Campos precisa discutir sua urbanidade, principalmente em ano eleitoral
Edmundo Siqueira 30/05/2024 22:27 - Atualizado em 30/05/2024 22:32
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Daqui a pouco mais de quatro meses estaremos escolhendo os prefeitos e vereadores das cidades brasileiras. Independente do tamanho que possuem, os municípios estarão discutindo as questões que dizem respeito ao cotidiano das pessoas e dos elementos urbanos dos quais precisam conviver.

Campos dos Goytacazes é um município médio. Com uma população aproximada de 500 mil pessoas, uma área efetivamente urbana oferecendo diversos serviços públicos e com algo em torno de 119 habitantes por quilômetro quadrado, a cidade consegue trazer as facilidades da urbanidade, mas também sofre com os problemas que se arrastam.

Como particularidades, Campos apresenta dois fatores fundamentais para pensar seus processos urbanos:

O primeiro é seu tamanho geográfico (4.032 km²), que dificulta o equilíbrio entre o acesso mais amplo aos serviços públicos da área central com a necessidade de estruturar as áreas periféricas. Com 14 distritos e bairros densamente populosos, como Guarus e a Baixada, a cidade precisa encontrar caminhos para integrar todos esses núcleos urbanos e agir no combate à desigualdade, que apresenta números estarrecedores, com cerca de 230 mil pessoas em condição de vulnerabilidade social.

O segundo fator é sua topografia. O que antes era essencialmente uma planície alagadiça, determinada pelo curso das águas do rio Paraíba, de seus afluentes e do mar, hoje é um grande complexo urbano cercado por diversas propriedades rurais, ambos dependentes dos mesmos recursos hídricos, mas que precisaram criar um emaranhado de canais, represas, comportas e diques para conviver.

E ainda há uma visível dependência dos royalties e participações especiais vindos da exploração de petróleo na Bacia de Campos, que precisa ser resolvida com urgência principalmente pela finitude desses recursos. Embora a urgência dessa condição, e ela ter provocado baixo investimento público para a atração de atores econômicos geradores de empregos, como indústria, comércio e tecnologia, que levou a prefeitura a ser a principal empregadora da cidade, Campos carece de resolver seu processo de urbanização antes de pensar em melhorar essa dependência.
Campos dos Goytacazes, quase 500 mil habitantes, orçamento bilionário e o maior município do Rio de Janeiro em extensão.
Campos dos Goytacazes, quase 500 mil habitantes, orçamento bilionário e o maior município do Rio de Janeiro em extensão. / Reprodução


Enquanto não houver soluções definitivas e sustentáveis em transporte público, Campos não terá permitido que a cidade se integre, e com isso aumentando a circulação de pessoas e atraindo gente de fora. Com os riscos que sua topografia traz e o presente desequilíbrio ambiental no mundo, o município não consegue planejar seu crescimento sem antes criar uma política pública voltada aos recursos hídricos, de caráter técnico e permanente, que também será essencial para a prevenção de catástrofes ambientais.

Educação, saúde e segurança pública são essenciais para qualquer cidade, mas são áreas que dependem do Estado e do Governo Federal para funcionar na plenitude. O papel dos municípios, principalmente os de porte médio que estão em crescimento, como Campos, e os que precisam resolver a desigualdade flagrante, como Campos, é cuidar e ordenar sua urbanidade.

Na área central, onde estão os serviços públicos em maior quantidade e qualidade, aconteceu um fenômeno também visto em outras cidades com características semelhantes a de Campos: o comércio se esvaiu do centro histórico e deslocou-se para outras áreas, que acabaram por concentrar nichos comerciais de maior valor agregado. No caso campista, a Pelinca e suas adjacências se firmaram como esse local.
Centro de Campos dos Goytacazes - prédios históricos desapareceram e a praça principal foi descaracterizada.
Centro de Campos dos Goytacazes - prédios históricos desapareceram e a praça principal foi descaracterizada. / César Ferreira - PMCG

É preciso perceber que o comércio e o cuidado urbanístico são interdependentes. Ações que visem definir o zoneamento da cidade, com suas potencialidades, instalação de parquímetros, zeladoria, infraestrutura e ocupação de espaços públicos como praças e patrimônios históricos, estão diretamente ligadas ao sucesso econômico dos comerciantes. Assim como uma área comercial pujante acaba por forçar um processo urbanístico de qualidade. São interdependentes e complementares.

Por isso, definir que uma praça pública subutilizada se transforme em um centro comercial importante, que traga empregos, dê condições dignas aos comerciantes e clientes e ainda descortine patrimônios históricos, é algo perfeitamente legal e viável, pois age em nome do bem coletivo, e que deve ser apoiado. Criticado e adaptado, mas apoiado.

Ruínas do Hotel Flávio, no centro de Campos.
Ruínas do Hotel Flávio, no centro de Campos. / Rodrigo Silveira - Folha1
O chamado “centro histórico” de Campos perdeu muitos de seus elementos de identidade e de seus atrativos, como exemplos clássicos temos o antigo Teatro Trianon e a antiga Santa Casa de Misericórdia, e o Hotel Flávio e a Ao Livro Verde em exemplos mais recentes. Recuperar alguns dos exemplares que sobraram é fundamental.


Além disso, levar opções de moradia para o centro poderá retomar ali o movimento necessário para que comércio e urbanidade cumpram seus papéis em relativa harmonia. Assim como instalar secretarias da prefeitura em prédios históricos da área central, ação que conseguem auxiliar nesses mesmos processos e ainda protegem os patrimônios envolvidos.

Estamos em ano eleitoral, onde somos chamados a escolher o destino dos próximos quatro anos da cidade. Pela regra do jogo democrático, essa escolha define também quais políticas públicas serão implementadas, quais serão descontinuadas, quais serão perenes e o que será definido como prioridade. Urbanidade talvez devesse ser o nome desse jogo.











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