Filme 'Marcos', sobre jovem campista com discalculia, ganha reconhecimento em festivais
Roteirizado e dirigido por Filipe Codeço, campista radicado no Rio de Janeiro, o filme “Marcos” tem sido indicado para festivais no Brasil e no exterior. Na próxima semana, por exemplo, integrará a Mostra Competitiva Nacional do renomado Festival de Cinema de Triunfo, em Pernambuco. Trata-se de uma obra sobre a vida do jovem Marcos Antônio Codeço, também natural de Campos, misturando realidade e ficção para abordar a discalculia (dificuldade de aprendizagem no que se refere à matemática). Estima-se que uma a cada 20 pessoas no mundo seja afetada por esse tipo de distúrbio, seja com sintomas leves ou mais complexos.
Atualmente com 26 anos, Marcos Antônio Codeço reside em Armação dos Búzios desde 2006. Ainda em Campos, aos quatro anos de idade, foi adotado pela arquiteta e urbanista Jeannine Codeço, tia do diretor do filme, que se mudou para Rio das Ostras em 2013, devido a compromissos profissionais, e se estabeleceu em Búzios três anos depois. Menino negro acolhido por uma mulher branca, criado sem distinção quanto aos dois filhos biológicos e os dois enteados de Jeannine, Marcos revelou-se inteligente, mas com uma dificuldade específica em relação aos números.
— Amo o Marquinhos acima de tudo, da mesma forma como a todos os meus outros filhos. E ele é um menino maravilhoso — afirma Jeannine Codeço, carioca, mas filha de campistas. — Por conta da discalculia, o Marquinhos não consegue interpretar muito bem os números. Ele consegue identificar, por exemplo, uma nota de R$ 5, mas, se precisar comprar algo que custa R$ 3, não sabe definir que o troco é de R$ 2. E ele sofre com isso, porque tem consciência, é inteligente. Tanto é que vai conseguindo criar atalhos para viver em sociedade — explica.
Prova da capacidade de socialização de Marcos Codeço é o fato de ele trabalhar como auxiliar de cozinha em um restaurante de Búzios, além de cursar o ensino médio. Seu sonho, contudo, é o de ser ator. Daí a dupla relevância do filme roteirizado e dirigido por Filipe Codeço, pois, além de informar sobre um distúrbio pouco divulgado, também incentiva o protagonista a acreditar em seu potencial.
— Queria uma obra que fosse um ensaio de vida, onde o Marquinhos pudesse vivenciar toda a sua potência e ter a experiência, ainda que na ficção, da autonomia que lhe parece tão distante em seu cotidiano. Ele veria na tela aquilo que ainda não consegue conceber em sua vida. E, claro, acreditamos que, ao fazer isso, poderemos contribuir, ainda que minimamente, com os processos de outras pessoas que tenham a oportunidade de assistir ao filme — afirma Filipe Codeço.
Predominantemente gravado em Búzios, o longa-metragem se situa no período da vida de Marcos Codeço, quando tinha 22 anos, além de usar gravações da infância e da adolescência para se remeter ao seu passado. No elenco, estão o próprio Marcos e pessoas do seu convívio, com o roteiro migrando para o gênero da ficção ao “criar” a morte da mãe do protagonista.
— Minha tia está viva, está tudo certo. Mas, a gente cria esse fato dimensional no filme justamente para abordar a questão da autonomia, que é a grande questão da vida do Marquinhos — explica o roteirista e diretor. — A discalculia dia cria dificuldades concretas para o cotidiano, como ter noção de idade, compreensão do tempo, controle financeiro, identificação de endereços, compromissos no calendário, o preço das coisas. Então, a gente cria um fato ficcional para falar de autonomia, inclusive com minha tia atuando em momentos de lembrança do Marquinhos — acrescenta.
Em janeiro do ano passado, ainda como filme em processo, “Marcos” integrou o WIP Brasil CineMundi, dentro da Mostra de Cinema de Tiradentes, em Minas Gerais. Em junho deste ano, participou do Festival Internacional da Cruz Vermelha e Filmes de Saúde, na Bulgária, inclusive recebendo o prêmio de melhor filme em corte transversal. Agora, estará no Festival de Cinema de Triunfo, com exibição pela Mostra Competitiva de Longa-Metragem Nacional na próxima quarta-feira (30), às 20h30, ficando apto a concorrer nas categorias principais. Além disso, também vai participar da Mostra do Filme Livre, de 14 a 24 de setembro, no Rio de Janeiro. Para o personagem-título, se ver nas telonas é um misto de bons sentimentos.
— É a realização de um sonho. Desde pequeno, eu sempre quis participar de um filme, e o Filipe sempre me incentivou a isso. Está sendo incrível, maravilhoso para mim. Estou muito feliz — enfatiza Marcos Codeço.