Christiano Fagundes - Maria Bethânia, a menina dos olhos de Oyá
Christiano Fagundes - Atualizado em 25/10/2023 07:47
Maria Bethânia Viana Teles Veloso nasceu em 18 de junho de 1946, em Santo Amaro da Purificação, na Bahia. É filha de José Teles e de Claudionor — esta, mais conhecida como Dona Canô —, e irmã do genial Caetano Veloso.
No ano de 1965, teve início a consagrada carreira, com a apresentação no show “Opinião”, no Rio de Janeiro, substituindo a cantora Nara Leão, ícone da Bossa Nova, que estava com problema de saúde. Os críticos musicais apontam a música “Carcará” como o primeiro sucesso da Abelha Rainha. Trata-se de uma música de protesto escrita por João do Vale e José Cândido, e que integrou o repertório do show supracitado.
Dona de uma vasta discografia, destacando-se: “Maria Bethânia” (1965). “Recital na Boite Barroco” (1968). “A Tua Presença...” (1971) — LP que tem a faixa “Mano Caetano”, de autoria de Jorge Ben e com participação especial desse cantor —; “Rosa dos Ventos” (1971); “Drama-anjo exterminado” (1972) — em que aparece como compositora da música “Trampolim”, em coautoria com o irmão Caetano; “Pássaro Proibido” (1976) — com o clássico “Olhos nos Olhos”, de autoria de Chico Buarque com eu lírico (eu poético) feminino; “Álibi” (1978) — no qual se encontram as músicas “Explode, Coração”, de Gonzaguinha, “Sonho meu”, faixa gravada com a participação de Gal Costa, de autoria de Yvonne Lara e do campista Délcio Carvalho (1939/2013), “O meu amor”, de Chico Buarque, faixa com a participação especial de Alcione, “Negue”, de Adelino Moreira e Enzo de Almeida Passos, e “Cálice”, de Gilberto Gil e Chico Buarque. Com esse trabalho, a Abelha Rainha vende mais de 1 milhão de LPs, batendo o recorde, alcançando uma marca inédita entre as cantoras; “Mel” (1979), trabalho com 12 músicas, sendo que a canção que intitula o LP, de autoria de Caetano Veloso e Waly Salomão, inicia-se com os seguintes versos: “Ó abelha-rainha/ Faz de mim um instrumento/ De teu prazer, sim, e de tua glória”, o que acabou contribuindo para que a cantora recebesse o apelido de Abelha-Rainha. Entre as 12 faixas, há uma de autoria de Ângela RoRo, chamada “Gota de Sangue”, e “Loucura”, de Lupicínio Rodrigues; “Memória da Pele” (1989), LP com as músicas “Reconvexo”, de Caetano Veloso, “Tenha Calma”, de Djavan, “Vingança”, de Lupicínio Rodrigues, e “Memória da Pele”, de João Bosco e Waly Salomão; “As canções que você fez pra mim” (1993), com clássicos de autoria de Roberto e Erasmo Carlos, tais como “As canções que você fez pra mim”, “Olha”, “Fera ferida”, “Palavras”, “Costumes”, “Detalhes”, “Você não sabe”, “Eu preciso de você”, “Seu corpo”, “Você” e “Emoções”; “Âmbar” (1996); “Maricotinha” (2001); “Brasileirinho” (2003); “Que falta você me faz: Músicas de Vinicius de Moraes” (2005); “Carta de Amor” (2013); “Mangueira: A menina dos meus olhos” (2019); “Noturno” (2021). Esses são apenas alguns dos diversos trabalhos lançados pela Filha de Iansã.
A cantora foi homenageada, no ano de 2016, pela Estação Primeira de Mangueira, com o enredo “A menina dos olhos de Oyá”, com o qual a escola sagrou-se vencedora. No ano de 2019, Bethânia retribuiu a homenagem com o CD “Mangueira: A menina dos meus olhos”, lançado pelo selo Biscoito Fino.
Em outubro de 2021, a cantora foi eleita para ocupar uma cadeira na centenária Academia de Letras da Bahia, instituição fundada em 07/03/1917. No texto abaixo, reúno títulos de músicas, de trabalhos, bem como expressões que guardam pertinência com o universo artístico-cultural da Menina dos olhos de Oyá:
Eu, que não sei quase nada do Mar, sei que o mar de Maria Bethânia tem prosa e poesia; tem Guimarães, Clarice e Cecília; tem Iansã, mãe Menininha e Maria.
Sei que Bethânia é a dona do raio e do vento e da ventania de Iansã, e que guarda, na Cartola, o doce mistério da vida, feito pedrinha de Aruanda.
Com a ajuda de Nara Leão, foi que tudo começou. A hora da Estrela logo chegou! O mar de Maricotinha possui a força que nunca seca e a terceira margem do rio.
Como navegar é preciso, na canoa de Maria Bethânia, navegam Vinicius, Caetano, Chicos, orixás, gente humilde, Teresinha, sinhás secadas e dona Canô.
Mesmo com o todavia, é preciso brincar de viver, passar uma tarde em Itapuã, tirar um dia pra vadiar, observando o luar do sertão, pois “felicidade se acha é em horinhas de descuido¹”.
A queda-d’água ergueu-se à sua frente, tudo ficou de pé eternamente, pois os lábios da Abelha Rainha têm um mel que a abelha tira da flor, como se fosse o sol desvirginando a madrugada.
Nos combates desta vida, no lamento no morro, surge você, iluminada, formosa, trazendo o samba da bênção, com seu canto o mais que perfeito, feito Sabiá de Mangueira no Céu de Santo Amaro.
Maria Bethânia, quem te viu, quem te vê! E “o mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas — mas que elas vão sempre mudando. Afinam ou desafinam. Verdade maior. É o que a vida me ensinou²”.
Eu sei que a vida devia ser bem melhor, e será, mesmo com os carcarás, que insistem em não valorizar a cultura, mas a gente vai levando, com muito orgulho, essa grande Dama da MPB, cantando em coro: “É bonita, é bonita e é bonita”, “Explode, coração”.
 
¹ e ² - Guimarães Rosa
 
(Christiano Abelardo Fagundes Freitas é presidente da Academia Campista de Letras)

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