MP informa que Uenf detectou alteração na água do rio Paraíba
Ingrid Silva 27/07/2024 08:14 - Atualizado em 27/07/2024 09:20
Genilson Pessanha
“O que há, realmente, é a produção de um composto chamado Geosmina (produzido por algas). Sobre esse composto, não existe qualquer coisa, na literatura, que aponte efeitos toxicológicos na população humana, mas ele gera uma alteração no padrão organoléptico (sentido olfativo e também o sabor). O que a gente está vendo é se, junto com isso, não tem outras coisas. Mas, em relação a esse cheiro e o gosto, a substância não produz risco para a população”, declara o pesquisador e professor titular do Laboratório de Ciências Ambientais (LCA) da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (Uenf), Carlos Eduardo de Rezende, sobre a situação de odor e gosto forte em água de Campos. Nessa sexta-feira (26), a concessionária Águas do Paraíba emitiu laudos que comprovam a ausência de Saxitoxina no rio. O Ministério Público do Rio de Janeiro acompanha o caso e já recebeu o relatório parcial.
O caso tem chamado a atenção da população campista desde a última terça-feira (23) e, nessa quinta (25), a concessionária Águas do Paraíba informou que a proliferação de algas no rio Paraíba do Sul é o que tem gerado todo o momento atípico. A informação foi confirmada também pelo biólogo e diretor técnico do Projeto Piabanha, Guilherme Souza. Ele explicou que, sem chuvas e muito sol, as algas realizam mais fotossíntese, acontecendo a proliferação excessiva, o que resulta na produção de Geosmina.

“Planta precisa de sol. Alga é planta, só que fica debaixo d'água. Quando temos um momento como esse, sem inverno, água transparente, pouco volume de água no rio e muito adubo na água, é tudo que a planta quer. Aí tem uma proliferação excessiva naquele ecossistema aquático, que é essa cor verde que está aí. Quanto maior a quantidade de sol que entra naquele sistema, mais ela vai fazer a fotossíntese. Mas, em um rio saudável, ele não fica verde, porque é nutriente limitante: nitrogênio e fósforo”, explicou Guilherme.

Além dos testes feitos pela concessionária Águas do Paraíba, amostras também foram colhidas tanto por pesquisadores do laboratório da Uenf quanto pelo Instituto Estadual do Ambiente (Inea), a fim de investigar possíveis contaminantes. As amostras estão sendo analisadas por laboratórios no RJ e os resultados deverão sair, escalonadamente, nos próximos dias. O Inea informou, através de nota, que já solicitou, oficialmente, que todas as empresas enviem seus resultados de potabilidade para que possam ser analisados pelo Instituto.

Segundo Carlos Eduardo, responsável pelo laboratório da Uenf, as amostras foram enviadas nessa sexta-feira (26) para análise no RJ, onde será avaliada a presença ou não de toxinas na água. Já na universidade, estão sendo analisadas outras coisas, como a possibilidade de metais e pH. Ele ressaltou, ainda, que o pH não obteve alteração brusca e que está dentro de um padrão para esse período. O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) também acompanhou as coletas da Uenf, que aconteceram também na Estação de Tratamento e em algumas residências, e apura a situação no município.
O MPRJ já recebeu o relatório parcial do Laboratório de Ciências Ambientais (LCA), que indicou a presença de organismos "fitoplanctônicos com potencial para produzir substâncias que afetam a qualidade da água". No entanto, por não ser conclusivo, estão no aguardo de novos resultados. De acordo com uma fonte do MPRJ, o órgão foi noticiado informalmente do caso na noite de terça-feira. Já na quarta de manhã, acionou a Uenf para realizar as análises necessárias, buscando uma avaliação científica imparcial e especializada sobre a qualidade da água e, por isso, foi necessária a presença dos agentes acompanhando as coletas.

