Roberto Dutra: 'Acho muito improvável uma vitória de Eduardo Paes no 1º turno'
Aluysio Abreu Barbosa, Cláudio Nogueira, Gabriel Torres e Mário Sérgio Junior - Atualizado em 19/04/2025 08:41
O sociólogo e professor da Uenf, Roberto Dutra, foi o entrevistado dessa quinta (17) no programa Folha no Ar, da rádio Folha FM 98,3. Pós-doutorando na Universidade de Bremen, Roberto analisou a visita do presidente Lula à Campos na segunda (14), para inaugurar o novo polo da UFF. Partindo deste assunto, o professor comentou a possibilidade do prefeito de Campos, Wladimir Garotinho, ser vice na chapa a governador de Eduardo Paes em 2026, em cenário considerado difícil devido à força do bolsonarismo no estado do Rio. Ele também abordou o governo Lula 3 e a necessidade da Europa em redesenhar seu papel no mundo, tendo em vista as políticas de Donald Trump.
Governo na retranca — “Acho que que o governo pode ganhar a eleição 2026 com o Lula, como pode perder, mas ele vai sempre ganhar num aperto muito grande se ficar só focado no déficit comunicacional, se ele ficar jogando na retranca, para continuar usando a metáfora do futebol. É um governo da retranca, que não tem nada de ousado. É um governo completamente medroso. E isso não se resolve com marqueteiro. Então, a eleição de 2026 é uma eleição perigosa. Na minha opinião, o governo deveria ser ousado, deveria agir à esquerda, até pela própria biografia de Lula mesmo. Deveria pelo menos colocar certos problemas”.
Eduardo Paes — “Não tem como negar. É uma vantagem considerável de Eduardo Paes. Dá para dizer que a preço de hoje, ele é o candidato favorito. Agora, nós não podemos esquecer da força do bolsonarismo no Rio. E também da história recente em que candidatos bolsonaristas ou neobolsonaristas, digamos assim, tiveram uma trajetória de ascensão rápida e imprevisível para muita gente. Então, embora o Eduardo Paes tenha uma vantagem a preço de hoje considerável, isso não significa que não possa surgir o nome bolsonarista. E essa é, a meu ver, a única possibilidade de desafiar Eduardo Paes nessa vantagem que, com o apoio do ex- presidente, que tem uma popularidade muito grande no Estado, consiga sim alavancar a sua concorrência para levar eleição para o segundo turno”.
Primeiro turno improvável — “Acho muito improvável uma vitória de Eduardo Paes no primeiro turno. E, no segundo turno, o Bolsonaro e o bolsonarismo podem ter um peso grande, como já tiveram e outras. Lembramos que os nomes para o Senado, os nomes de Bolsonaro, o próprio governador, nas pesquisas aparece bem. Então é um cenário alvo de favoritismo, mas onde também a reversão é possível pela força do bolsonarismo”.
Desconfiança — “Tenho a impressão, para ser honesto, que o povo do Rio de Janeiro está muito desconfiado com amadores. Por exemplo, Tarcísio não é um amador. Tarcísio tem até pela sua experiência como ministro, como diretor de Ministérios do Transporte da época do governo Dilma. Ele conseguiu ser um candidato em São Paulo que conseguiu, ao mesmo tempo, trazer a base bolsonarista e vender com credibilidade, no bom sentido, uma imagem de gestor competente. Que é algo que Cláudio Castro e Witzel hoje, por exemplo, não conseguiriam fazer ou um candidato que tivesse o perfil parecido dos dois”.
Direita no Rio — “Talvez o Bolsonaro precisasse de um Tarcísio no Rio de Janeiro pra conseguir fazer frente ao Eduardo Paes, que é tido como um administrador muito competente. Então acho que tem esse fator aí. Se o Eduardo Paes tiver como adversário alguém inexperiente, alguém que só tem como capital político a bênção de Bolsonaro, eu acho que é mais fácil pra ele. Agora, se esse abençoado de Bolsonaro tiver, além da bênção de Bolsonaro, uma imagem de competência administrativa, aí sim seria alguém capaz de desafiar Eduardo Paes”.
