Caso Patrícia: marido é condenado a 28 anos e dez meses de prisão após confessar crime
Verônica Nascimento e Virna Alencar 05/07/2018 10:19 - Atualizado em 06/07/2018 13:56
Uenderson de Souza Mattos foi condenado a 28 anos e dez meses de prisão pelo assassinato da esposa, a analista judiciária Patrícia Manhães, no dia 13 de abril de 2016, durante uma emboscada em frente à sede do Grupamento Ambiental da Guarda Civil Municipal de Campos. Em menos de 10 minutos de audiência no último dia do julgamento, que teve início nessa quarta-feira, Uenderson confessou, durante interrogatório, ter encomendado a morte da mulher e negou a participação no crime dos outros dois réus — Genessi José Maria Filho, apontado como intermediário na contratação do executor, e Jonathan Bernardo Lima, que era acusado de ter executado a tiros a vítima. O espanto da família da analista foi representado pelo silêncio instalado no tribunal, na hora da confissão. Os jurados também consideraram Genessi culpado no crime e ele teve a pena fixada em 26 anos e oito meses de prisão. Os dois, que são servidores públicos, perdem os cargos, de acordo com a sentença do juiz titular da 1ª Vara Criminal de Campos, Bruno Rodrigues Pinto. Jonathan Bernardo Lima foi inocentado pelo júri. 
Segundo o juiz, as provas revelam que a morte foi premeditada, circunstância que revela que o maior grau de censura em comparação com os crimes de homicídio cometidos no calor de uma discussão, sem reflexão da conduta ou consequência. Assim, considerou que o acusado, marido da vítima e pai dos filhos do casal, é uma pessoa de sangue frio e que possui desprezo pela vida alheia.
O juiz mencionou, ainda, que o fato de Uenderson ter dito, inicialmente, que uma quantia de R$ 1500 teria sumido de dentro do carro, dificultou o trabalho da polícia na apuração dos fatos. Levando o crime a ser registrado como homicídio ou latrocínio.
Ele mencionou que as consequências do crime extrapolaram os elementos da tipificação incriminadora. “A vítima, analista judiciária do Tribunal de Justiça, com vida financeira estável, em razão da estabilidade do cargo que ocupava, deixou precocemente órfão, dois filhos, crianças que à época do fato, tinham apenas três e oito anos de idade, privando-os do convívio materno, seja no aspecto educacional ou afetivo, na fase mais importante de sua vida. Essas crianças, além de terem que conviver com a morte prematura da mãe, sofrerão consequências psicológicas, tendo o pai como um dos causadores da morte”.
Uenderson teve como atenuante o fato de ter confessado o crime, levando sua pena inicial a 21 anos e oito meses de reclusão. Mas, dois agravantes elevaram novamente a pena, o fato de o crime ter sido cometido por traição e emboscada, mediante recurso, além de ter sido ele o autor intelectual do delito, o que aumentou a pena definitivamente para 28 anos e 10 meses de reclusão.
Genessi teve como ponto desfavorável a atenuante a paga ou promessa de recompensa pelo crime. Teve culpabilidade considerada exacerbada pela premeditação do crime. Sua pena foi fixada em 26 anos e oito meses de reclusão.
Julgando a decisão incompatível com o cargo que exerciam, o juiz retirou também o cargo público dos acusados. “Embora não tenham cometido o delito no exercício da função, os acusados demonstraram no premeditado crime hediondo contra a esposa de Uenderson, mãe de seus dois filhos, não possuírem capacidade moral para continuarem no cargo de suas funções públicas. Não há dúvidas de que uma condenação dessa gravidade e dessa natureza, torna incompatível a manutenção do cargo público”.
  • Julgamento do caso Patrícia em seu segundo dia

    Julgamento do caso Patrícia em seu segundo dia

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    Julgamento do caso Patrícia em seu segundo dia

