Mercado Municipal: 101 anos, 41 escondido
Edmundo Siqueira 15/09/2022 19:55 - Atualizado em 15/09/2022 19:55
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Como na maioria das cidades Brasil afora, o Mercado Municipal é um elemento essencial para entender os processos de construção e crescimento urbano. No caso de Campos dos Goytacazes, o mercado e a praça São Salvador foram locais de grande efervescência social, cultural, política e comercial da cidade.

O Mercado Municipal de Campos não nasceu onde está hoje, outros três existiram no município. O atual foi inaugurado há 101 anos, quando a cidade passava por uma política higienista e de modernização, e um imponente prédio foi construído para abrigar o mercado.
Matéria da Folha sobre os 101 anos, aqui

No dia 15 de setembro de 1921, ao som de bandas e com a presença do prefeito Cezar Tinoco e diversas autoridades, a população foi enfim apresentada ao novo prédio do Mercado. Dois grandes pavimentos de mesmo tamanho, divididos por uma torre do relógio de inspiração europeia. Mais especificamente, a torre é quase uma réplica de outra existente no mercado de Nice, capital da Riviera Francesa.

Os permissionários passavam a contar com um novo espaço para o comércio de gêneros alimentícios populares. E Campos passava para o rol de cidades com um Mercado atrativo, bonito, simbólico e pronto para durar pelos séculos seguintes. Mas durou pouco mais da metade de um.

Mercado de Nice, França.
Mercado de Nice, França. / Reprodução
Em 1981, já no governo Raul Linhares, foi constituída à frente do prédio — e da torre — uma enorme estrutura de sustentação, onde perfis de aço sustentam uma cobertura em alumínio. O que era um dos principais atrativos do Mercado estava escondido, encoberto por um “telhadão”. Se não bastasse, 10 anos depois, outra estrutura viria a esconder o que restou do prédio: nascia o camelódromo.


Toda ideia e toda construção do mercado passou a ficar espremida. Hoje, quem frequenta o local talvez não esteja satisfeito com as condições atuais, e provavelmente sequer saiba que ali existe um prédio com tamanha beleza e simbolismo.

Os reordenamentos urbanos em Campos obedeceram à uma perspectiva higienista. Em 1902, o então presidente da Câmara, Benedito Pereira Nunes, encomendou a outro campista e engenheiro sanitarista, Saturnino de Brito, saneamento e remodelação do espaço urbano, e Saturnino considerou o Mercado um dos maiores “problemas”.

Sendo uma planície alagadiça, Campos precisou de uma estrutura de canais para drenagem. O principal deles, o Canal Campos-Macaé — a maior obra de engenharia do Brasil no século XIX, e o segundo maior canal artificial do mundo — foi o que levou o Mercado a ser instalado onde está onde está hoje, onde estaria "saneado" e "moderno". 

Campos dos Goytacazes — diferente da maioria das cidades Brasil afora que possuem mercados belos e históricos — não soube aproveitar o que recebeu e construiu. Espremido e escondido, o prédio se torna um estorvo, e a torre francesa, uma jóia inacessível.

*O Mercado Municipal é tombado desde 2013 pelo Conselho de Preservação do Patrimônio Histórico e Cultural de Campos (Coppam) e, há vários anos, vem sendo mapeado para receber tombamento também pelo Instituto Estadual do Patrimônio Cultural (Inepac). O Coppam, apesar de sua atribuição principal de defesa do patrimônio, autorizou a descaracterização do entorno e o encobrimento do Mercado.

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