Felipe Manhães: O perigo do fornecimento de dados nas farmácias
Certamente você já foi comprar algo na farmácia e o atendente perguntou seu CPF. Se você não tinha cadastro, muito provavelmente também perguntaram seu endereço, identidade, telefone, e-mail, etc. E se, por ventura, você não quis passar essas informações em um primeiro momento, foi seduzido com a oferta tentadora de descontos.
Em primeiro lugar, essa prática das farmácias em coagir os consumidores a fornecer dados pessoais para supostamente ofertar descontos é prática abusiva e viola vários direitos básicos do consumidor previstos na Lei 8.078/90. Então, se viola diversas normas jurídicas, já sabemos que boa coisa não é.
Esses descontos, na verdade, não existem e o preço mais alto informado é fictício. Não pode ser cobrado um preço diferente entre o cliente que fornece ou não o CPF. Sem contar que a informação sobre o preço dos produtos deve ser clara e precisa, e deve constar no produto ou na etiqueta, e não no sistema interno da farmácia. A concessão de descontos não pode estar condicionada ao fornecimento de dados pessoais.
As farmácias, principalmente as grandes redes, querem, na verdade, capturar informações pessoais dos consumidores para enviar anúncios e/ou falsas ofertas, ou pior, vender esses dados para terceiros. Além disso, de acordo com o Código de Defesa do Consumidor, a abertura de cadastro, ficha, registro de dados pessoais e de consumo deverá ser comunicada por escrito ao consumidor, quando não solicitada por ele, o que não é feito por elas.
A captura constante dos hábitos de consumo dos clientes de forma oculta e sem informação prévia representa severo risco à intimidade e vida privada do consumidor, além de sujeitá-lo a riscos das mais variadas espécies. Em caso de vazamento de dados, os registros de aquisição de medicamentos, por exemplo, podem ser utilizados por uma operadora de plano de saúde ou seguradora para negar cobertura, seguro ou indenização.
Digamos que uma farmácia cobre por uma caixa de Nimesulida o valor de R$ 38 sem CPF, e com o CPF, o preço cai para R$ 9,88, isto é, um desconto de 74%. O preço de R$ 38 não existe, já que esse medicamento é bem mais barato. O preço dos remédios no Brasil é regulado pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED), ligada à Anvisa, que emite uma tabela com os preços máximos ao consumidor. Esse valor de R$ 38 não existe em nenhuma apresentação da Nimesulida na tabela, ou seja, é um falso valor para simular um desconto, com a intenção exclusiva de obter dados dos consumidores.
É por causa do vazamento desses dados que as pessoas recebem aquelas insistentes ligações que desligam quando você atende, ligações de bancos, financeiras, companhias telefônicas, telemarketing, pesquisas de opinião e todo tipo de importunação, além de inúmeros SMS e WhatsApp. Já recebeu aquelas tentativas de golpe pedindo para você abrir um link ou dizendo que você ganhou um prêmio? Pois é, também vem daí.
Portanto, uma dica de quem entende de Direito do Consumidor: não forneça seus dados em lugar algum, apenas onde é realmente necessário, como em órgãos governamentais, na sua agência bancária para comprovar que é você mesmo, ou apenas seu nome e CPF quando precisar que ele conste na nota fiscal de um produto, por exemplo. Jamais forneça para fazer compras do dia a dia em lojas ou na internet. Não faça cadastros desnecessários. As lojas não precisam saber onde você mora e elas querem seu e-mail e telefone para fazer propaganda, o que geralmente ninguém gosta de receber. Seu nome completo, CPF, endereço, telefone e e-mail são dados muito valiosos e, nas mãos erradas, podem lhe trazer muitos problemas e prejuízos.
*Felipe Manhães é advogado