No fim de semana: hora de 'fernandar' em mais um espetáculo escrito por Arlete Sendra
O espetáculo “‘fernandos’ em busca de Pessoa”, além deste final de semana, também será apresentado nos dias 1º, 2 e 3 de novembro. No elenco: Alexandre Ferram, Gaya Paz, Joilson Bessa, Raquel Fernandes e Thiago Eugênio. No centro da temática está Fernando Pessoa, poeta lusitano que viveu entre 1888 e 1935, um dos escritores de maior projeção do idioma português. Sua obra carrega uma das questões mais intrigantes da literatura do século XX: os heterônimos, que foram gestados, paridos, criados e mortos pelo poeta.
A proposta é que o público presencie um grande encontro dos “fernandos”. Com base no texto de Sendra, Rossi concebe um ambiente minimalista, onírico e surrealista, pontuado por referências sonoras e visuais à vida e à obra de Pessoa, como a água, a navegação e o álcool. Nesse espaço, os personagens não saem de cena e, quando não estão dialogando, acompanham o desenrolar dos fatos, como se fossem participantes de um sarau, um evento lítero-teatral.
“Sempre achei que a ficção é um fragmento do real. Vivemos momentos do real que precisam ser ficcionalizados para serem suportados. A leitura me mostrou e me mostraisto. Meu texto “’fernandos’ em busca de Pessoa” quer mostrar que nosso ‘eu’ só gramaticalmente é singular. Dentro de nosso eu moram muitos outros eus que determinam quem somos. E como somos...Fernando Pessoa passou a vida a se procurar. Segundo os estudiosos de sua obra, ele teve aproximadamente 170 heterônimos, ou seja, possíveis outros ‘eus’ que transitavam por seu universo de ser”, explica Alerte.
Segundo ela, sempre procura no seu trabalho de transportar personagens para os palcos mostrar “o outro que não é visto”. E lembra do personagem Sancho Pança, que foi vivido por Pedro Fagundes, para ela, um alter ego de Quixote. “Foi Sancho que ensinou a Quixote que ‘em ninhos vazios, pássaros não cantam’. A luta”, completa.
Para o teatro, Dona Alerte começou a escrever somente após a aposentadoria. Antes, conta, estava centrada no magistério. “E foi acompanhando a vida em seus meandros que penei escrever sobre a mulher. Meu primeiro texto foi “Elas entre nós”. Trata-se de uma conversa entre Lilith, Eva e Pandora, três mulheres em busca da construção de sua vida, mas Eva estragou tudo. E Pandora valia para ela o poder acumulado . Lilith até hoje não é aceita nos espaços sócio-convencionais”, explica.
E não veio do nada: “Pensei: preciso assumir minhas voz e ação femininas. E conversando com Clarice Lispector escrevi “Eu fui Macabéa”. Nordestina, Macabéa sonha o Rio e para ele traz sua determinação. E morre sobre as rodas de seu sonho. Mas o viveu. A personagem ganhou vida através da atriz Rosângela Queiroz.
Como ela sugere ser impossível não ler Machado de Assis, de acordo com ela, Machado tem um olhar próprio sobre a mulher. “Tomei Dom Casmurro, encontrei Capitu (vivida por Katiana Rodrigues), a mulher que tenta romper as linhas para ela traçadas. E aí, o amor se torna seu próprio contrário, e por convenções sociais, o mesmo gesto se torna prazer e se convencionou traição. Ainda não há respostas. Em “Traídas e traidoras somos todas Capitus” a resposta é de cada um”, diz ela.
E ela não parou. Bebeu na vida da mulher Diadorim (personagem interpretada por Adriana Medeiros), nascida, conta Alerte em prosa e verso, “nos cartórios de Guimarães Rosa se perde entre as 600 páginas de ‘Grande sertão: veredas’”. “Sem direito a assumir sua feminilidade, Diadorim, a mulher proibida de mulher se assumir, impregna-se de coragem e, entre jagunços, se torna o mais temível. É a morte a reveladora de seu segredo e quando ‘a Deus dada, pobrezinha’ sela sua vida, as mulheres diadorinas revelam a força de ser, o mundo se estarrece. É preciso eliminar esta força que a tudo e a todos submete. É isto que estamos escrevendo. É só nos ler. E só ler os feminicídios que alimentam o social de nosso cada dia”, ressalta em seu contraponto.
No ano passado, ainda teve no palco, parido de Arlete, o espetáculo “Diário de uma intimidade aberta”, com a atriz Liana Velasco. Para 2025, está em programação, a sensualidade das casas de prostituição. De acordo com a escritora, “que alimentavam as extensões lúbricas dos homens. Paralelamente, Dadá Pereira em sua cozinha, tentava saciar com pão e sopa a fome das mulheres e dos homens que, sem espaços sociais, eram os arquitetos da miséria geradora das favelas sociais”. A obra de José Cândido de Carvalho será o espelho.
