Jefferson Manhães: "Campos não é quintal de ninguém"
Rodrigo Gonçalves, Aluysio Abreu Barbosa, Cláudio Nogueira e Matheus Berriel - Atualizado em 02/03/2024 08:29
Professor Jefferson no estúdio da Folha FM 98,3
Professor Jefferson no estúdio da Folha FM 98,3 / Isaías Fernandes
É apontando falhas do grupo que está e já esteve por várias vezes à frente da Prefeitura de Campos, principalmente na “estagnação econômica”, que o reitor do IFF, Jefferson Manhães de Azevedo, pretende se colocar como um nome do PT na disputa eleitoral ao Executivo campista neste ano. Em uma cidade onde o bolsonarismo deu 63,14% dos votos válidos no segundo turno presidencial de 2022 a Jair Bolsonaro (PL), Jefferson vê no pleito local uma demanda maior do que a polarização. “Não é necessariamente Lula x Bolsonaro, extrema-direita x extrema-esquerda, mas quais são as bandeiras, as prioridades, o eixo central do meu debate público”. Com o discurso de que “Campos não tem dono e não é quintal de ninguém”, e apostando em outros players entrando na disputa, o petista acredita que a possível reeleição, em 1º turno, de Wladimir Garotinho (PP), apontado em pesquisas realizadas em 2023, não se sustentará em outras avaliações. “O prefeito está mais exposto, e todos os outros não se apresentaram. Nesse momento, ele é o mais conhecido, mas tem um campo de disputa. Estou muito esperançoso de que vamos para um bom debate. Todos ganham”, afirmou, citando também como pré-candidata pelo PT, a ex-prefeita de São João da Barra, a deputada Carla Machado, mesmo que hoje esteja impedida de concorrer juridicamente em Campos pela tese do “prefeito itinerante”.
Gestão no IFF — Eu tenho 24 anos de gestão nessa instituição. Fui diretor do campus Centro por duas vezes, o maior campus, onde eu estudei, onde eu sou lotado como professor. Mas, ter sido reitor realmente foi a maior honraria que eu recebi. Tive esse privilégio. Eu peguei o tempo mais difícil dos últimos 30 anos, mas eu olho para trás com orgulho, não me envergonho de nada. E isso é muito importante. Eu me lembro, não só pegamos governos muito difíceis, mas teve uma pandemia com um governo que ajudou a piorar a situação. Nesse tempo, o IFF, com toda a competência, com toda a criatividade de nossas comunidades, de nossos gestores, nós continuamos avançando, chegando àqueles que precisavam, não tínhamos financiamento do governo, então aprendemos a buscar emendas parlamentares (...) Eu entrego o IFF hoje com todas as nossas unidades estruturadas com aquilo que a gente chama do mínimo para ser uma escola, que tem que ter esporte, tem que ter cultura, tem que ter apoio ao estudante, alimentação, tem que ter pesquisa, tem que ter extensão e tem que ter laboratórios, que é sempre um desafio (...) Eu entrego uma instituição com sete mestrados, com um doutorado. Eu sou do tempo como estudante na Escola Técnica que tinham cinco cursos técnicos, hoje, só no campus Centro, nós temos mais de 40 (...) Eu fiz o meu trabalho da melhor maneira que pude, com todos os meus limites, mas acho que avançamos muito.
Vitória da oposição na reitoria — Quando a gente fala assim, parece que nós estamos falando de um universo de uma candidatura que se colocou completamente contrária à gestão. O professor Victor Saraiva é diretor de Cabo Frio e foi sempre um parceiro ao longo de todo esse tempo da equipe de gestão mais ampla e temos uma relação não só pessoal, mas de gestão muito próxima (...) A candidatura do professor Victor apresentou elementos que a comunidade na, média geral, compreendeu que ele representaria melhor essa disputa (...) Então, eu estou aqui torcendo, estou fazendo um papel junto com a nossa equipe de transição, extremamente harmônica, extremamente democrática. Já fui duas vezes com o professor Victor a Brasília. Ele já foi na reunião com os reitores, fiz lá toda uma apresentação.

