“Medida provisória” é o filme de estreia do ator e roteirista Lázaro Ramos na direção de longas-metragens e é uma adaptação da peça “Namíbia, não!”, de Aldri Anunciação, peça esta dirigida pelo próprio Lázaro para o teatro em 2011.
A história retrata o Brasil em um futuro distópico, em que o governo sanciona uma medida provisória em uma “iniciativa de reparação” pelo passado escravocrata, obrigando todos os cidadãos negros a migrarem para a África na intenção de retornar para suas origens. Essa medida afeta diretamente a vida do casal Capitu (Taís Araújo) e Antônio (Alfred Enoch), e a do seu primo André (Seu Jorge), que vivem juntos em um apartamento e agora precisam lidar com essa situação que vai mudar suas vidas e o país.
Passada em um futuro aparentemente próximo, o filme retrata um Brasil em que a comunidade negra segue em sua resistência e vem conseguindo vitórias significativas. O longa abre com um tom leve, buscando um humor que até surpreende, dada a natureza da obra. Mas, tão logo a medida provisória começa a vigorar, o tom do longa muda drasticamente, mesmo que nunca abandone esse humor por completo.
O roteiro, escrito a oito mãos, traz o autor da peça e o próprio Lázaro como autores, mas o grande problema do filme acontece justamente nessa transposição do texto original para o cinema. Abraçando sua natureza teatral, o filme expõe suas ideias quase que totalmente de forma verbalizada. Tirando a força das imagens, a força imagética da obra é quase inexistente.
Curioso é que, nas poucas cenas em que as imagens são privilegiadas como meio narrativo, elas funcionam, como quando o filme busca, em duas rápidas sequências, estabelecer a sensação de perigo e de alerta do negro dentro da sociedade. Essa oralidade excessiva acaba mastigando muitas informações, enfraquecendo momentos de grande força dramática.
Sem entrar nos aspectos sociais, políticos, financeiros e diplomáticos da situação, o longa nunca consegue alcançar o tom de urgência que os acontecimentos dentro da obra deveriam provocar, introduzindo inclusive elementos narrativos que terminam sem nenhuma função. A prisão e exportação de metade da população do país nunca é sentida em larga escala; nem mesmo as ruas vazias surgem durante o filme.
Os realizadores buscam contar uma história micro dentro dessa situação, uma decisão acertada, mas é uma pena que a grande maioria dos personagens não tenha o mínimo de desenvolvimento. A começar pelos representantes da repressão, que funcionam como os vilões da obra.
As escolhas de Renata Sorrah e Adriana Esteves (duas atrizes reconhecidas por seus papéis como vilãs) se mostram escolhas de elenco pouco inspiradas, já que as duas pouco podem fazer com personagens tão caricatos. Isto vale também para o núcleo dos políticos (desde já, a cena do sorvete de chocolate é uma das piores cenas do ano), caricaturas completas que não funcionam nem como crítica à classe política vigente, outra espécie de caricatura difícil de acreditar.
O trio principal funciona bem melhor. O sempre carismático Seu Jorge quase rouba a cena, funcionando muitas vezes como um desnecessário alívio cômico. Seu personagem é responsável por manter uma espécie de leveza dentro da situação. O casal Antônio e Capitu é o centro moral e dramático da obra, sendo Capitu a personagem mais forte, dona do discurso mais poderoso. Já Antônio é um personagem que vai perdendo sua força durante o desenvolvimento da história, se limitando a ficar preso em seu apartamento, esbravejando pela sacada quando o copo transborda.
Fechando com uma virada absurda, que não encontra justificativa em nada do que foi apresentado anteriormente, “Medida provisória” é um filme de extrema importância e relevância temática, ainda mais por ser realizado por um grupo de artistas reconhecidamente engajados na luta contra o racismo e pela preservação e difusão da cultura negra.
É uma pena que uma obra tão significativa e emblemática termine se afundando em sua verborragia e seu didatismo. É um filme mais importante pela sua existência do que pela forma com que tenta passar sua necessária mensagem.
“Medida provisória” é o filme de estreia do ator e roteirista Lázaro Ramos na direção de longa-metragens e é uma adaptação da peça “Namíbia, não!”, de Aldri Anunciação, peça esta dirigida pelo próprio Lázaro para o teatro em 2011.
A história retrata o Brasil em um futuro distópico, em que o governo sanciona uma medida provisória em uma “iniciativa de reparação” pelo passado escravocrata, obrigando todos os cidadãos negros a migrarem para a África na intenção de retornar para suas origens. Essa medida afeta diretamente a vida do casal Capitu (Taís Araújo) e Antônio (Alfred Enoch), e a do seu primo André (Seu Jorge), que vivem juntos em um apartamento e agora precisam lidar com essa situação que vai mudar suas vidas e o país.
Passada em um futuro aparentemente próximo, o filme retrata um Brasil em que a comunidade negra segue em sua resistência e vem conseguindo vitórias significativas. O longa abre com um tom leve, buscando um humor que até surpreende, dada a natureza da obra. Mas, tão logo a medida provisória começa a vigorar, o tom do longa muda drasticamente, mesmo que nunca abandone esse humor por completo.
O roteiro, escrito a oito mãos, traz o autor da peça e o próprio Lázaro como autores, mas o grande problema do filme acontece justamente nessa transposição do texto original para o cinema. Abraçando sua natureza teatral, o filme expõe suas ideias quase que totalmente de forma verbalizada. Tirando a força das imagens, a força imagética da obra é quase inexistente.
Curioso é que, nas poucas cenas em que as imagens são privilegiadas como meio narrativo, elas funcionam, como quando o filme busca, em duas rápidas sequências, estabelecer a sensação de perigo e de alerta do negro dentro da sociedade. Essa oralidade excessiva acaba mastigando muitas informações, enfraquecendo momentos de grande força dramática.
Sem entrar nos aspectos sociais, políticos, financeiros e diplomáticos da situação, o longa nunca consegue alcançar o tom de urgência que os acontecimentos dentro da obra deveriam provocar, introduzindo inclusive elementos narrativos que terminam sem nenhuma função. A prisão e exportação de metade da população do país nunca é sentida em larga escala; nem mesmo as ruas vazias surgem durante o filme.
Os realizadores buscam contar uma história micro dentro dessa situação, uma decisão acertada, mas é uma pena que a grande maioria dos personagens não tenha o mínimo de desenvolvimento.