  • Carro da analista judiciária

    Carro da analista judiciária

  • Analista judiciária Patrícia Manhães

    Analista judiciária Patrícia Manhães

Julgamento
O juiz deu início aos trabalhos no Fórum Maria Tereza Gusmão às 11h35, e o Ministério Público passou a interrogar o acusado de ser mandante do crime. A princípio, Uenderson pediu para que as respostas fossem dadas pelo advogado, alegando ter passado mal durante a noite e ainda não se sentir bem. O juiz explicou que ele teria o direito de permanecer em silêncio ou se manifestar e, então, o réu confessou a morte da esposa, sem informar, no entanto, quem foi contratado para praticar o homicídio. A defesa refez as perguntas a Uenderson, de forma que ele pudesse reafirmar ter matado a mãe dos seus dois filhos, sem a participação de Genessi e Jonathan.
Uenderson não fez mais nenhuma declaração e foi retirado do tribunal, para que fosse iniciado o interrogatório de Genessi, que negou qualquer envolvimento na morte da analista judiciária. Ele alegou que apenas mantinha uma relação de trabalho com Uenderson. Quanto às ligações telefônicas entre os dois, interceptadas e apresentadas como provas da ligação dos réus na orquestração da morte de Patrícia, Genessi disse que ligava para o celular de Uenderson para conseguir falar com o então comandante da Guarda Municipal de Campos. Uenderson, na época, era motorista do comandante.
Genessi também negou a contratação de Jonathan no homicídio, dizendo conhecer bem o réu, que foi casado com sua filha e que considera como um filho. Questionado sobre a festa que Jonathan teria “bancado” com o dinheiro da contratação da morte da analista, Genessi disse ter acontecido uma festa no Dia do Trabalhor, mas que foi organizada pela comunidade do Parque São Matheus.
Em seguida, a defesa instruiu o réu a não responder, se não desejasse, as perguntas da acusação, mas ele respondeu aos questionamentos. Entre as perguntas, o promotor questionou a ligação feita por Uenderson para ele, quatro minutos antes do crime. A ligação teria demorado 43 segundos. Genessi afirmou não ter conversado com o outro réu na ocasião.
O promotor ainda questionou se Genessi sabia do contato de Uenderson com Jonathan e ele disse que não. O promotor repetiu a pergunta, frisando que as conversas por telefone existiram, são reais, e explicando que a acusação apenas estava perguntando se ele tinha conhecimento dessas conversas. Ele negou novamente. Sobre ter dito à polícia que Uenderson falou algumas vezes com ele sobre querer encomendar a morte de alguém, o réu disse que esse fato ocorreu há anos, quando Uenderson estaria sendo ameaçado de morte. Ele disse não saber quem Uenderson desejava ver morto na época.
  • Julgamento do caso Patrícia em seu segundo dia

    Julgamento do caso Patrícia em seu segundo dia

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    Julgamento do caso Patrícia em seu segundo dia

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    Julgamento do caso Patrícia em seu segundo dia