Cláudio Castro — “Mesmo um governador como o Cláudio Castro, alguém que não tem, digamos, um apelo popular tão grande, embora a aprovação dele, pelo que eu saiba não esteja tão baixa, mas é um homem que não se destaca pela sua retórica. Que não se destaca pela sua inteligência falando em público. É um homem que realmente a gente fica se perguntando como é que chegou a ser governador do Estado? Um homem das sombras, e não estou aqui fazendo nenhum julgamento de valor, mas alguém que parece que, como muitos dizem hoje, de fato sequer governa o estado do Rio de Janeiro mais na prática. Então é impressionante nesse ponto, como que a força ideológica do bolsonarismo se traduz. Só para completar esse primeiro ponto, a fraqueza dos nomes de esquerda. Uma mulher respeitável como Benedita da Silva, que é o principal nome, mas que já está realmente numa fase da vida que é difícil de mostrar a força para concorrer, nome também já testado e derrotado muitas vezes para cargos majoritários. E tirando isso, nós temos aí nomes anódinos, insignificantes do ponto de vista político, como Aniele Franco, por exemplo. Então mostra que realmente no estado do Rio de Janeiro nós não temos mais esquerda. A esquerda morreu”.
Lula em Campos — “Acho que a presença de Lula em Campos é até muito inteligente, eu diria, do ponto de vista político de Lula. Porque Campos é uma ponta de lança do bolsonarismo no Sudeste. E nesse sentido, valendo aí a atualização da frase de Getúlio Vargas, de que Campos representa bem o Brasil, com os seus problemas e alternativas. E o fato de Lula estar em Campos, as dificuldades, enfim, os protestos de grupos bolsonaristas, a insignificância do PT na cidade, o que não é exatamente o caso do Brasil, mas exagera um pouco nisso. As dificuldades de Lula de ter que conter ali as vaias mal-educadas ao prefeito Wladimir mostra bem essa visita. Diria que é uma espécie de um bom aquecimento pra Lula em relação às dificuldades eleitorais que ele vai ter a pouco mais de um ano e cinco meses das eleições de 2026. É um teste, um bom aquecimento. Essa visita marca talvez o início de um processo”.
Situação do PT — “Agora me entristece ver a repetição de padrões políticos por parte do petismo e de Lula. Eu votei em Lula em 2022, voto crítico, mas é um voto. E me deixa muito triste, decepcionado e desesperançoso ver esse olhar fixo no retrovisor. Vir a Campos e falar de Bolsonaro. E aí o petismo, esse petismo descolado das classes populares. Tudo bem que é uma universidade e aí são professores. É uma classe universitária mais, digamos assim, excêntrica. Mas acho que nesse ponto também representa bem as dificuldades do lulismo e do petismo no Brasil, a falta de povo. O Bolsonaro tem uma conexão popular no Brasil, no país inteiro, hoje muito mais forte do que o lulopetismo. E em Campos isso fica muito claro. Essa inauguração, esse evento, não foi uma relação de Lula com os trabalhadores, com as classes populares, mas sim com a fração da classe média e com o petismo que cada vez menos representa o povo”.
Insignificância política — “A atitude do PT no Rio, em Campos, é o retrato do PT no estado como um todo. É uma pirraça de quem é insignificante. Se o Lula pudesse, ele proibia o PT de participar desse ato dele em Campos. É porque ele não pode. Porque o PT não tem a menor significância eleitoral política no estado do Rio. E ainda bem, porque nem para boicotar, nem para incomodar o Wladimir ou o Eduardo Paes, ou quem quer que seja político com o qual o Lula tenha que se aliar no Rio por fora do PT. Porque se ele depender do PT, ele não tem nada no Rio. Essa falta de importância do PT ela pelo menos é tão grande que ela não atrapalha muito. Então, a atitude do Wladimir, sempre se mostrou um excelente negociador, um político muito habilidoso, muito calmo em reagir, pelo menos nos últimos tempos, a esse tipo de pressão. O presidente Lula é muito sabido nisso, nós sabemos, muito jeitoso. Eu acho que é muito fácil, o PT no Rio é aquela criança pirracenta e não conta, que na hora H, na hora do jogo mesmo fica sentado lá com o controle na mão, desligado do videogame”.