A Prefeitura de Campos chegou a notificar a concessionária Águas do Paraíba para que apresentasse laudos sobre a potabilidade da água fornecida no município. A informação foi divulgada pelas redes sociais do prefeito Wladimir Garotinho na tarde dessa quinta-feira (25), depois dos moradores reclamarem que a água tem saído das torneiras com cheiro e gosto fortes. No prazo estipulado, a empresa enviou os laudos, que apresentaram a presença das algas.
Em nota emitida na noite dessa sexta-feira (26), a Águas do Paraíba informou que: "A água tratada distribuída à população está em conformidade com os parâmetros da legislação, própria para consumo, e não apresenta nenhum risco à saúde. O relatório emitido pela Uenf confirma a presença de espécies já identificadas pela concessionária e divulgado em comunicado oficial emitido ontem (quinta-feira, 25). Sobre a possibilidade da existência da Saxitoxina, a Uenf foi clara em afirmar que não possui em suas instalações capacidade de realizar tais análises laboratoriais e solicitou que a concessionária disponibilizasse os laudos. Ainda no dia 25 de julho, a concessionária enviou à Uenf, ao Inea e à Prefeitura laudos que traziam de forma explícita a ausência da Saxitoxina. A concessionária acrescenta que, em cumprimento à portaria GM/MS Nº 888, vem monitorando o rio Paraíba do Sul preventivamente a respeito das espécies citadas, bem como os seus derivados metabólitos".
A Folha entrou em contato com o Ibama, mas até o fechamento desta matéria, não obteve resposta.
Noroeste Fluminense
No Rio Pomba, afluente do Rio Paraíba, foi percebida que a coloração da água estava mais esverdeada e com mau cheiro, além de peixes mortos encontrados em Santo Antônio de Pádua, no Noroeste Fluminense. A concessionária Águas de Pádua informou, pelas redes sociais, que o odor apontado pelos clientes é proveniente da proliferação de algas no Rio Pomba. Porém, nada foi falado em relação aos peixes.
Guilherme Souza, doutor em Ecologia e Recursos Naturais e diretor técnico do Projeto Piabanha, disse acreditar que a situação pode ter sido por peixes que já estavam morrendo que foram jogados por humanos, já que a espécie é resistente à qualidade ruim de água.
“Eu me limito a dizer que aqueles peixes que apareceram mortos no Rio Pomba, eu acho que foi ao acaso: alguém secou um tanque lotado de Tilápia e soltou as baldadas de peixe no rio. O pessoal faz isso direto. A tilápia é uma espécie invasora. E soltou. E já estava morrendo e acabou de morrer no Rio. Porque o vídeo apresenta peixes do mesmo tamanho, do mesmo peso aproximado e de uma espécie que é tolerante à qualidade ruim de água. Por que numa situação desfavorável ambiental ia morrer o peixe mais resiliente? E todos do mesmo tamanho?”, explica.
Aumento na procura em depósitos de água
Depósitos de água também tem registrado aumento na demanda do produto devido aos problemas citados, como no Parque Santo Amaro. A proprietária do estabelecimento no bairro, Patrícia da Silva Rodrigues, relatou que foram recebidos pedidos até às 22h da última terça (23), registrando o dobro na procura em relação aos outros dias. E, até às 12h dessa quarta, eles tinham vendido 20 galões, praticamente a quantidade de um dia todo antes da situação.
Com esse aumento registrado, o Procon também foi procurado em relação a denúncias de que alguns comerciantes estariam aumentando o preço da água mineral em virtude da situação do Rio Paraíba do Sul. Porém, as pessoas não chegaram a relatar qual seria o estabelecimento que estaria praticando esse preço abusivo. O órgão pede para que as pessoas informem os estabelecimentos para que a atuação aconteça de maneira a evitar que se propague pelo município.

Desastre de Cataguases
Há 21 anos, aconteceu o desastre de Cataguases, em Minas Gerais, em que uma barragem de rejeitos industriais se rompeu no município, com incalculáveis litros de lixívia negra (resíduo da produção de celulose). O Rio Paraíba do Sul e córregos próximos por 200 km foram contaminados, atingindo também o interior do Rio de Janeiro e deixando 600 mil pessoas sem água. Além disso, diversos peixes e espécies vegetais morreram, assim como ocorreu a destruição de matas ciliares.
O rio chegou a apresentar uma cor muito escura devido a contaminação. Mesmo que a situação atual nem se compare com o grande desastre ambiental, que matou 14 mil peixes piabanha nas regiões Norte e Noroeste Fluminense, é inevitável não lembrar do caso. A informação da quantidade de peixes mortos é do diretor técnico do projeto Piabanha, Guilherme Souza. Segundo o biólogo, o pH da água abaixou de modo a se tornar ácida, levando quase a extinção de algumas espécies, como os surubim-da-paraíba que só não aconteceu devido a captura de três deles pelo projeto. (I.S.)

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