Depois, foi a vez de Jonathan ser interrogado. Perguntado se ele tinha ciência do que estava sendo acusado, ele respondeu que sim e se absteve do direito de permanecer em silêncio. O acusado de ser um dos executores do crime, de ter atirado na cabeça e pescoço de Patrícia, juntamente com outro homem que não chegou a ser identificado, alegou não ter nada a ver com a morte da analista. Ele disse, ainda, que conheceu Uenderson pela imprensa, depois de implicarem seu nome no caso.
Jonathan contou que já foi genro de Genessi e que moravam no mesmo bairro. Quanto à festa que teria dado, possivelmente com dinheiro pago pela morte de Patrícia, o réu disse ter dado uma festa para a filha, mas em fevereiro e somente pagando o aluguel de alguns brinquedos. A festa apontada pela acusação, no Dia do Trabalhador, segundo Jonathan, foi bancada pelo TCP Terceiro Comando Puro), facção do tráfico da qual fazia parte.
Por atuar no tráfico - ou como disse, “eu participar do ‘movimento’” - seu nome poderia ter aparecido nas buscas por suspeitos do homicídio. Jonathan acrescentou que, desde que foi preso, foi mantido no presídio Carlos Tinoco da Fonseca, em Campos, e se realmente tivesse matado alguém por dinheiro, não teria estaria vivo.
Encerrado o interrogatório dos réus, o juiz deu um intervalo por volta das 12h20. O julgamento retornou às 15h com os debates orais, começando com acusação do promotor Sérgio Ricardo Fernandes Fonseca. Ele disse: "É um processo que as pessoas mentem. Há um empenho monstruoso em esconder que se conheciam". O promotor ainda destacou o lugar do crime escolhido para tirar a vida de Patrícia, o local de trabalho de Genessi, que estava em dia de serviço. Ele ainda reforça a insistência de Uenderson em defender Genessi.
O promotor falou que Genessi, quando perguntado se conhecia Uenderson, respondeu que eventualmente para que ele estabelecesse contato com o comandante da Guarda Municipal - para quem trabalhava. Genessi respondeu, também, que o último contato com Uenderson teria sido feito 15 dias antes do crime. No entanto, a primeira ligação do dia (do crime) foi de Genessi para Uenderson, (demonstrado na quebra do sigilo telefônico) e eles também se encontram pela manhã (conforme detectado pelo satélite, já que Genessi usava tornozeleira eletrônica). A amizade entre eles dura de fevereiro a 16 de abril, três dias depois da morte de Patrícia. Ao longo desses três dias foram realizadas diversas ligações entre eles e depois disso não há mais registros.
Minutos antes do crime, às 18h24, Uenderson liga pra Genessi para cobrar R$ 150 que emprestou a ele pela manhã e que Genessi, nessa hora, estava na oficina para o conserto de uma das viaturas. No entanto, ao comparar depoimentos de ambos, deparou-se com diversas contradições sobre o recebimento da quantia.
Sérgio Ricardo disse que, até o dia da morte, os acusados estabeleciam uma relação eventual e, a partir daí, se falam de outros telefones que, segundo Genessi, eram para consolar Uenderson. Segundo testemunhas, recorda o promotor, Uenderson sequer chorou no enterro e mandou recolher as fotos de Patrícia do apartamento. 
Dias após a morte de Patrícia, Jonathan sofre uma tentativa de homicídio no Parque São Matheus, onde foram deflagrados oito disparos. O motivo seria guerra entre facções. Relata o promotor que em 1º de maio, Dia do Trabalhador, é realizada a festa promovida por Jonathan, que seria para comemoração de aniversário. No entanto, a amante do acusado havia dito em depoimento que ele estava desempregado fazendo bicos como ajudante de pedreiro. Jonathan alega em depoimentos anteriores que a festa foi realizada pela comunidade e que a compra da bebida foi fiado.
O Ministério Público sustentou que Uenderson encomendou a morte de Patrícia, Genessi agenciou e Jonathan atirou. O MP imputou para Genessi e Jonathan a primeira qualificadora: crime praticado mediante paga ou promessa de recompensa (não cabendo a Uenderson que é mandante). Para Uenderson recai a segunda qualificadora: motivo fútil (para ficar com a amante e desfrutar dos proventos oferecidos pelo Tribunal de Justiça). Na terceira qualificadora, todos se enquadram: traição e emboscada não dando a vítima chance de qualquer reação. A quarta qualificadora: feminicídio - crime praticado pela condição de ser mulher, também vale para todos os acusados, pelo entendimento do STJ.
Após intervalo, às 17h, julgamento recomeça com a assistente de acusação Isabela Monteiro Menezes, que representa os filhos do casal. "Estou sendo voz dessas crianças que não terão direito de crescer na companhia da mãe por conta de uma conduta egoísta dos réus", disse. Ela destacou que o motivo do plenário estar lotado é que todos gostavam de Patrícia.