Fala de Lula sobre Israel —
Eu quero ressaltar as atitudes corajosas do presidente Lula frente a essa carnificina, com amontoados de crimes de guerra, uma relação desigual, onde ontem nós testemunhamos pessoas sendo assassinadas no desespero da fome. Trinta mil pessoas mortas, assassinadas. Um milhão de pessoas deslocadas. Tudo isso crime de guerra. Se pegar qualquer critério internacional, isso é caracterizado como genocídio. Mas, infelizmente, nós estamos num tempo em que o mais importante é a disputa política, especialmente a repercussão aqui no Brasil, que provavelmente não foi a mesma no mundo inteiro, na mesma intensidade (...) Inclusive, esses que defendem... Não é o povo de Israel, é o governo. Não é o povo judeu. É diferente de um governo que tem que ser denunciado (...) E eu percebi que quando o presidente Lula menciona dizendo que o que está acontecendo em Gaza é de uma dor enorme, que isso historicamente... Aí, provavelmente, ele lembrou que o Holocausto foi uma coisa muito forte que aconteceu, e ele cita isso. Estou falando de quem fala de improviso (...) A gente não pode comparar dramas históricos e dores tão avassaladoras. Então, não se deve falar do Holocausto nessas comparações, porque nós não podemos comparar as coisas (...) Então, o presidente, de maneira desnecessária, de maneira que provavelmente vai tomar muito cuidado numa próxima vez... Mas, não foi proposital, ele não está com aquilo construído. Ele lembrou que estava falando de Gaza, mas também o povo judeu sofreu algo muito grave na sua história. Então, ele puxa isso. Agora, as pessoas não estão preocupadas com isso; estão preocupadas com a disputa política, com a narrativa. Nós estamos no tempo não dos fatos, mas no tempo da interpretação dos fatos, da narrativa dos fatos, sem compromisso nenhum.
Bolsonaro na Paulista — Acho que aconteceu na Paulista no domingo ratifica o que vários analistas, inclusive com livros publicados, trabalhos publicados, dizem: que o Brasil, assim como o mundo, está ficando polarizado. E é uma polarização que ultrapassa o limite do debate político. Ele vira praticamente uma identidade. Nós estamos tratando de pessoas que se pertencem. Se percebe coisas que nunca aconteceram na política brasileira. Aconteceram em outras áreas, do campo religioso, muitas vezes até no campo da torcida de futebol, em alguns espaços. Você se identifica, e o outro é completamente estranho a você. Então, a gente sai um pouquinho do racional e vai para um campo que é muito delicado. A polarização no Brasil está cristalizando, com pessoas que se identificam de um lado e de outro de uma maneira difícil de dialogar, em muitos casos olhando o outro como alguém que ameaça a minha identidade. Esse é um campo do que nós estamos vivendo. Então, o que aconteceu na Paulista mostra que o campo da extrema-direita e de pessoas que comungam... E aí, numa perspectiva de algumas bandeiras, muitas delas importantes, que são usadas para fortalecer essa identidade. Está muito claro que há uma força política, há uma vitalidade da extrema direita no Brasil, forte, viva. Vai ser importante nos debates locais agora, em 2024, se preparando para o grande debate de 2026. Isso é claro. Agora, quais são as intenções? (...) Ele quer uma anistia. Ele fala em nome de outras pessoas para ganhar simpatia desse grupo. Mas, ele vai fazer aquilo que sempre quis para sua família. É em nome da família, mas “primeiro a minha família”. Ele quer salvo-conduto para fazer, em nome de uma pactuação... O que está querendo é isso. Mas, a Justiça está muito empenhada... A Polícia Federal... Aquilo ali é sinal de desespero para conseguir fazer uma liberação, porque tudo indica que o ex-presidente Bolsonaro está muito próximo de ser preso. Ele e outros responsáveis por um golpe.

