Cinema - Dilema ético
Edgar Vianna Andrade - Atualizado em 25/10/2023 09:14
Frankenstein: terror das trevas” (“Frankenstein unbound”, 1990) é o último filme dirigido por Roger Corman. Ele começou sua carreira de diretor em 1956, com o “O monstro com um milhão de olhos”. Antes disso, fez de tudo nos estúdios. Foi um grande carregador de piano até começar a dirigir filmes de baixo orçamento, péssimos ótimos filmes que o coroaram como o rei dos filmes B. Depois de 1990, ele passou a produzir filmes, mas sempre com forte presença em suas produções. É cabível até dizer que filme produzido por Corman é como se contasse com sua direção.
“Frankenstein: terror das trevas” coloca em evidência a velha questão do dilema ético que levou Mary Shelley a escrever o famoso “Frankenstein ou o Prometeu moderno”, publicado em 1818. O dilema do Dr. Frankenstein, que criou um monstro a partir de fragmentos de cadáveres, volta a ser abordado no futuro. Joseph Buchanan (John Hurt) cria uma arma de destruição em massa sem considerar seus efeitos colaterais no ano de 2031. Num automóvel ultramoderno, ele entra numa brecha do tempo e sai em 1817, na Suíça. Logo encontra o Dr. Frankenstein (Raul Julia), que já havia criado seu famoso monstro. Por vingança, esse monstro (erroneamente chamado de Frankenstein) havia matado o irmão mais novo do seu criador. Uma jovem inocente é acusada do crime e condenada à morte sem que o Dr. Frankenstein se comova e mova uma palha para salvá-la. Mas, Buchanan sai da sua neutralidade e defende a moça. Mesmo assim, ela morre. Paralelamente, Mary Shelley (Bridget Fonda) estava escrevendo a história que a celebrizou. Ela goza de má reputação por ser casada com Percy Shelley e ser amante de Lorde George Byron. Mary é mais que amante. Em suas palavras, enquanto Shelley e Byron defendiam o amor livre, ela o praticava. E seduz o cientista que veio do futuro. Faltou apenas tirar a roupa, como Corman gostava que suas atrizes fizessem.
A grande contradição do roteiro é que Mary escreve uma ficção que já aconteceu na vida real sem saber da sua existência. No filme, Dr. Frankenstein, sua noiva Elizabeth e o “monstro” já existiam quando Mary os imortalizou no seu romance gótico. O “monstro” quer que seu criador lhe dê uma companheira e, na sua violência, mata Elizabeth. Uma turba enfurecida tenta enforcar o cientista do futuro, mas, paradoxalmente, ele é salvo pelo “monstro”. Começa então uma luta entre Buchanan, Frankenstein e sua criatura. Uma aventura no espaço-tempo e em outra dimensão. O “monstro” acaba sendo morto pelo cientista do século XXI depois de intensa luta com ele e seu criador. Ao voltar para seu tempo, Buchanan parece ter aprendido a diferença entre a ciência pragmática e a ética
Roger Corman encerra bem sua carreira de 34 anos como diretor. Para realizar seu último filme, ele contou com orçamento maior do que estava acostumado a trabalhar, o que lhe permitiu contar com um elenco de maior quilate e uma boa fotografia. Mas, incorrigível, ele voltaria aos filmes de qualidade inferior na condição de produtor.

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