
No caso do Mercado, a revitalização de toda área que compreende o entorno do prédio centenário é discutida, buscando a melhoria de acessibilidade de clientes e condições de trabalho para os comerciantes e permissionários.
No local que está hoje, instalado desde 1921, o Mercado precisava da proximidade com o canal Campos-Macaé e com o rio Paraíba para a chegada e o escoamento de mercadorias. As condições desse entorno sofreram transformações significativas desde então, e instalações como a feira e o camelódromo acabaram por esmagar o belo prédio de dois pavimentos térreos, separados por uma torre com um relógio no topo, inspirada no mercado de Nice, na Riviera Francesa.
Em 1981, durante o governo Raul Linhares, foi constituída à frente do prédio — e da torre — uma enorme estrutura, onde perfis de aço sustentam uma cobertura em alumínio. Cerca de 10 anos depois, outra estrutura viria a esconder o que restou do prédio: nascia o Shopping Popular Michel Haddad.
Tombado desde 2013 pelo Conselho de Preservação do Patrimônio Histórico e Cultural de Campos (Coppam), o prédio do Mercado Municipal há vários anos vem sendo mapeado para receber, também, tombamento pelo Instituto Estadual do Patrimônio Cultural (Inepac). Porém, o tombamento (que também protege o entorno) não foi efetivo para impedir a descaracterização do entorno e o encobrimento do Mercado.
Um mercado municipal, em qualquer cidade, é um organismo vivo. As vivências, as trocas comerciais e aquele ambiente único criado pela coletividade urbana são construídos pelas pessoas que vivem o local, e pelos clientes que o frequentam. Mudar um mercado municipal de lugar não necessariamente altera sua essência. Ou será que altera?
IFF e prefeitura divergem
Existem ao menos duas respostas possíveis para essa indagação. A prefeitura — através da Secretaria de Agricultura, Pecuária e Pesca, liderada pelo agrônomo e ex-reitor da Uenf, Almy Junior — propõe que a feira seja deslocada para um novo local, onde seria construída uma nova estrutura para os feirantes.
Já alunos e docentes do curso de Arquitetura do Instituto Federal Fluminense (IFF), propuseram que a feira seja mantida onde está, e que as mudanças estruturais necessárias sejam feitas a mantendo no mesmo local, e ainda, segundo os projetos apresentados, deixar a torre visível.

A arquiteta Laís Rocha, que participou dos projetos atuando como estagiária docente do curso de Arquitetura, e atualmente mestranda na área, no IFF, conversou com este espaço no Folha1 e apresentou o que seriam as ideias principais trazidas na disciplina “Projeto e Bens Patrimoniais” para o Mercado.
— O interesse na realização do projeto tendo o Mercado Municipal de Campos como objeto de estudo e intervenção partiu de um desejo antigo da professora Catharina (a arquiteta e urbanista Maria Catharina Prata), que capacitou os alunos antes do desenvolvimento dos projetos em si, onde eles tiveram aulas teóricas sobre patrimônio, restauração e requalificação de prédios e mercados históricos, e sobre a história do próprio Mercado. — disse Laís.
Além das aulas de restauro patrimonial, os alunos do IFF tiveram atividades práticas e realizaram visitas técnicas no mercado para que pudessem identificar o que a arquiteta chamou de “doenças do edifício” — danos atuais do prédio centenário.
Com a identificação das “patologias” foi possível desenvolver os conceitos e formas para os projetos:

— Os alunos desenvolveram os Mapas de Danos, onde identificaram as principais patologias, as doenças do edifício, e como resolvê-las. A partir de toda essa análise teórica, histórica e da identificação dos principais danos, eles puderam dar início ao desenvolvimento dos projetos, como o conceito norteador de todas as decisões projetuais e como o desenvolvimento do partido, que é a forma pela qual será aplicado o conceito no projeto. Essa foi a ‘mola mestra’ para a consolidação das ideias.

A praça encontra-se subutilizada e oferece, segundo a prefeitura, a estrutura necessária para receber não apenas uma nova feira do Mercado, mas também outras possibilidades de exploração comercial, como cafés e restaurantes.
Segundo o secretário Almy Júnior, os feirantes e permissionários só iriam para a nova construção após sua conclusão, onde poderiam ter melhores condições de trabalho e melhor acessibilidade de produtos e clientes.
— Esta proposta, na minha opinião, é muito melhor que outras já apresentadas ou ditas no passado, tais como um elevado sobre o Canal Campos-Macaé, com uma estrutura do outro lado da .avenida José Alves de Azevedo, ou mesmo a construção próxima ao Canal Campos-Macaé, na direção do Carvão. — comentou Almy.

