Procura-se uma direita
Edmundo Siqueira 15/01/2023 11:38 - Atualizado em 15/01/2023 11:41
 Fernando Henrique, Mário Covas e Afonso Arinos no plenário da Câmara dos Deputados no dia da fundação do PSDB, 25 de junho de 1988.
Fernando Henrique, Mário Covas e Afonso Arinos no plenário da Câmara dos Deputados no dia da fundação do PSDB, 25 de junho de 1988. / Crédito: Célio Azevedo/Senado Federal
Depois dos acontecimentos do último domingo (8), não dá mais para esconder o fato de que o Brasil possui grupos organizados de extrema-direita dispostos a corromper a ordem pública. Ficou evidente — inclusive por planos golpistas escritos em minutas de decretos — que a ideia sempre foi golpear a República e a democracia; de morte.

Algo parecido só ocorreu no Brasil em 1938, quando o movimento integralista (liderado por Plínio Salgado, de inspirações fascistas) atacou e invadiu o palácio Guanabara, então residência do presidente e sua família, no Rio de Janeiro, quando era capital da República. Apesar da história do país ser repleta de golpes e autogolpes, a invasão de domingo não tem precedentes se considerarmos que foi um ataque frontal aos três poderes, onde uma turba ensandecida destruiu tudo que viu pela frente.
Foto: AFP


A tolerância que a democracia brasileira teve com os acampamentos em frente aos quartéis — que em ampla maioria pediam que o Exército desse um golpe de estado —, com a complacência e silêncio do alto comando das Forças Armadas, permitiu que o ambiente fértil para o nascimento de grupos mais radicalizados. Laços de convivência foram criados e fortaleceu-se a ideia comum que é possível reverter um resultado democrático pela força.

Mas a invasão dos três poderes pode ter servido para afastar a direita democrática do que restou do bolsonarismo. Líderes políticos dos mais diversos espectros condenaram as ações golpistas e a pressão provocou o desmonte dos acampamentos.

Os grupos radicalizados criados não tendem a esmorecer, porém. Movimentos de rua similares ao redor do mundo terminaram com a radicalização permanente de grupos armados. Mas, essa radicalização não veio da polarização, essa natural nas democracias. Ações golpistas e de baderna no Brasil saíram do desequilíbrio causado pelo bolsonarismo no fazer político brasileiro.

Na Nova República, de 1994 a 2018 o Brasil viveu uma polarização na disputa presidencial entre PT e PSDB. O pluripartidarismo estava mais presente no legislativo, que formava o modelo de coalizão e uma espécie de representação distrital.

A derrocada do PSDB, também provocada pela permanência do PT no poder, culminou com a chegada, pela primeira vez, da extrema-direita à presidência da República. Incidental ou não, a chegada de Bolsonaro à cena política nacional acabou por converter setores da direita democrática naquela que seria a opção eleitoral mais viável para aplacar a permanência da esquerda no comando do país.

O PSDB nasce como um representante clássico da social-democracia, depois ensaia uma ida ao social liberalismo, mas acaba por tentar representar um tipo muito presente na sociedade brasileira: liberal na economia e conservador nos costumes. Mas não conseguiu. O bolsonarismo, que trouxe figuras como o ex-juiz Sérgio Moro e o “Chicago boy” Paulo Guedes, conseguiu de alguma forma representar grande parte da direita no Brasil.
Manifestantes invadem Congresso, STF e Palácio do Planalto.
Manifestantes invadem Congresso, STF e Palácio do Planalto. / Marcelo Camargo/Agência Brasil

Depois da versão tupiniquim da invasão ao Capitólio, no domingo, da minuta do decreto golpista encontrada na casa do ex-ministro da Defesa de Bolsonaro (agora preso), Anderson Torres, é possível que setores conservadores da sociedade e a classe média, em grande medida, perceba que o bolsonarismo se transformou, definitivamente, em algo que não os representa.

Subverter as instituições, decretar golpes de estado em um mundo globalizado, agir no constante conflito entre os poderes e as forças armadas e provocar badernas, provocam ainda mais instabilidade em um país que necessita bastante dela, e que está no limite da resistência econômica e social.
E o PT? E  o Lula?
Com a chegada de Lula ao poder, novamente, é preciso que os realinhamentos políticos e partidários produzam uma direita democrática, que aceite resultados eleitorais e que haja a alternância — necessária — do poder. É preciso que o país produza novas eleições com imprevisibilidade, polarizadas em duas ou três opções presidenciais, e que os atores políticos respeitem os resultados.

O que exige a democracia é a existência de oposição. Em autocracias e ditaduras existem governos, mas não são aceitas oposições.
Procura-se uma direita para o Brasil, mas a vaga tem inegociáveis requisitos a serem preenchidos.
 

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