Cinema - Carnossauro
Em 1984, Harry Adam Knight, pseudônimo de John Brosnan, publicou a ficção “Carnossauro”. Há quem garanta que Michael Crichton o plagiou em “Jurassic Park”, de 1990. No mínimo, os dois romances foram escritos a partir do novo paradigma das ficções sobre animais extintos. Não cabia mais encontrar um lugar remoto em que os dinossauros (sempre eles) sobreviveram à colisão de um meteoro. Não mais os humanos poderiam existir desde sempre na história da Terra. Agora, a genética reconstrói dinossauros a partir de células vivas que sobreviveram ao tempo.
Corman convidou Adam Simon para efetuar mudanças no roteiro para evitar qualquer acusação de plágio, pois ele já sabia da produção paralela de Spielberg. Brosnan declarou que não reconheceu sua ficção no filme. De fato, o roteiro é confuso, e esta confusão é aumentada pela montagem e edição. Três semanas antes da estreia de “Jurassic Park”, em 1993, “Carnossauro” estreou nos cinemas. Corman não evitou especulações de que teria sido plagiado por Spielberg. No final das constas, Scorsese, Coppola e o próprio Spielberg admiram Corman pelo papel que ele ocupa no cinema norte-americano até hoje. Ele está lúcido com 97 anos.
A história narrada em “Carnossauro” é bastante bizarra. Uma grande empresa explora minérios numa região que já foi habitada por dinossauros. Um grupo de defensores da natureza tenta impedir a atuação da empresa. Um empregado da empresa se envolve afetivamente com uma militante. Uma geneticista cientista (Jane Tiptree) acredita que a era dos dinossauros foi uma espécie de paraíso terrestre. Que os humanos não passam de formigas destruidoras da natureza. Os dinos merecem, portanto, voltar ao mundo, enquanto os humanos devem ser extintos. Ela produz uma virose para causar uma pandemia. O filme começa mostrando um abatedouro de galinhas. A cientista trabalha com o DNA de aves e usa ovos para dar vida aos dinos. Possuída por ideia fixa, ela fecunda mulheres para também gerar dinossauros. A própria cientista sacrifica sua vida ao dar à luz um dino, que rompe sua barriga. Ela quer o fim dos humanos e a recriação de dinossauros no que entende ter sido o paraíso terrestre.
O orçamento do longa girou em torno de US$1 milhão (talvez menos), enquanto o de “Jurassic Park” alcançou US$ 63 milhões. Os répteis de Spielberg já eram produzidos por computação gráfica, enquanto os de Corman eram uma mistura de stop-motion e bonecos animatrônicos ou até mesmo atores usando fantasias de dinossauros. Ray Harryhausen, o grande criador de efeitos especiais em stop-motion, havia se aposentado.
Além das diferenças em termos de qualidade entre “Carnossauro” e “Jurassic Park”, há um outro ponto significativo. Spielberg evita cenas fortes para que o filme possa ser assistido por crianças. Ele sugere que um tiranossauro-rex come um homem pela cabeça sentado num vaso sanitário. Nem mesmo uma gota de sangue obtida num dedo furado ele mostra. Já Corman promove um banho de sangue naquilo que os americanos chamam de “slasher”. Corman também foi bem esperto em contratar a veterana Diane Ladd para o papel da cientista louca, pois sua filha, Laura Dern, fez o papel feminino principal no primeiro “Jurassic Park”. Mãe e filha estão presentes em filmes concorrentes, pelo menos na visão de Corman. A associação entre aves e dinossauros também é bastante acertada em “Carnossauro”.
Corman arrecadou muito mais do que o custo do filme, principalmente nas locadoras (era época do DVD), incentivando uma franquia. No final do filme, os dinossauros são novamente extintos, agora por ação humana, enquanto os infectados pelo vírus são eliminados pelas forças armadas. Mas sempre sobre algum quando se trata de dar prosseguimento a uma história. Diretamente, “Carnossauro” continuou com dois filmes mais. Indiretamente, ele gerou “Raptor” (2001) e “The eden formula” (2006). Corman está presente como diretor executivo em quatro. “Carnossauro” transformou-se num cult, como aconteceu com vários outros filmes dirigidos ou produzidos por Corman. Ele mereceu a classificação de um dos melhores piores filmes já produzidos. Injustiça. Corman dirigiu e produziu piores melhores filmes que “Carnossauro”. Até o subtítulo é original: “extinção é coisa do passado”. Ele bem poderia ser exibido junto com outro, fazendo jus à condição de filme B.