Congresso conservador toma posse no centrão do atraso
Edmundo Siqueira 31/01/2023 22:00 - Atualizado em 31/01/2023 22:03
Reprodução/Estadão
Amanhã, 1º de fevereiro de 2023, tomará posse o Congresso mais conservador da Nova República. Entre os eleitos estão políticos como Sérgio Moro, Damares Alves, Hamilton Mourão e Carla Zambelli — embora estejam melhores representados no reacionarismo do que no conservadorismo.

Na Câmara, o PL, partido do ex-presidente Bolsonaro, terá 99 cadeiras. No Senado, 14. Se somados aos partidos do chamado Centrão, como União Brasil e PP, pode-se dizer que o controle das casas legislativas não estará com o PT. O novo governo vai precisar fazer o que a democracia brasileira sempre exigiu: coalizão.

O desenho da nossa República exige que o executivo compartilhe poder. Na definição do cientista político Sérgio Abranches, é o “presidencialismo de coalizão”. O que não é maléfico, em essência. Existir uma oposição forte e alinhada com outras visões de mundo, diferentes do governo de ocasião, é um dos pilares da democracia. Fisiologismo e falta de espírito público são desvirtuações constantes, mas que não derivam do compartilhamento do poder, e sim da corrupção política.


Com a composição do novo Congresso, pautas progressistas terão muita dificuldade de prosperar. Temas relacionados aos costumes estarão fadados a receber contornos conservadores, mesmo que propostos em estruturas liberais. Porém, a questão no presidencialismo brasileiro não é ideológica. A distribuição do orçamento é o que define os arranjos.

O governo Bolsonaro optou por delegar à Câmara dos Deputados, centralizado em Arthur Lira, as chaves do cofre. De posse do orçamento secreto, o executivo ficou refém da vontade do legislativo. Como resultado, Lira acumulou muito poder (deverá ser reeleito com facilidade para o comando da Câmara) e fortaleceu o Centrão fisiológico, que depende muito do envio de recursos para suas bases. Em troca, quase 150 pedidos de impeachment contra o ex-presidente ficaram na gaveta.

Ainda em 2022, em uma manobra política sofisticada, Lula conseguiu — com ajuda do STF que julgou inconstitucional o orçamento secreto — diminuir a quantidade de recursos antes destinada sem transparência, e enfraquecer Lira. Mas, sabendo que teria muita dificuldade em retirá-lo da cadeira de presidente, resolveu apoiar a sua reeleição. No Senado o jogo está mais incerto, onde o controle da Casa legislativa pode ficar com Rogério Marinho, do PL.

A importância para o governo em ter aliados na presidência das casas legislativas é estratégica. Além de dificultar que pedidos de impeachment comecem (no caso da Câmara), a pauta do Congresso é definida por esses cargos. Presidentes da Câmara ou do Senado que façam oposição dura, podem emperrar a máquina pública, impedindo que reformas andem, como a necessária reforma tributária.

Em um mundo ideal, caso a República Brasileira se movimentasse em bases realmente republicanas, haveria mais dinheiro disponível nos estados e municípios. A concentração de recursos em Brasília permite que o sistema continue fisiológico e atrasado. É nos municípios que as políticas públicas são necessárias; é nas cidades que os recursos se transformam em ações concretas — água encanada e escolas melhores, por exemplo.

A Câmara Federal costuma ser preenchida por políticos que sabem manejar bem esse sistema, que acabam por servir aos prefeitos e governadores como “despachantes de luxo”. Em uma divisão mais racional de recursos na federação, o legislativo federal estaria mais voltado às pautas nacionais e mais estruturantes. As assembleias legislativas dos Estados teriam mais poder de fogo para levar aos municípios o que eles apresentam de necessidade. Isso, em bases realmente republicanas. 

Conservador ou não, o Congresso que toma posse amanhã terá as mesmas características de antes, e o centrão fisiológico continuará provocando atrasos. Os reacionários poderão fazer barulho e alimentar grupos ideológicos, mas em essência, sem reforma tributária e reformulação da federação, nada mudou.


 

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