“Um ‘fernandar’ se espalha por toda Campos. Todos estão em busca de Pessoa. E ele está ali, no Teatro de Bolso onde se hospedará nos dias 25, 26 e 27 de outubro, às 20h. E espera por você”. É desta forma que a escritora Arlete Sendra, umas das maiores intelectuais de Campos da atualidade, poetisa o lead - a quatro mãos - que chama atenção para o espetáculo “’fernandos’ em busca de Pessoa”, seu texto com direção de Fernando Rossi. Alerte Sendra, Dona Alerte, a libriana de 90 anos mostra completa vitalidade e alimenta a cena teatral de Campos com histórias de aplaudir de pé. Dona de um olhar para o “feminino”, ela deu vida a Capitu (Machado de Assis), Macabéa (Clarice Lispector), Diadorim (Guimarães Rosa) e tantos outros. Para quem acha que essa mulher para, puro engano. Nem estreou “fernandos” e já salta para os textos do nosso José Cândido de Carvalho. Em 2025, chega o “Ponciano de amores Furtado”, com incentivos da Lei Paulo Gustavo, mas essa é outra história...
O espetáculo “‘fernandos’ em busca de Pessoa”, além deste final de semana, também será apresentado nos dias 1º, 2 e 3 de novembro. No elenco: Alexandre Ferram, Gaya Paz, Joilson Bessa, Raquel Fernandes e Thiago Eugênio. No centro da temática está Fernando Pessoa, poeta lusitano que viveu entre 1888 e 1935, um dos escritores de maior projeção do idioma português. Sua obra carrega uma das questões mais intrigantes da literatura do século XX: os heterônimos, que foram gestados, paridos, criados e mortos pelo poeta.
A proposta é que o público presencie um grande encontro dos “fernandos”. Com base no texto de Sendra, Rossi concebe um ambiente minimalista, onírico e surrealista, pontuado por referências sonoras e visuais à vida e à obra de Pessoa, como a água, a navegação e o álcool. Nesse espaço, os personagens não saem de cena e, quando não estão dialogando, acompanham o desenrolar dos fatos, como se fossem participantes de um sarau, um evento lítero-teatral.
“Sempre achei que a ficção é um fragmento do real. Vivemos momentos do real que precisam ser ficcionalizados para serem suportados. A leitura me mostrou e me mostraisto. Meu texto “’fernandos’ em busca de Pessoa” quer mostrar que nosso ‘eu’ só gramaticalmente é singular. Dentro de nosso eu moram muitos outros eus que determinam quem somos. E como somos...Fernando Pessoa passou a vida a se procurar. Segundo os estudiosos de sua obra, ele teve aproximadamente 170 heterônimos, ou seja, possíveis outros ‘eus’ que transitavam por seu universo de ser”, explica Alerte.
Segundo ela, sempre procura no seu trabalho de transportar personagens para os palcos mostrar “o outro que não é visto”. E lembra do personagem Sancho Pança, que foi vivido por Pedro Fagundes, para ela, um alter ego de Quixote. “Foi Sancho que ensinou a Quixote que ‘em ninhos vazios, pássaros não cantam’. A luta”, completa.
Para o teatro, Dona Alerte começou a escrever somente após a aposentadoria. Antes, conta, estava centrada no magistério. “E foi acompanhando a vida em seus meandros que penei escrever sobre a mulher. Meu primeiro texto foi “Elas entre nós”. Trata-se de uma conversa entre Lilith, Eva e Pandora, três mulheres em busca da construção de sua vida, mas Eva estragou tudo. E Pandora valia para ela o poder acumulado . Lilith até hoje não é aceita nos espaços sócio-convencionais”, explica.
E não veio do nada: “Pensei: preciso assumir minhas voz e ação femininas. E conversando com Clarice Lispector escrevi “Eu fui Macabéa”. Nordestina, Macabéa sonha o Rio e para ele traz sua determinação. E morre sobre as rodas de seu sonho. Mas o viveu. A personagem ganhou vida através da atriz Rosângela Queiroz.
Como ela sugere ser impossível não ler Machado de Assis, de acordo com ela, Machado tem um olhar próprio sobre a mulher. “Tomei Dom Casmurro, encontrei Capitu (vivida por Katiana Rodrigues), a mulher que tenta romper as linhas para ela traçadas. E aí, o amor se torna seu próprio contrário, e por convenções sociais, o mesmo gesto se torna prazer e se convencionou traição. Ainda não há respostas. Em “Traídas e traidoras somos todas Capitus” a resposta é de cada um”, diz ela.
E ela não parou. Bebeu na vida da mulher Diadorim (personagem interpretada por Adriana Medeiros), nascida, conta Alerte em prosa e verso, “nos cartórios de Guimarães Rosa se perde entre as 600 páginas de ‘Grande sertão: veredas’”. “Sem direito a assumir sua feminilidade, Diadorim, a mulher proibida de mulher se assumir, impregna-se de coragem e, entre jagunços, se torna o mais temível. É a morte a reveladora de seu segredo e quando ‘a Deus dada, pobrezinha’ sela sua vida, as mulheres diadorinas revelam a força de ser, o mundo se estarrece. É preciso eliminar esta força que a tudo e a todos submete. É isto que estamos escrevendo. É só nos ler. E só ler os feminicídios que alimentam o social de nosso cada dia”, ressalta em seu contraponto.
No ano passado, ainda teve no palco, parido de Arlete, o espetáculo “Diário de uma intimidade aberta”, com a atriz Liana Velasco. Para 2025, está em programação, a sensualidade das casas de prostituição. De acordo com a escritora, “que alimentavam as extensões lúbricas dos homens. Paralelamente, Dadá Pereira em sua cozinha, tentava saciar com pão e sopa a fome das mulheres e dos homens que, sem espaços sociais, eram os arquitetos da miséria geradora das favelas sociais”. A obra de José Cândido de Carvalho será o espelho.