Pirraça — “Eles vaiam o Eduardo Paes, que é o principal aliado de Lula, eles vaiaram o Brizola. Nós não podemos esquecer do que foi o PT no Rio de Janeiro na época de Brizola. Eles vaiaram o Brizola o tempo todo. Então é aquela pirraça no sentido assim, Lula é o pai, e eles pedem ‘por favor, dê um lugar pra gente pra jogar’, aquela criança que não joga nada, ruim de bola e fica chorando para o pai dar um lugar para ele no time. O pai é o técnico, mas o pai está interessado em ganhar o jogo e ele não vai dar lugar para a petista nesse time. Então é essa leitura que eu faço, usando a metáfora do futebol, que o Lula gosta muito. Fico feliz até dessa reação, por isso que eu digo, até do ponto de vista político, ela foi muito proveitosa pra Lula”.
Wladimir — “Se sair uma chapa Wladimir e Eduardo Paes, isso é muito bom para Lula. Porque não só você tem um grande aliado na capital. Eu não sei se o Wladimir teria o compromisso de apoiar Lula por ser vice, mas isso é uma questão importante. Mesmo assim, talvez ele tivesse impedido de apoiar o Bolsonaro. E o Wladimir na última eleição, só na última hora declarou apoio a Bolsonaro. Ele nunca foi um bolsonarista, tanto é que os bolsonaristas não gostam dele também”.
Distanciar do PT — “Então acho que é um retrato muito do que o Lula vai ter no terreno bolsonarista. Se o Lula quiser ganhar terreno, algum terreno no Brasil bolsonarista, no Brasil novo, bolsonarista, ele tem que se distanciar do PT. E Campos é um bom teste para isso, um jogo fora de casa, na altitude, digamos assim. Então acho que desse ponto, acho que saiu bem no teste, tanto o Lula quanto o Wladimir”.
Comunicação — “Com a alçada do Sidônio a ministro das Comunicações, ele atacou um problema muito importante, que é o déficit comunicacional do governo. Mas isso é só a parte menor do problema. O diagnóstico de que o problema do governo federal é o déficit de comunicação, ele é um diagnóstico muito parcial e não captura sequer metade da verdade. O problema do governo não é, aí faço minhas as palavras de João Santana, que é amigo e interlocutor de Sidônio, não é o déficit comunicacional, é o superávit comunicacional. É o superávit como comunicacional, para usar a linguagem técnica do marketing político. Nós temos um governo federal que faz animação de auditório e não faz mobilização de massas. A animação de auditório é para combater o déficit comunicacional. É para tentar mostrar aquilo que é feito. O maior problema do governo é que ele fica sempre na defensiva”.
Resolução de problemas — “Só é possível ter um superávit comunicacional quando você realiza a mobilização de massas. E para realizar a mobilização de massas você tem que estar muito antenado nos problemas profundos e estruturais das massas do país. Rapidamente coloco que são dois problemas. O modelo econômico que nós temos hoje é insuficiente para atender as expectativas de melhoria de vida da maioria do nosso povo. É uma contradição que não tem como ser escondida. O governo é incapaz de oferecer aquilo que o povo espera em termos de melhoria de vida, se ele não rever esse modelo. O modelo que privilegia o rentismo e prejudica a produção. O governo tem um projeto de reindustrialização que até caminha lentamente, mas a macroeconomia do país é toda voltada para pagar juros altos e para alimentar o rentismo. O governo é refém, é rendido ao rentismo. É um governo medroso. E, segundo, o modelo político, é a ideia de que não dá para governar se você não ceder tudo ao centrão e a esse jogo obscuro do orçamento secreto e outros vícios mais”.
