Omissão, preconceito, burocracia, falta de comunicação, verbas não acessíveis e leis não cumpridas dificultam a proteção à criança e ao adolescente no Estado do Rio de Janeiro. É o que a Comissão de Defesa dos Direitos da Criança, Adolescente e Pessoa Idosa da Assembleia Legislativa apontou durante audiência para avaliar políticas públicas no estado nesta quarta-feira (5). “O jovem que você enxerga quando ele comete um crime é a mesma criança e adolescente vulneráveis que não foram vistos por você”, disse o deputado Munir Neto (PSD), presidente do colegiado.
Membro da Comissão, a deputada Carla Machado (PT) chamou a atenção para o excesso de burocracia no serviço público em relação ao atendimento a crianças e adolescentes vulneráveis no Estado do Rio. “Sabemos das dificuldades de desenvolver um trabalho sério. A gente esbarra na burocracia, na falta de pessoas para contribuir. É o amor que tem que nos mover”, disse a parlamentar, que já foi dirigente da Apae e fundadora de obras sociais, entre as quais, a Casa de Pedro, em São João da Barra, que atende menores com diversas atividades.
A audiência reuniu representantes do poder público, como Defensoria Pública, Degase (Departamento Geral de Ações Socioeducativas) e Secretarias de Assistência Social, de entidades diversas, como FIA (Fundação Para a Infância e Adolescência), e de Conselhos Tutelares. “O próximo passo é arregaçar as mangas e buscarmos juntos soluções eficazes, tanto emergenciais quanto a médio e longo prazos”, completou o deputado Munir Neto.
Na abertura do evento, foi feito um minuto de silêncio em memória das vítimas do massacre na Creche Bom Pastor, de Blumenau (SC), ocorrido na manhã desta terça. ‘Foram quatro crianças que perderam suas vidas e outras cinco que foram agredidas. Mas a gente sabe que no dia a dia nosso as crianças são violentadas”, disse Carla Machado.
Em suas redes sociais, a deputada também se solidarizou com as famílias das vítimas. “Como mãe, mulher, professora e parlamentar, me solidarizo com a dor infindável das famílias dessas crianças inocentes atingidas por essa barbárie sem igual. E reforço meu compromisso também de lutar na Alerj para que a proteção a nossas crianças e adolescentes seja garantida nas salas de aula de todo o Estado do Rio. Não podemos permitir que a segurança dos estudantes de nossas escolas, creches e demais instituições de ensino seja violada, sob qualquer hipótese”.
Tiago Vieira, presidente do Conselho Estadual de Defesa da Criança e do Adolescente, revelou que as denúncias de violação de direitos das crianças e adolescentes são em sua maioria de violência familiar. “É fundamental uma atuação conjunta e permanente. A vítima de violência tem um dano emocional que precisa ser monitorado por especialistas para que não haja múltiplas violências futuras. E isso não acontece”.
A falta de intersetorialidade nas políticas públicas e a não aplicação de importantes leis voltadas à proteção de crianças e jovens em situação de vulnerabilidade, são entraves que precisam ser resolvidos, apontados pelo diretor-geral do Degase, delegado Victor Hugo Poubel, e pela Auditora Fiscal do Ministério do Trabalho e Emprego, Lívia Valle.
Segundo Poubel, atualmente 750 jovens de famílias carentes estão no sistema penitenciário e recebem capacitação para que possam se reintegrar à sociedade e serem absorvidos pelo mercado de trabalho. “Mas a realidade é que ao saírem do sistema, mesmo estando capacitados, eles não são absorvidos pelo mercado e acabam ou presos ou no cemitério. É preciso fazer valer a Lei do Aprendizado”, disse o delegado, referindo-se à Lei 8.561/2019.
A Lei autoriza o Poder Executivo a ofertar ao menos 500 vagas por ano para jovens aprendizes em situação de vulnerabilidade, como os egressos do sistema penitenciário. Lívia Valle vai além: “O não cumprimento da legislação alcança também as empresas. No município do Rio, por exemplo, apenas 48% das cotas existentes para jovem aprendiz são preenchidas”.
Outros temas, como crianças em situação de rua, também foram debatidos. Segundo Marcelo Jaccoud, da Subsecretaria Municipal de Proteção Especial, o número de crianças nessa situação teve um crescimento muito grande após a pandemia.
“No Rio, cerca de 12,7% das crianças em situação de rua são oriundas de outros municípios e 9% de outros Estados. Então é preciso que as políticas públicas sejam pensadas intermunicipalmente e interestadualmente. As instituições e leis são muitas, mas cada criança é uma só”, disse o subsecretário
Também participaram da audiência os deputados Otoni de Paula Pai (MDB) e Giselle Monteiro (União Brasil), membros da Comissão.