Pré-candidatura a prefeito —
Tenho certeza que o PCdoB, o Partido Verde e um conjunto de outros partidos vão estar junto com o PT nesse debate. Não é uma defesa do Lula ou do Bolsonaro, mas das prioridades, da bandeira, do que eu acredito. Política é isso. Achar que num debate municipal você não vai falar sobre prioridade. O que faz um debate é: o que você vai priorizar com recurso público? Olhando para essa cidade, a partir das suas crenças, da sua história, da sua militância, da sua experiência de vida, das bandeiras que aqueles que estão ao seu lado defendem, o que nós vamos valorizar? Nós vamos valorizar a agricultura familiar, onde tem mais emprego, diversificação da agricultura, ou nós vamos priorizar a concentração de culturas em que sempre são poucos os beneficiados, os donos dessa agricultura? O que nós vamos discutir? Não é um sem o outro, mas no que eu vou colocar mais força? Na educação, o que é importante? É uma educação que, de fato, vai transformar a vida das pessoas, de tempo integral (...) Por exemplo: Campos não tem um mercado de trabalho que consiga absorver as pessoas qualificadas. Isso é estrutural e não mudou nos últimos 25 anos. Mesmo com mais de R$ 33 bilhões de royalties aqui, nós não mudamos.

Economia —
Campos tem uma economia, infelizmente, estruturalmente frágil. Então, esse vai ser o nosso debate. Como é que é um dia depois dos royalties? Nós estamos diante de uma oportunidade, de novo, de royalties, mas vai acabar. Nós temos problemas gravíssimos, estruturais nessa cidade, e é isso que nós vamos trabalhar. O ISS de Campos hoje é menor que o ISS de São João da Barra, um município com 36 mil habitantes. O ISS é um instrumento que mostra um pouco da dinâmica econômica. E é cinco a seis vezes menor do que Macaé. Nosso IPTU aqui foi o que mais cresceu de 2005 para cá, mais de 1200% de crescimento (... ) Estão dizendo que Campus está crescendo 7.6% em 2022... Parece até um crescimento da China, mas foi o município que menos cresceu no Norte Fluminense. Na verdade, não cresceu, está voltando a 2019 (...) É isso que precisa ser dito. Então, passa uma ideia de que eu estou fazendo um esforço muito grande para mudar essa realidade. “O PIB de Campos está entre os cinco maiores do Brasil graças às políticas da Prefeitura”. Não é verdade! É por causa da exploração de petróleo que essa contabilidade entra para a nossa economia (...) Não é pela economia de Campos que nós estamos diminuindo a dependência dos royalties; é porque os royalties, quando diminuem, ocupam um espaço menor. Estamos num momento difícil, e eu estou vendo que as pessoas estão construindo e reproduzindo. A cidade de Campos tem 170 mil pessoas abaixo da linha da pobreza. É esse o discurso que nós vamos ter. O que é prioridade nessa instituição? Isso está atrelado às grandes identidades (...) dizer qual é o projeto de cidade, quais bandeiras vão nortear a visão estratégica de cidade. E isto está ligado ao movimento que você está atrelado. Por exemplo: para mim, Trabalho e Renda é eixo estruturante. Temos que trabalhar com renda e trabalho (...) Vou dar outro exemplo: para mim, agricultura é algo estratégico, porque é isso que vai ajudar a gente a romper esse modelo. O governo Wladimir, de 2005 para cá, foi o que menos investiu em agricultura, tirando Rafael Diniz porque não tinha dinheiro para fazer investimento. Você compara com Rosinha 1, até Rosinha 2, compara com Alexandre Mocaiber... é quase a metade. Estou falando de dados do TCE, orçamentariamente. “Ah, mas tem outras pastas que também usam...”, mas também lá tinha. Habitação popular, zero. Isso é importante. Temos um estudo no IFF de que nós temos um déficit de 15 mil casas populares. Então, isso não é prioridade. Agora, asfaltar... Choveu ontem e você já começa a ver reclamações. É muito barato fazer recapeamento sem nenhuma estrutura interna. Na Pelinca, por exemplo, tinha que fazer uma reestruturação. O que quero dizer é que as bandeiras vão pautar o debate político do próximo ciclo. A economia de Campos, infelizmente, está muito fragilizada. O que mostra um pouco é porque nós executamos R$ 3,3 bilhões no ano de 2023, e isso dá uma sensação de que a economia viveu. É como colocar adrenalina no coração das pessoas. (A economia de Campos) está vivendo de adrenalina, royalties. Está parecendo que está viva, mas, infelizmente, os sinais são muito difíceis, e a gente vai ter que entrar nesse debate.

