Municípios além dos royalties
Joseli Matias 06/10/2024 08:12 - Atualizado em 06/10/2024 08:57
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Plataforma / Divulgação
Tamanhos distintos, vocações diversas, orçamentos diferentes. Cada município tem suas particularidades, mas a maioria das cidades da região Norte Fluminense tem em comum a dependência dos royalties do petróleo e o desafio de superar a submissão do orçamento a esses recursos. O tema não é novo e consta nas propostas de grande parte dos candidatos a prefeito.
O economista Alcimar das Chagas Ribeiro ressalta a importância de pensar a região para o futuro, focando na estruturação de um setor industrial mais relevante, já que hoje esses municípios têm rendas petrolíferas, que, mesmo com diminuição, têm um papel importante no orçamento.
— É preciso que os municípios estruturem um setor industrial mais relevante, com base nos recursos potenciais da região. E esses recursos estão disponíveis na natureza, podendo gerar atividade industrial importante, a partir, por exemplo, da agricultura e pecuária, com ações modernas e cadeias produtivas. Mas, para isso, é necessário inserir conhecimento. O turismo, por exemplo, pode ser integrado com a agricultura. São diversos tipos de turismo que podem ser explorados, como de aventura ou científico, mas tudo depende do conhecimento. Se esses municípios não se atentarem para os recursos existentes e a capacidade de transformá-los em riqueza a partir do conhecimento, eles vão ficar nessas condições que vemos hoje, que não favorecem a competitividade e evolução dessas cidades. Portanto, temos que focar no conhecimento na base, o conhecimento científico — afirmou.
Secretário municipal de Petróleo, Energia e Inovação, Marcelo Neves destaca que Campos tem feito o dever de casa. De acordo com ele, em 2009, a dependência do município pelos royalties e participação especial era em torno de 70%, enquanto outras cidades também pertencentes à Organização dos Municípios Produtores de Petróleo (Ompetro), tinham 90% de dependência, e hoje a arrecadação própria de Campos já alcança 50%.
— Com a crise em 2015 e 2016, quando o petróleo saiu de US$ 118 para US$ 27 o barril, a arrecadação despencou, levando os municípios a se reinventarem, fazendo cortes, se readequando. Campos fez o seu dever de casa e hoje a arrecadação própria e a arrecadação de participações governamentais batem mais ou menos meio a meio. O município tem cortado coisas que não são necessárias e, ao mesmo tempo, arrecadado melhor, não abrindo mão de receitas, conforme no passado, por contar com os royalties — disse.
O secretário ressaltou, ainda, que o setor de serviços cresceu muito em Campos. “A cidade fica ao lado de dois polos industriais, que são Macaé e o Porto do Açu, em São João da Barra. E, como uma cidade que tem mão de obra extremamente qualificada, visto que temos um parque acadêmico de formação de nível superior e nível técnico de excelência, a mão de obra praticamente sai toda de Campos. Então, as pessoas vêm morar em Campos, as melhores escolas nessa região ficam em Campos, assim como academias, creches e supermercados. O setor de serviços na cidade cresceu muito para poder atender a toda essa demanda. E quando o setor de serviços cresce bastante, a arrecadação do município também acaba crescendo. Como as cidades são todas próximas, interligadas, quando uma cresce, vai puxando a outra a reboque”, afirmou Marcelo, reforçando que a economia do município hoje é bem diversificada. “Campos hoje também é um município da energia, sendo o segundo no estado do Rio de Janeiro em geração eletrofotovoltaica. Só não somos o primeiro ainda por conta de limitações da concessionária local”.
Potencial para ultrapassar as receitas dos royalties do petróleo existe com abundância, mas, segundo o superintendente de Petróleo, Gás e Tecnologia de São João da Barra, Wellington Abreu, falta uma integração político-administrativa com propósito regional.
— O ciclo petrolífero está em declínio, não por falta de petróleo, mas pela necessidade que o homem tem em sobreviver. No Brasil, temos reservas, mas não tão prósperas como em outros lugares do mundo. A própria indústria do petróleo já identificou e está focando na energia. São elementos básicos que a humanidade precisa em abundância: energia, alimentos e água potável. Nossa região possui um aquífero imenso, um retrospecto e identidade natural para cana-de-açúcar, que é a matéria para produção de biomassa, biocombustíveis, etanol, e solo fértil para uma diversidade de culturas aliadas. A Uenf pode implementar como polo científico. Sem falar no Porto do Açu, situado em São João da Barra, que pode se tornar o grande portal energético do Sudeste e um dos maiores da América Latina, com foco em hidrogênio verde e indústrias agregadas — destacou.
Aplicação dos recursos é questionada
A aplicação dos recursos do petróleo, entretanto, é questionada pelo ex-reitor do Instituto Federal Fluminense (IFF) e candidato a prefeito de Campos, Jefferson Manhães. Ele afirma que esses valores não se traduziram em desenvolvimento econômico e melhoria da qualidade de vida da população.
— De acordo com o Info Royalties, da Universidade Cândido Mendes, de 1999 até 2021, Campos dos Goytacazes recebeu R$ 30,4 bilhões em royalties e participações especiais. Mas, infelizmente, esses recursos advindos da produção e exploração de petróleo na Bacia de Campos não se traduziram em desenvolvimento econômico e melhoria da qualidade de vida da população. Mais de 150 mil pessoas vivem na pobreza ou extrema pobreza no município — ressaltou Jefferson.
O candidato propõe como solução para o futuro da cidade sem royalties a criação do Fundo Soberano, uma espécie de poupança para financiar projetos estruturantes para o futuro da cidade pós-petróleo, assim como já existe em outros municípios, como Maricá e Niterói, e em países como a Noruega. “Os recursos serão usados para financiamento e garantia das políticas públicas para o desenvolvimento econômico, urbano e socioambiental de curto, médio e longo prazo. Com recursos do Fundo Soberano, vamos incentivar a criação de micro e pequenas empresas de base tradicional e tecnológica, articuladas com o Polo Universitário e de Instituições de Educação Profissional e Tecnológica de Campos dos Goytacazes”, afirma Jefferson.
A Folha da Manhã entrou em contato também com a campanha da Delegada Madeleine para saber sobre propostas para Campos além dos royalties do petróleo, mas não teve retorno.

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