Nova pausa foi dada às 17h48. Julgamento retorna minutos depois com a fala do advogado de Uenderson, Luiz Aurelio Raposo Santiago, que falou durante três minutos. Ele disse que o acusado o chamou nesta quinta-feira para confessar o crime, porque aceitou Jesus como o seu salvador no presídio. Uenderson, representado pelo advogado, pediu perdão à sociedade e ao poder judiciário por ter levado a esposa àquela emboscada. Ele ainda contou ao advogado que não dormiu à noite toda, pois estava passando mal. 
O advogado encerrou a fala dizendo que as três qualificadoras imputadas pelo promotor deixam entregues os sentimentos do júri. Disse, ainda, para "terem misericórdia de Uenderson, que perdeu emprego, família e esposa, numa atitude diabólica". O discurso provocou reações indignadas no plenário.
Logo depois, foi iniciada a fala da defensora de Genessi e Jonathan, Natália Parente de Azevedo. Ela pediu ao júri para não se deixarem levar pelos maus sentimentos, que analisem a acusação e a defesa para conseguirem chegar à justiça.
Natália falou sobre exageros na investigação, como a questão da tornozeleira eletrônica que, em sua visão, se desligou, não era porque o acusado estava cometendo crime. Disse que a tornozeleira, assim como qualquer outro equipamento eletrônico, é falho, e que não há prova suficiente nesse sentido. Ela coloca que também não é de se causar estranheza a ida dele à guarda fora dos dias de serviço, já que é comum guardas fazerem extra para aumentar a renda.
Ela destacou que no dia 13 de abril não há ligação de Genessi para Jonathan, sendo Genessi acusado de gerenciar a morte de Patrícia. A defensora também disse ser exagero apontar que Genessi forçou a ida à oficina, pois o contato com o mecânico foi estabelecido com Sávio. Ela defendeu que não é à toa que Genessi e Jonathan estão no presídio Carlos Tinoco da Fonseca, diferente de Uenderson, considerado culpado. Natália diz que para os presos os dois não são culpados, pois lá não admitem esse tipo de crime. 
Natália disse que as características atribuídas a Jonathan, dadas por Bruno Batista Amaral - testemunha do caso, que estava em serviço na Guarda Ambiental no momento do ocorrido -, em depoimento nessa quarta-feira, de um homem "alto, magro e negro", são comuns para a sociedade brasileira, ainda mais em Guarus. Ela lembrou que Bruno reconheceu que estava escuro no local e que não dava para fazer o reconhecimento de ninguém.
A polícia chegou ao nome de Jonathan porque ele mora no Parque São Matheus, situado perto da Guarda, e pressupõe que após o crime ele seguiria para a região onde mora. Porém, a defensora destacou que a trilha que dá acesso a este bairro não foi utilizada.
Ela disse que Jonathan não teria condições de ter cometido esse crime por causa do seu envolvimento com o tráfico, que ele mesmo admite. Jonathan contou que no dia seguinte ele estaria morto e sua família também, porque, pela lei do tráfico, crime mercenário é tido como traidor.
A defensora disse, ainda, que a dúvida no Direito faz com que a balança seja ponderada a favor do réu, pois não é justo alguém ser preso por uma dúvida. Se tiver que culpar alguém, que seja Uenderson.
A defesa de Genessi e Jonathan pediu absolvição dos réus por insuficiência de provas.
Ao analisar as qualificadoras, a defensora disse que se teve a questão de paga que se prove minimamente, "como?", "pagou quanto?", informações que não existem.
Sobre traição e emboscada não tem dúvida ter sido cometida por Uenderson e, por último, falou sobre a quarta qualificadora criada para reduzir o machismo de uma pessoa como Uenderson, que não suportava o fato de ganhar menos do que a mulher. Qualificadora que, segundo ela, só deve ser relacionada às questões domésticas.
Ela alegou que Genessi e Jonathan não fazia parte do convívio familiar do casal, conforme dito pelas testemunhas. Eles não tinham relação íntima e de afeto em relação com Patrícia, ao contrário de Uenderson.
Eles procederam à sala secreta e, após decisão do júri, Uenderson e Genessi foram considerados culpados e Jonathan Bernardo Lima absolvido.
Delegado fala em estratégia - Preso desde 25 de maio de 2016, Uenderson ainda não havia confessado ter encomendado a execução a tiros da esposa, crime ocorrido em 16 de abril do mesmo ano. Para o delegado titular da 146ª Delegacia de Polícia (Guarus), Luís Maurício Armond, a confissão poderia ser uma estratégia. “Sempre tivemos certeza de que Uenderson era o mandante da morte da esposa, assim como estamos certos do envolvimento dos outros dois no crime. É preciso esperar o final do julgamento, mas essa versão preparada de confissão pode ser uma estratégia para ter a pena reduzida ou mesmo uma combinação para inocentar os outros”, comentou o delegado responsável pela investigação do homicídio de Patrícia Manhães.
 
 

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