Arthur Soffiati - Buscando um lugar no mundo
Arthur Soffiati - Atualizado em 02/03/2024 08:48
Arthur Soffiati
Arthur Soffiati / Divulgação
Acompanho a questão ambiental desde 1972, motivado pela Conferência de Estocolmo, promovida no mesmo ano e considerada o marco inaugural das preocupações com o ambiente socioambiental. No final da década de 1960, o historiador britânico Arnold Toynbee escreveu um artigo alertando para o avanço da tecnosfera sobre a biosfera. Até então, ele havia se concentrado nas relações entre civilizações, já mostrando a dominação do mundo pela economia ocidental. Agora, ele percebia que o estilo de vida ocidental globalizado, tanto mental quanto material, explorava demasiadamente a natureza não-humana. A tecnosfera ameaçava a biosfera. Não hesito em considerá-lo o pioneiro da história ambiental.
Ele continuava com as preocupações relacionadas à justiça social, mas alertava para uma nova questão. As revoluções russa, do leste europeu e da China buscavam uma alternativa ao capitalismo no plano social, mas continuavam explorando a natureza excessivamente. Ela, a natureza, era vista como um estoque de matéria e de energia, por um lado, e um depósito de lixo, por outro. Com a Conferência de Estocolmo, as economias capitalistas e as consideradas socialistas continuaram com a mesma postura de exploração excessiva da natureza, de forma nunca dantes vista na história humana.
Os mais esclarecidos começaram a formular posturas de novas relações com a natureza. Os liberais lançaram o livro “Limites do crescimento” e desembocaram no desenvolvimento sustentável. Socialistas e anarquistas foram um pouco mais longe, mas houve relutância. Um grupo independente de socialistas dissidentes entendeu que a humanidade estava diante de um novo desafio: a crise ambiental global. Não bastavam pequenos ajustes na economia capitalista e socialista. Era preciso formular um novo modelo de civilização que promovesse a justiça social e a proteção da natureza. Podemos chamar de ecologistas os pensadores dessa postura.
Assim, definiam-se três posições: capitalismo e socialismo centrados na acumulação de riquezas e na guerra fria, por um lado, e ecologismo por outro. Havia os saudosistas que se retiravam do mundo, buscando estilos de vida alternativos: morar no campo e mudar de hábitos individualmente. Da minha parte, sintonizei-me com o ecologismo. Era uma postura que criticava o capitalismo e o socialismo real, ao mesmo tempo propondo uma civilização que promovesse a justiça social e o respeito aos ecossistemas e às diferentes formas de vida. Não habitamos o mundo para o dilapidarmos, mas para zelarmos por ele.
No entanto, os conceitos de desenvolvimento sustentável, de sustentabilidade e de economia verde prevaleceram. Hoje, poucos se lembram da ousadia dos ecologistas. Não sabemos bem o que é desenvolvimento sustentável porque é um conceito muito amplo. O mundo se tornou muito complexo nos últimos 50 anos. Como salientou o filósofo marxista Slavoj Zizek, não existe mais uma classe que possa conduzir uma revolução para criar um mundo socialista. A vaga esperança deixada por Immanuel Wallerstein de um fim espontâneo para a economia de mercado poderia nos alentar. Sim, tudo passa. Podemos alcançar um futuro promissor ou sombrio. Não ficamos de braços cruzados, mas nos sentimos impotentes.
Mas, analisando os dias atuais, noto que o capitalismo vem reconhecendo a crise ambiental que ele produziu e adotando um discurso a favor da sustentabilidade. Não me parece sincero porque as práticas continuam parecidas às do passado. A transição energética é lenta. A emissão de gases causadores das mudanças climáticas não parece diminuir. As alternativas às fontes fósseis têm se difundido, mas parecem ainda insuficientes. Em síntese, estamos pilotando um Titanic. Sabemos que ele ruma para um iceberg. Estamos tentando evitar o choque, mas não estamos conseguindo ou desejando.
E existem os críticos ao comandante do Titanic. A maioria ainda defende o mundo para o ser humano rico ou pobre. Queremos que os explorados e oprimidos tenham direito à terra, às riquezas sem a devida preocupação com os biomas, ecossistemas e seres vivos. O pobre tem direito de explorar a natureza. Do outro lado, estão as pessoas que adotam postura de respeito ao meio ambiente no plano pessoal. Se todos mudarem de hábitos alimentares, de consumo, de transporte, construiremos um mundo novo.
Ao longo da minha história, tive de fazer opções. Há 50 anos, não me foi possível mudar de hábitos individuais e, ao mesmo tempo, travar lutas ciclópicas em defesa do ambiente como um todo. Hoje, já idoso, não tenho mais energia para manter o mesmo ímpeto de luta dos anos de 1980. Pude, então, promover algumas mudanças nos hábitos de vida, como não comer carne de ave e mamífero, por exemplo. Ao mesmo tempo, percebi que uma mudança geral do mundo é praticamente impossível. Continuarei defendendo os direitos humanos e dos seres vivos em geral. Estes segundos merecem viver. Portanto, cada qual no seu quadrado. Não me convidem para movimentos em prol dos pobres apenas.

ÚLTIMAS NOTÍCIAS