Felipe Fernandes - Duas vidas em conflito
*Felipe Fernandes 11/12/2024 08:22 - Atualizado em 11/12/2024 08:22
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O diretor e roteirista M.Night Shyamalan já demonstrou sinais de brilhantismo na condução de algumas de suas obras. Misturando premissas interessantes, com uma condução segura, culminando em plot-twists surpreendentes, o diretor despontou como um dos grandes cineastas da virada do século.

Abordando histórias, que de diferentes formas, trazem o ato de acreditar como elemento central, o diretor parece ter ficado preso em sua própria engrenagem, construindo uma carreira irregular, em que a frustração é a mais constante das sensações após os seus filmes.

Seu novo longa “Armadilha” traz algumas características diferentes para a mesma dinâmica. Partindo de uma premissa meio absurda, mas interessante, o longa nos propõe um jogo de perseguição, em que acompanhamos tudo pelo ponto de vista de um pai de família, que também é um violento serial killer.

Esse é o elemento mais interessante da trama. Shyamalan não perde tempo trabalhando a dúvida, ainda que traga alguns diálogos “espertinhos” e preguiçosos para a situação, logo no início fica muito claro que o protagonista é um assassino frio e violento.

Cooper (Josh Hartnett) leva essa vida dupla, que ele parece levar com uma certa desenvoltura.
Em seu momento enquanto pai, levando a filha para assistir sua artista preferida, ele se descobre como centro das atenções, ainda que ninguém saiba sua identidade.

Precisando escapar daquele local, enquanto mantém sua integridade enquanto pai exemplar para sua filha, Cooper faz do improviso sua arma para lidar com a armadilha do título.

É claro que esses improvisos muitas vezes beiram o absurdo, uma característica presente em muitos filmes do diretor, que comprovam uma certa preguiça como roteirista, ao incluir personagens estúpidos ou situações forçadas para desenvolver sua história.

A relação do personagem com o ambiente funciona, sendo bem eficiente para comprovar sua inteligência e frieza, transformando aspectos daquele tipo de evento como armas para sua fuga.

A forma como a história é contada praticamente divide o filme em dois. Essa primeira é essencialmente sobre a situação, a segunda já se torna um estudo de personagem.

Sem a tensão eminente do show, Shyamalan busca desenvolver o protagonista e conforme suas duas vidas se confrontam, a situação começa a fugir do controle do protagonista.

A cena em que ele observa suas duas vidas finalmente colidindo, observando quase como uma pessoa de fora, é bem interessante, em um dos raros momentos em que ele perde seu foco.

Curioso que as antagonistas sejam todas mulheres. É mencionada brevemente a relação dele com a mãe, que seria a única a conhecer sua verdadeira natureza. Mãe esta que de certa forma é projetada na analista de comportamento, que parece compreender sua forma de pensar e não por acaso é uma mulher já na terceira idade.

Posteriormente ele confronta a cantora, que representa o universo da filha e no ato final, seu embate com sua esposa, que diferente da mãe, desconfia, mas não conhece a natureza do próprio marido.

Uma característica que engrandece o personagem, é o fato dele demonstrar alegria em sua relacionamento com a filha, mostrando que ele de fato leva duas vidas, não necessariamente, tendo uma delas como fachada.

A grande atuação de Hartnett é importante na construção dessa complexidade, já que ele consegue transitar com desenvoltura entre essas duas vidas de Cooper.

“Armadilha” segue a cartilha de seu criador. Premissa instigante, condução irregular e um pequeno plot twist na reta final. Um longa cheio de potencial, mas que derrapa em seu desenvolvimento, comprovando que Shyamalan é um artista que precisa se reinventar e fugir dessa dinâmica limitadora que ele impôs a si mesmo.

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