Os problemas
Por suas características comerciais e pela perecibilidade de seus produtos, um mercado sempre causa transtorno aos vizinhos: os horários de chegada e saída das mercadorias, o descarte de produtos que estragaram, os resíduos dos açougues e peixarias, e até os barulhos vindos da feira costumam ser, tradicionalmente, os motivos para a mudança de local de um mercado público.
Em Campos não foi diferente, sendo as primeiras alterações motivadas por decisões higienistas. O local escolhido em 1921 viria organizar o comércio dos feirantes e criar mais facilidade de acesso de mercadorias e transporte.
Mas, apesar de afetar muita gente, os reordenamentos urbanos que historicamente aconteceram na cidade tiveram pouca participação popular, ou da sociedade civil organizada.
As soluções
— A Professora Catharina sempre nos questionou: O que é um Mercado sem feira? Então, os projetos buscaram manter a feira integrada ao Mercado, propondo novas configurações que possibilitam melhor visualização do prédio histórico, inclusive de sua torre, além de melhoria na infraestrutura, materiais, iluminação e higiene, sempre pensando em melhorar as condições dos feirantes já ali existentes. — disse a arquiteta Laís Rocha.

Nas apresentações no IFF, foram pensados atrativos que possibilitassem não apenas a contemplação da edificação centenária, mas alternativas para que clientes e passantes pudessem permanecer no local. Para isso, os projetos contemplaram estruturas como parquinhos infantis, quiosques, bancos, palco para eventos musicais e jardins.

Para o entorno, os alunos propuseram realocar o camelódromo para o Parque Alberto Sampaio (ao lado do Mercado), que eles avaliaram como “área de extremo potencial para a cidade”. Sobre o Canal Campos-Macaé, os projetos consideraram que “a limpeza e manutenção constante” do canal resolveria a “questão de alagamentos relatados pelos comerciantes”.
Já o projeto da prefeitura prevê uma construção totalmente nova e moderna, inspirada nos novos mercados construídos em outros centros urbanos, como Niterói. O projeto que já está em fase de licitação prevê a construção ainda de um Banco de Alimentos (organizações sem fins lucrativos que atua na recuperação de excedentes alimentares da sociedade para os redistribuir entre pessoas necessitadas) e áreas para exploração comercial de bares e restaurantes.

Segundo Almy, o projeto que ele apresentou seria “fundamental para expor, de verdade, a fachada do mercado centenário”:
— A minha opinião, depois de ouvir vários atores e diferentes propostas para o espaço, é que a retirada da Feira daquele ponto é fundamental para expor, de verdade, a fachada do mercado centenário. Além do mais, temos o desafio gigantesco de realocar feirantes durante a execução de uma obra, inicialmente da reforma da feira e, posteriormente, da restauração do Mercado. Por isso, avaliando todas as possibilidades, o que nos parece mais factível e prudente é construir uma nova estrutura de feira, num espaço que a cidade não utiliza e que está a menos de 250 metros do Mercado Centenário.
O que o feirante pensa?
Embora as condições físicas que o Mercado em Campos apresenta atualmente não sejam das melhores, muitos feirantes e permissionários atuam no local por décadas, e se sentem parte de uma realidade que aprenderam a conviver.
Por outro lado, a necessidade de revitalização é sentida por todos que consomem e trabalham no local. As tradições e a cultura popular criadas nos mercados, de forma laica e plural, podem transcender as dificuldades estruturais, mas não eliminam as deficiências visíveis que o prédio e o entorno do Mercado apresentam.
Qualquer alteração proposta para um local tradicional como o Mercado Municipal deve ser feita ouvindo quem vive sua realidade diariamente, convivendo com os problemas há muito tempo.
A arquiteta Laís Rocha citou o afeto como elemento principal nas propostas do IFF:
— O afeto foi o principal motivo do sucesso da disciplina. Afeto dos alunos com o Mercado e a importância da sua preservação, afeto e responsabilidade dos alunos com a história dos comerciantes, afeto dos professores e estagiários com os alunos, e vice-versa, em todo o processo de desenvolvimento do projeto, que resultou em poemas, lágrimas e muita emoção para todos que se envolveram na disciplina. E é exatamente esse sentimento que precisamos gerar na população em relação aos seus patrimônios históricos, afinal, somente nos lembramos e queremos preservar aquilo que amamos.

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Edmundo Siqueira
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