Edgar Vianna de Andrade - Lenin – Trotsky – Stalin
*Edgar Vianna de Andrade - Atualizado em 31/12/2024 11:47
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Yakov Protazonov pode ter atuado como ator e ter dirigido muitos filmes na era do cinema mudo, mas o trabalho que o tornou conhecido foi, sem dúvida, “Aelita, a rainha de Marte”, de 1924. A princípio, o espectador pode pensar que se trata de uma comédia futurista. Ao assistir ao filme, depara-se com um drama, ou mais de um, vivido na construção do socialismo. A Rússia se recuperava ainda da revolução de
1917, do cerco promovido pelo ocidente (Cordão Sanitário) e da contrarrevolução dos russos brancos.
Nesse contexto, Protazonov mistura realidade, fantasia, sonho e receios. Um cientista conceituado trabalha num projeto de construção de uma nave espacial. Sua ambição é chegar a Marte. No final, ele acaba sozinho, pois acredita que foi traído e mata sua esposa. A revolução não acabou com os dramas burgueses. Pelo contrário, eles duraram por todo o tempo da União Soviética. O filme traduz também um conflito entre o passado e o presente. Seu melhor amigo deixa a Rússia em nome do passado. Sonho ou realidade, a rainha de Marte descobre o cientista com um possante telescópio. Ele é flagrado beijando a mulher e, desde então, a rainha sonha com um beijo como aquele, esse pecado capitalista.
Sucede que, em Marte – sonho ou realidade –, a monarquia alcançou alto grau de desenvolvimento científico e tecnológico. Os prédios e as roupas são concebidos em desenhos construtivistas. A influência de “O gabinete do Dr. Caligari”, filme do alemão Robert Wiene, datado de 1919, é evidente. O sonho do cientista é trotskista. Ele acabara envolvido com uma revolução leninista para libertar trabalhadores em regime feudal e criar um estado socialista em Marte. Não é mais apenas a revolução mundial, como desejava Trotsky, mas a revolução interplanetária. A semelhança com “Metropolis”, de Fritz Lang, também é notória, muito embora este filme date de 1926.
Parece que a atmosfera da época contamina filmes do Japão aos Estados Unidos. Não há dúvida a este respeito quanto à linguagem do cinema. O mundo capitalista influenciou muito o cinema soviético, embora ele ganhasse vida própria. Da mesma forma, cineastas soviéticos ou influenciaram o cinema ocidental ou foram mesmo trabalhar nos Estados Unidos, por mais desconforto que se sentissem na
meca do capital.
Nesse clima de sonho e realidade, o cientista está de volta à Terra ou dela nunca se afastou. Está de volta à Rússia socialista ou jamais a deixou, a não ser em sonho. Ele assenta os pés no chão, reconcilia-se com a mulher, que, à moda burguesa, sempre lhe foi fiel. Ele imaginou coisas. Olha para seu país em construção e faz uma opção stalinista de permanecer nele. Protazonov antecipa J. Posadas, o marxista espacial com sua revolução comunista promovida por seres vindos de outro planeta.

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