ABANDONO: Sob as vigas da minha alma, embaixo das marquises da existência, residem mendicantes de carinho implorando por moedas de afeto neste mundo tão mesquinho.
FÉ: Todos se acham certos, brigam e se ofendem, atacam e, às vezes, se matam. E eu, que só tenho dúvidas, não confio em ninguém.
INSÔNIA: Enquanto o Sol não aparece o silêncio a tudo domina. As pessoas não sabem que dormem acalentadas por tudo aquilo que em mim reside.
NEVOEIRO: Quando nada vejo sigo, ainda assim, pois a vida é um lampejo que, em breve, chega ao fim mas é, também, desejo que trago dentro de mim.
POLÍTICA: Aprendi que os opostos se atraem, para terraplanar a sensatez, e que o amor é moderado enquanto a paixão é uma fé cega e burra. E assim, rotos e esfarrapados, não caminhamos.
PRECIPITAÇÃO: Abri a janela e vi uma nuvem tão solitária quanto eu. Ela me deu um sorriso, mudou de forma e partiu. E eu chovi de solidão.
SAUDADE: Acordei. Faltava um pedaço. Preenchi com fotos e lembranças. Sorri e chorei. Vivi mais um dia. Acordei. Faltava um pedaço...
SOLIDÃO: Somos todos sós justamente porque somos únicos. Só aliviamos a solidão no momento em que nossas Humanidades choram juntas.
DESCOBRIMENTO: Náufrago em mar revolto busco uma ilha qualquer. Não preciso que ela tenha muito basta uma praia e um graveto para que eu descubra palavras na areia.
PESSOA: As pessoas perderam o apreço pela verdade. Como fingidor até entendo mas as mentiras que elas escolhem poderiam ter mais poesia e menos ignorância.
SUICÍDIO: Um suicida subiu no alto de um prédio. Os transeuntes gritaram que saltasse. Ele ouviu, respirou fundo e... Não saltou. Desceu as escadas rindo. Jamais daria alegria à idiotas. Descobriu o sentido de sua vida.
ZUMBIS: Eu tenho medo dos cemitérios que as pessoas carregam. Quando suas assombrações saem das covas a morte brinca sorridente por entre as palavras que elas emitem.
ORAÇÃO: Peço apenas que meus passos sejam versos e minhas atitudes sejam estrofes para que minha vida seja poesia. No mais só agradeço.
NINANDO: Li uma história, daquelas que têm monstros, para o meu filho. Ele perguntou: “- Pai, existem monstros?” Silenciei um momento. Respondi: “-Não filho, durma bem”. Menti. Fui ver o jornal. Insônia.
REFLEXO: Palavras escritas, digitadas ou faladas, são sementes lançadas no fértil terreno das atitudes. Se o mundo é como é existem mais culpados do que imaginamos. Convém uma olhada no espelho.
ROSA: A flor que ali brota em paz meu pranto desfaz no amor que denota.