Europa — “É fato que a Europa precisa construir uma nova arquitetura de segurança. Mas essa nova arquitetura inclui uma pacificação a longo prazo, pelo menos com a Rússia, ou será uma arquitetura contra a Rússia. Do ponto de vista econômico, a ideia predominante na Alemanha hoje é de uma arquitetura na União Europeia, que é comandada pela Alemanha. Ursula von der Leyen, a presidente da Comissão Curopeia é uma alemã do partido do Friedrich Merz. É uma arquitetura de segurança contra a Rússia, mas a Europa está segura a longo prazo com uma arquitetura contra a Rússia? A Rússia sendo aliada dos Estados Unidos. São questões em aberto. E esse é o cenário para Europa toda, muito se espera do que vai ser, do que serão as novas reuniões da Otan, da relação de Friedrich Merz com Trump, com Putin, com a China. Do ponto de vista econômico, eu diria que a situação é um pouco mais é fácil do que do ponto de vista da situação político militar. Porque a Alemanha sempre teve relações econômicas muito fortes com a China. Nunca rompeu essas relações”.
Centro do mundo — “A União Europeia é o continente que mais vai ter que desenhar e revisar o seu papel no mundo. Não dá mais. A Europa vai ter que realmente se reinventar como não sendo o centro do mundo. A Europa deixou de ser o centro do mundo. Isso é muito dolorido pra uma tradição, sem nenhum julgamento de valor eurocêntrica. Apesar de a da Europa não ser o centro militar do mundo, há muito tempo desde o final da segunda guerra o centro militar do mundo é os Estados Unidos. E se a Europa tem alguma relevância militar no mundo, é por causa da Otan e dos Estados Unidos. Nós tivemos no final, o que os europeus e os americanos chamavam de ordem mundial baseada em regras. E, quer dizer, de um modo mais realista, ordem mundial baseada em regras que só eles podiam juntos quebrar”.
Poder desinibido — “Agora, nós temos aquilo que eu chamaria de a volta do poder desinibido. Parou essa conversa de direito, de ordem mundial, agora é o poder desinibido. Quem tem poder, assume que tem e negocia com quem tem. E a União Europeia não pode mais confiar seu futuro em normas que não se sustentam no poder. E o poder, ele não se sustenta no direito, o poder se sustenta na espada. O poder se sustenta na força do Leviatã, como diria Thomas Hobbes. Sem força, não tem poder. Houve um esquecimento do papel military em toda a mentalidade ocidental no pós guerra. Como se a guerra, a força militar, fossem coisas do passado. Ou que tivesse uma relevância em outras partes do mundo. Então, a Europa realmente é muito curioso do ponto de vista civilizacional pra todos nós observar o que será da Europa sob a liderança da Alemanha. Se não houver uma liderança da Alemanha, o destino da Europa a meu ver é muito tenebroso. E o Brasil e a América Latina tem um papel importante a desempenhar nessa relação com uma nova Europa que vai se reinventar’.
Alemanha — “A Alemanha é um país que tem um exército pífio, é risível, pitoresco o exército que é dominado pelo fax. A Alemanha está querendo agora copiar o modelo sueco de incentivo à mobilização. É um tabu aqui a mobilização obrigatória, o recrutamento obrigatório. Não está no contrato da coalizão implementar o recrutamento obrigatório, mas sim um recrutamento voluntário, o que já seria um avanço. Agora a burocracia e a administração, eu ouço dos especialistas militares aqui é que o maior problema da Alemanha hoje é a ausência de uma sabedoria administrativa militar. A Alemanha deixou de ter virtudes bélicas do ponto de vista administrativo e de liderança organizacional, embora tenha virtudes bélicas industriais melhores. O maior problema, diria que não é nem a indústria bélica, é a infraestrutura humana da atividade militar na Alemanha”.

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