassação e de destituição. A medida de urgência concedida pela Justiça deixa a oposição em situação mais confortável, dificultando a já remota possibilidade de acordo na Casa.
Confira um trecho da decisão do juiz Glicério Angioli:
“Observe-se que o 2º réu [a Câmara] lastreia sua decisão com base no artigo 14, inciso III da Lei Orgânica do Município de Campos dos Goytacazes. Contudo, conforme bem explanado pelo ilustre membro do Ministério Público (fls. 8327-8329), não pode o Município legislar a respeito de matéria estranha à sua competência (art. 30, inciso I, da CRFB/88 e artigo 358, inciso I da CERJ), uma vez que o princípio da autonomia e a capacidade de auto-organização dos Municípios não autorizam que as hipóteses de extinção do mandato de vereador, bem como seu processo e julgamento, sejam definidos no âmbito local. Dessa forma, considerando que a instauração dos processos administrativos para extinção do mandato de vereador teve por base hipótese estabelecida em dispositivo inconstitucional, pois no artigo 14 e incisos da Lei Orgânica o Município de Campos dos Goytacazes legislou a respeito de matéria que está disposta no Decreto-Lei n.º 201/67, e, na hipótese dos autos, de maneira diversa, apesar de inexistente interesse local justificador. Patente, portanto, a plausibilidade do direito, uma vez que a perda de mandato legislativo deve seguir regramento nacional. Por outro lado, é certo que protelar a medida poderia causar risco à manutenção dos mandatos dos autores, em caso de prosseguimento dos processos administrativos que venham a culminar com a cassação dos mandatos, o que recomenda ação imediata como forma de prevenir danos graves. A medida é plenamente reversível, considerando que, se afinal improcedente a pretensão, os processos administrativos poderão retomar o seu curso. Ante o exposto, acolho o parecer do Ministério Público e defiro em parte a tutela de urgência requerida e ordeno que o segundo réu suspenda os atos que deram ensejo à instauração dos processos administrativos para cassação dos mandatos dos vereadores, ora requerentes. Tem o réu o prazo de setenta e duas (72) horas para comprovação nos autos acerca do cumprimento desta decisão”.