102 anos do Mercado: praça da República, novo boulevard e outras mudanças necessárias
Edmundo Siqueira 17/09/2023 09:37 - Atualizado em 17/09/2023 09:54
 
Torre do relógio, inspirada no mercado de Nice, na Riviera Francesa, exatamente ao centro de dois pavimentos térreos. 102 anos do Mercado Municipal de Campos dos Goytacazes
Torre do relógio, inspirada no mercado de Nice, na Riviera Francesa, exatamente ao centro de dois pavimentos térreos. 102 anos do Mercado Municipal de Campos dos Goytacazes / Foto: Edmundo Siqueira
Um mercado municipal, em qualquer cidade, é um organismo vivo. As vivências, as trocas comerciais e aquele ambiente único criado pela coletividade urbana são construídos pelas pessoas que vivem o Mercado, e pelos clientes que o frequentam. Mudar um mercado municipal de lugar não necessariamente altera sua essência.


No caso de Campos, outros três lugares abrigaram o mercado, todos no centro — já foi onde hoje é a Theotônio Ferreira de Araújo, depois no antigo Largo das Verduras, hoje o Chá Chá Chá, e também no antigo Largo do Rocio, em frente onde hoje é a Faculdade de Direito (Uniflu), na Formosa.

O Mercado onde está hoje, desde 1921, atendia a necessidade de proximidade com o canal Campos-Macaé e o rio Paraíba, para a chegada e o escoamento de mercadorias. A feira e o camelódromo chegaram depois, e descaracterizaram o que era o mercado municipal, esmagando o belo prédio de dois pavimentos térreos, separados por uma torre com um relógio no topo, inspirada no mercado de Nice, na Riviera Francesa.

Praça da República

Uma praça de mercado público não deve ter caráter permanente, justamente pelas imposições que trazem o crescimento da cidade. Locais que antes eram propícios para o comércio popular, deixam de ser pela própria dinâmica que a área urbana assume.

Por suas características e perecibilidade de seus produtos, um mercado causa transtorno aos vizinhos, e a mudança de local tradicionalmente é influenciada por isso. Em Campos, as primeiras alterações foram motivadas por decisões higienistas. O local escolhido em 1921 viria organizar o comércio dos feirantes e criar um local de fácil acesso de mercadorias e transporte. Hoje, essas premissas não são mais verdadeiras.

A diferença no caso campista é que o progresso atrapalhou o Mercado; não o contrário. Por sua localização central, diversos outros centros comerciais menores foram se constituindo no entorno do prédio centenário, até que ele ficasse escondido e espremido. Os boxes da feira de peixe e verduras e a cobertura metálica construídos depois, na frente do prédio do Mercado, o deixaram invisível.

Se já é difícil criar pertencimento nos patrimônios que estão visíveis, se torna quase impossível nos que não estão.

Atualmente, a ideia da prefeitura é construir uma nova feira na praça da República, uma área de aproximadamente 15 mil metros quadrados, atrás da Rodoviária Roberto Silveira, e a 200 metros de onde o mercado está hoje.

Pelo projeto, os feirantes só iriam para a nova construção após sua conclusão, onde teria melhores condições de trabalho e acessibilidade de produtos e clientes. Como está hoje, a feira do Mercado Municipal não atende como deveria os feirantes e afasta quem daria preferência aos seus produtos.

Foto: Edmundo Siqueira
Boulevard -
O que aconteceu no Rio dos anos 1960, com a demolição do Mercado da Praça XV (construído em 1907, o mercado da Praça XV abasteceu boa parte da cidade do Rio de Janeiro por mais de 50 anos, e foi demolido em 1962 para que fosse construída uma perimetral) certamente não se repetiria com a visão preservacionista de hoje. Um patrimônio emblemático e histórico como ele seria aproveitado de forma turística e cultural, assim como muitos outros exemplos da capital fluminense, e a própria revitalização da área portuária a partir de 2013.


Em Campos, levar a feira para a praça da República, traria para a cidade um emblemático e histórico patrimônio de volta. O prédio de 102 anos voltaria a ficar visível e faria parte de um incrível — e turístico — boulevard na área onde hoje é a feira, e trazendo muitas possibilidades, inclusive podendo ter ligação com o Parque Alberto Sampaio e a Arena Kapi, apenas atravessando a pista.

Modernidade e turismo sem perder patrimônio e vivências - A oportunidade que se apresenta em Campos é uma relação de “ganha-ganha” — ganham os feirantes, a cidade e os clientes.

Os permissionários do interior do prédio do Mercado podem e devem permanecer após a revitalização, mantendo toda cultura popular, laica e plural daqueles espaços internos e externos do prédio do mercado, porém em condições melhores.

A ideia e o projeto, caso implementado, será transformador de realidades para o Mercado. E ao mesmo tempo, potencializador de tradições e culturas. A mudança é necessária, e como qualquer organismo vivo, o mercado precisa de movimento e mudanças, mas devendo sempre preservar as essências.

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