José Eduardo: Relação conjugal – soneto da felicidade
José Eduardo Pessanha 10/02/2025 16:33 - Atualizado em 10/02/2025 16:59
José Eduardo Pessanha
José Eduardo Pessanha / Divulgação
Relia, há pouco, o “Soneto de Fidelidade” de Vinicius de Moraes: “que não seja imortal, posto que é chama, mas que seja infinito enquanto dure”, sendo que, em humilde respeito ao poeta, mas dissentindo, creio que deveria se chamar “Soneto da Felicidade”... note que no início, no auge da paixão, o amor toma conta por inteiro e o poeta narra: “de tudo, ao meu amor serei atento, antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto”. Em prosseguimento, com o decorrer do tempo, com a premissa de viver cada momento, logo afirma: “quero vivê-lo em cada vão momento e em seu louvor hei de espalhar meu canto”. No entanto, com a proximidade do esgotamento, ao findar do amor, restará a solidão, no que vaticina: “quem sabe a solidão, fim de quem ama”. Assim, nesta saga da paixão ao amor e do amor à solidão, o poeta sintetiza, nos atemporais versos: “Eu possa me dizer do amor (que tive): que não seja imortal, posto que é chama, mas que seja infinito enquanto dure”.
Note que alcançando o enredo conjugal, tal poesia encarna uma relação de grandes proporções e conteúdo explosivo. O casal, no sentido amplo que o vocábulo hoje representa, construiu um sonho de perpetuação, mesmo sabendo que as probabilidades são terrivelmente contrárias e os exemplos das “exceções” motivam na busca do improvável. Ocorre que, no mais das vezes, salvo condições excepcionais de “temperatura e pressão”, as relações, com mais velocidade ou não, caminham para uma anunciada “crise conjugal”, cada uma ao seu devido tempo!
Uma crise conjugal é desaguar crítico, onde os casais tem posto à prova todos os demais sentimentos que sustentam a relação, pois com a extenuação da paixão e as agruras do amor, restará o respeito, amizade, zelo, parceria e companheirismo. A crise pode ser causada por diversos desmembramentos ou gatilhos, tais como perda da libido, minoração da importância, falta de comunicação, desgaste financeiro, deslealdade (por muitos conceituada como infidelidade) e demais outras variáveis. Via de regra, a análise do conteúdo rotineiro do casal já denota uma das facetas que podem induzir a razão ou leque de razões da ruína conjugal. Neste momento, a terapia específica, bem empreendida, tanto pode aclarar as possibilidades de continuidade relacional, como pode possibilitar uma mudança de fase civilizada, de forma que haja mitigação dos danos.
Normalmente, a crise conjugal se instala de forma incipiente e silenciosa; a distância vai se sedimentando e a intimidade entra em rota inversamente proporcional, mitigando o carinho e abrindo fossas abissais na cumplicidade que é um conteúdo fundamental neste tipo de relação: é como o cimento que une pessoas diferentes! A perspicácia e a argúcia para identificar esta alteração de rota, o quanto antes, é fator primordial para “salvar” uma relação. Note que em muitos casos, é natural o desgaste da relação e a necessidade de término. Isso ocorre com conteúdos conjugais baseadas apenas na atração sexual, na conveniência financeira e na convergência de interesses, pois, como é sabido, o fogo da paixão, cedo ou tarde, encontra seu declínio; a conveniência financeira não traz felicidade e os interesses tendem a se alterar com o tempo. Assim, uma relação com essas características, onde as partes não percebam que são necessários outros ingredientes que possam convergir e amalgamar mais o casal, certamente será substituída por outra relação posterior.
Em casos como o descrito acima, o profissional terapeuta deve auxiliar na visão real das características, a fim de possibilitar que as partes “resolvam”, ou pelo incremento das condicionantes ou pelo desfazimento consciente. Em quaisquer das possibilidades descritas, o profissional estará (ou deverá estar) apto a dar o suporte para que as névoas constantes do término relacional possam ser desfeitas. Um dos pilares para o resgate de uma relação é a confiança; outro é a comunicação e o terceiro e não menos importante, é o desejo de proximidade, que pode ser sexual ou cooperativo, mas deve ensejar uma intimidade diferenciada.
É muito comum se falar em “AMOR”, sem sequer possui o alcance do real significado desta palavra, tantas vezes desperdiçada. O Amor advém da Paixão e reinará até se transformar em amizade íntima e por fim, companheirismo essencial. Em todas essas etapas a cumplicidade é necessária e deve imperar entre as duas partes, sem terceiros interessados ou intervenientes. O melhor caminho para uma análise positiva rumo a reinstalação da confiança, é a assunção dos erros e a identificação de quais “pedaços” do alicerce do casal ficaram pelo caminho. No mais, existindo a tríade essencial e uma análise correta da assunção dos erros, há possibilidades reais de superação da crise conjugal. Assim, sinceridade, diálogo e respeito são fundamentais.
A matéria comporta uma extensa listagem de possibilidades e técnicas de abordagens, porem não podemos construir aqui um artigo técnico pormenorizado, pela exiguidade do espaço. Neste viés, é curial reconhecer, também, que muitas vezes, ante a ausência ou perda de componentes vitais para a relação conjugal, que a cisão, de forma adulta e consensual, passa a ser o melhor caminho. Neste momento, crucial preservar o entendimento que “se já nos amamos, porque nos odiarmos?” Sim, em que pese a natural sensação do fracasso, nossa passagem neste universo é célere e o tempo é cruel para os indecisos. É possível finalizar uma relação conjugal de forma a manter a afeição, a identidade de alguns projetos (especialmente no caso de filhos) e o sentimento de que a Felicidade pode (e deve) ser para todos. Não é um processo simples, mas a maturidade e a sabedoria podem pavimentar esta saída decente e verdadeira.
Assim, a Terapia de Casais pode auxiliar na resolução de conflitos; majoração do diálogo; fortalecimento dos pontos positivos e análise realista do cenário conjugal. Se de tudo não houver progressão, que seja o encerramento civilizado de um ciclo, com a manutenção do afeto e o respeito pelas escolhas do outro. Conclui-se que uma relação conjugal, ao contrário do apresentado pelo poeta, não é exatamente um “soneto de fidelidade”, mas sim de “felicidade”, que como decantada, não seria imortal posto que é chama, mas seria infinita enquanto durasse; afinal, a vida é feita momentos de felicidade; não existe felicidade “forever”! Assim, VIVA E DEIXE VIVER!
*José Eduardo Pessanha da Silva é Psicólogo Clínico, com especialização em Saúde Mental e Atenção Psicossocial

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