Além dos “abraços” da sociedade civil e de entidades ligadas ao setor cultural promoveram, como forma de apoio à livraria, foi iniciado o movimento SOS Ao Livro Verde, que busca assinaturas da sociedade para encaminhar uma petição aos poderes públicos locais pedindo que seja formada uma “equipe técnica especializada com o objetivo de estudar, avaliar e propor alternativas que impeçam o fechamento de Ao Livro Verde”.
A dívida acumulada pela livraria é de quase R$ 2 milhões. Entre os motivos, estão o esvaziamento do centro histórico da cidade, a crise no mercado de livros e principalmente a diminuição do setor mais lucrativo da empresa nos últimos anos: a venda de material didático, agora comercializado pelos próprios estabelecimentos de ensino, e de escritório.
Há alguns entraves para que a municipalidade entre com apoio direto para recuperação da livraria. O pedido de autofalência que tramita na 5º Vara Cível de Campos, é regido pela Lei de Falências (nº 11.101/2005), e a interrupção ou repactuação do que consta no processo deve ser de iniciativa exclusiva dos proprietários da Ao Livro Verde.
Sem contar que uma possível intervenção da prefeitura, com recursos ou pessoal da municipalidade, poderia ser vista como favorecimento, ou uma afronta ao princípio da impessoalidade que rege a administração pública.
Porém, trata-se da livraria mais antiga do Brasil, estabelecimento comercial que representa algo maior, coletivo e histórico. Garantir a sobrevivência da Ao Livro Verde significa trabalhar efetivamente a memória coletiva — de Campos e do Brasil. É consenso que a preservação de espaços materiais se mostra um dos caminhos mais efetivos de compreensão dos processos históricos de um local.
É preciso entender que a livraria mais antiga do Brasil significa para grande parte dos campistas afetividade, memórias sociais e familiares, um local de construção de memórias e de imaginação que os momentos são capazes de reconstruir. Portanto, é mais que justificável que o poder público — prefeitura, Câmara e judiciário — se debruce sobre o tema.
As legislações que podem servir de âncora
A Lei de Falências, como dito devendo ser usada por iniciativa dos proprietários, prevê em seu artigo 20 “que serão admitidas conciliações e mediações antecedentes ou incidentais aos processos de recuperação judicial”. Ou seja, há caminhos para que a autofalência se reverta, se apresentado plano de recuperação.
Sobre a prefeitura e a Câmara, algumas ações não apenas podem ser empreendidas, como uma obrigação social, mas encontram amparo legal para que aconteçam. Como é o caso da aplicação da Lei Federal 3.365/41, que disciplina o instituto da “utilidade pública” de um bem ou instituição.
Decretar na Câmara a utilidade pública da livraria mais antiga do Brasil é um passo importante para a desapropriação do prédio onde está instalada a livraria Ao Livro Verde há 179 anos. A mesma lei federal oferece a justificativa necessário em seu artigo 5º: “a preservação e conservação dos monumentos históricos e artísticos, bem como as medidas necessárias a manter-lhes e realçar-lhes os aspectos mais valiosos ou característicos e, ainda, a proteção de paisagens e locais” e “a preservação e a conservação adequada de arquivos, documentos e outros bens móveis de valor histórico ou artístico”.
Caso a prefeitura resolva agir, também pode encontrar amparo na Lei 12.244/2010 (Lei da Universalização das Bibliotecas Escolares), promovendo a reabertura da Biblioteca Nilo Peçanha nas instalações da livraria Ao Livro Verde. Ação de extremo valor simbólico — e necessário — para Campos.
Haverá depois?
Para usar uma palavra contemporânea, é preciso pensar na sustentabilidade da Ao Livro Verde, caso ela consiga sair da insolvência. E para ser sustentável, é preciso haver lucro.
Parte da lucratividade pode vir da cessão de espaços na livraria para iniciativas públicas ou particulares que se interessem em explorar um local cheio de história e de localização privilegiada. Terceirizar um café ou restaurante, que funcionasse no interior da Ao Livro Verde, pode significar uma fonte de receita para a empresa. Assim como a manutenção de uma biblioteca pública, mantida pela prefeitura.
Há ainda a possibilidade da ida da livraria para o Palácio da Cultura, equipamento importante de Campos que está subutilizado. Além de ser no coração de um dos bairros mais movimentados da cidade, a adequação e equilíbrio das contas ficariam, evidentemtente, mais fáceis por lá.
Existem caminhos para que o depois de toda essa história não seja o mesmo do Trianon, de fatalidades como o incêndio na Lira de Apolo e no Hotel Flávio, ou da descaracterização da praça São Salvador. É preciso aprender com os erros. A história serve também para isso. Ou deveria.