Carla Machado em Campos —
A possibilidade da candidatura de Carla Machado incomoda profundamente ao grupo que está frente à Prefeitura, a ponto de ameaçar com, talvez, aquilo que eles acham de mais relevante na sua história, que é a própria Rosinha ser candidata naquele território (SJB). Então, parece que é briga de território: “não mexa aqui no meu terreiro, que eu não mexo lá”. Nós temos que acabar com essa ideia de território, de quintal. Campos não é quintal! Campos é muito importante na história nacional pela sua cultura, pelas suas defesas, pelos seus potenciais. Portanto, a gente não é território, não é quintal de ninguém. Não tem dono aqui. Então, nós vamos para esse debate. Eu acho que a Carla incomoda muito, e tenho certeza absoluta de que ela vai estar protagonista neste processo, independentemente do papel que ela tem (...) É esse o temor que as pessoas têm da possibilidade, inclusive, de estarem juntos o professor Jefferson e a Carla Machado. Isso mexe com alguns cenários. Ela hoje é um player importante. Quem dá a palavra final é o Tribunal. Então, enquanto os juízes não derem, e se derem de alguma maneira que for contrária talvez ao anseio da nossa deputada... O que nós vamos fazer enquanto partido: nós estamos juntos, dialogando, construindo, aguardando e sabendo que uma candidatura que tem a Carla Machado incomoda muita gente (...) Nós temos que ter uma cidade republicana. Então, ela vai ser um agente político muito importante, para o desespero daqueles que acham que o jogo está posto, está feito, a cada dia na mídia. É todo dia isso: “É primeiro turno, é primeiro turno”. E eu aprendi que quando uma inverdade é contada muitas vezes, — inclusive os nazistas falam sobre isso —, ela se torna uma verdade. Não vão ganhar pela insistência. Vão ter que ganhar no debate político, no debate de cidade. Nós vamos discutir, dialogar, mostrar quem tem experiência de governança e quem pode mostrar como lida com dinheiro público de maneira proba, com prioridades que de fato sejam prioridades das pessoas, mas olhando para o futuro, para trabalho, para renda. Ninguém quer ficar embaixo da asa de Prefeitura, as pessoas querem ter autonomia (...) As pessoas se submetem a determinadas relações de trabalho que não reconhecem os seus direitos porque não têm emprego, então, estão desesperadas. Essa relação, infelizmente, é o desespero. Por exemplo: aumentou 500% o valor de RPA no orçamento da Prefeitura. Eram R$ 16 milhões em 2021, terminou em 2023 com R$ 90 milhões. O emprego que mais cresce em Campos chama-se RPA.

PT em uma cidade bolsorarista —
Nós temos 100 mil pessoas que, no mínimo, vão dialogar com a gente, porque foi a votação do presidente Lula. Eu tenho certeza absoluta que a campanha que o prefeito fez com o governador para o Bolsonaro, aqui em Guarus, aqui nas regiões, levou alguns votos para o Bolsonaro, mas não quer dizer que são pessoas bolsonaristas. Eu tenho certeza absoluta de que várias pessoas que votaram no Bolsonaro votaram pelas fake news, do medo, de que “a minha casa vai ser tirada pelo PT”, que “vai ter mamadeira não sei de quê lá na escola”, “vai fechar igreja”, “vai acabar com o Pix”.

Wladimir entre governo Lula e os Bolsonaro —
Eu fui gestor, e o gestor tem que dialogar com todo mundo. Não é isso! O Wladimir está mostrando que ele tem uma afeição pelos bolsonaristas. “Mesmo diante de golpe no Brasil, mesmo diante de tudo, eu me aproximo”. Então, é a bandeira. Para mim, o Wladimir é um grande Centrão, com todo o pejorativo dessa palavra e o mal que faz ao Brasil (...). O Centrão adora esse negócio da política e quer estar onde tem um recurso para poder fazer determinadas ações (...) Não é porque o Wladimir aparece na foto com Flávio Bolsonaro ou com a Michele que Campos vai ser prejudicada. Campos vai ser é beneficiada pelo PAC, porque o governo do presidente Lula não é um governo rancoroso, mas um governo democrático, republicano. Nós somos do estado brasileiro; é dinheiro público, não é para as minhas ambições políticas. Portanto, é esse o modelo que a gente quer mostrar. A gente vai fazer política com P maiúsculo nessa cidade. Política de estado!

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