Arthur Soffiati - Considerações históricas sobre as ilhas do Paraíba do Sul
Matheus Berriel - Atualizado em 18/05/2022 19:15
Como se forma uma ilha? Não tenho formação científica para responder à questão. Creio que por resistência de terras à pressão das águas do rio ou por acumulação de sedimentos. Na zona serrana, as ilhas têm base pedregosa, assim como as margens, embora se forme solo em sua superfície que permita o crescimento de vegetação florestal. As formações pedregosas são mais resistentes à força da água.
Na zona de tabuleiros, entre o fim da serra, a planície aluvial e a restinga, as ilhas apresentam a mesma estrutura das margens. Essas ilhas talvez representem uma comprovação importante de que, antes de 10 mil anos antes do presente, havia uma extensão continental distinta da atual e que avançava mais no mar. O rio Paraíba do Sul já drenava esta extensão territorial. A partir de 7.000 até 5.100 anos antes do presente, o mar avançou (transgrediu) sobre o continente constituído de tabuleiros seguindo pela parte mais baixa, ou seja, pelo vale dos rios. Pelo Paraíba do Sul, o mar alcançou as imediações da lagoa de Cima.
Quando recuou (regressão), a área de tabuleiros erodida por ação marinha foi preenchida por sedimentos argilosos transportados da zona serrana, formando a planície fluvial atual. As ilhas seriam a prova desse passado de tabuleiros. Na zona de restinga, que arrematou a planície aluvial, as ilhas apresentam muita areia em sua composição. Basta examinar as ilhas da Convivência, do Pessanha e do Lima. A descarga constante de sedimentos argilosos carreados pelo rio promoveu uma cobertura de argila.
Essas ilhas estão sujeitas a mudanças por ação do rio. Ou são erodidas pelas águas, perdendo área ou sendo divididas, ou são ampliadas por acréscimo de terra. Por comparação com algumas que não foram totalmente alteradas por ação humana, todas elas deviam apresentar cobertura florestal por matas estacionais semideciduais úmidas. Os povos pioneiros que habitavam a planície e os tabuleiros contavam com ampla área de coleta, pesca e caça, podendo dispensar as ilhas. Mas, não podemos descartar sua presença nelas. Investigações arqueológicas deveriam ser promovidas nas ilhas.
Com a doação de sesmarias (grandes glebas de terra) aos Sete Capitães, aos Jesuítas e aos Beneditinos, e a colonização contínua da região que futuramente se transformaria na base para a capitania de Paraíba do Sul, para o distrito de Campos dos Goytacazes, para a Comarca de Campos e para as regiões Norte e Noroeste fluminense, as ilhas foram ocupadas por descendentes de europeus para práticas agropecuárias. Quando os Sete Capitães empreenderam sua primeira expedição às terras doadas, em 1632, a baixada era bem diferente do que é hoje. Havia ilhas e lagoas em toda a sua extensão. As ilhas eram as poucas terras emersas cercadas de lagoas e córregos por todos os lados. As lagoas eram espraiamentos de água cercadas de terra por todos os lados. E essa fisionomia podia mudar de acordo com as estações do ano.
As ilhas mais consolidadas estavam no rio Paraíba do Sul, mesmo assim com sua área aumentando ou diminuindo de acordo com as estações do ano. Mais precisamente com as cheias e estiagens. O capitão-cartógrafo Manoel Martins do Couto Reis escreve sobre elas: “Neste rio há um avultado número de ilhas do primeiro cachoeiro para cima, e deste para baixo contam-se presentemente 72, umas menores, outras maiores, com capacidade para estabelecimentos de lavouras, com matos e lenha, e algumas há que têm campinas muito boas para a criação de gado; porém, pela maior parte as menos altas são sujeitas a inundações (Assim sucedia à Ilha chamada do Pires que a força das inundações consumiram e nada dela existe). Destas se têm extinguido algumas por violência da correnteza das águas, e com a mesma facilidade se criam outras. Houve um homem que tomou por sesmaria as ilhas compreendidas pela barra e valetas do Paraíba (aforava umas e vendia outras chamando-se a posse de todas as que novamente se criavam; assim fazia o seu negócio, até que a Câmara de São João, advertida deste procedimento, tem tomado a si aquela novidade para seu rendimento”.
Por essa informação, datada de 1785, verifica-se que as ilhas do rio Paraíba do Sul entre São Fidélis, em cujos domínios territoriais se encontra o último desnível do rio (chamado na época de primeiro cachoeiro, hoje de salto), e a foz perfaziam um total de 72, número difícil de estabilizar, pois, como informa o próprio autor, algumas desfaziam-se com a força hídrica, ao mesmo tempo em que era possível até dar origem a outras por ação humana. Essas ilhas já eram motivo de negócio, podendo-se nelas plantar e criar gado. Havia lenha das florestas. Continuamos na próxima semana.

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