Violência: estaria a população de Campos refém em seus bairros?
Dora Paula Paes - Atualizado em 15/06/2024 01:27
Manifestação na BR 101 (Fotos: Rodrigo Silveira)
Manifestação na BR 101 (Fotos: Rodrigo Silveira)
A morte dos dois adolescentes, de 14 e 15 anos, moradores do Parque Santa Helena, em Guarus, por um grupo de 10 a 11 sequestradores que seria da Comunidade da Baleeira, amedronta com a possibilidade de linha geográfica traçada pela violência. Estaria a população de Campos refém em seus bairros? Arthur dos Santos Matias, de 15 anos, e Gabriel Henrique de Lima, de 14 anos, foram torturados, mortos e seus corpos jogados no Rio Paraíba do Sul, na Ilha do Cunha. Um outro jovem, com um tiro na perna, conseguiu escapar. Antes de serem sentenciados à morte por seus algozes, eles foram levados de uma festa do shopping, no Parque Rodoviário.

No âmbito da sociologia, esse caso, e tantos outros, reflete, primeiramente, o fracasso social e político do amplo pacote repressivo da “Guerra às Drogas”, aplicado em todo o país. A afirmação é do sociólogo George Coutinho. No caso de Campos, a única área "livre", sem a barreira do tráfico, ou seja, assegurada o direito de ir e vir de todo cidadão, neste caso, seria a Pelinca.

A Polícia Civil, em 48 horas, conseguiu dar uma resposta à sociedade, quando apreendeu três menores. Eles estariam envolvidos no crime dos meninos mortos. A investigação continua, mas nenhuma autoridade policial que o caso seja oriundo de uma rixa entre facções. A Assessoria de Imprensa da Secretaria de Estado de Polícia Militar, não respondeu sobre bairros sitiados pela marginalidade. Informou, que policiais militares do 8º Batalhão de Polícia Militar foram acionados para a Rua Prefeito Edgard Machado, no Parque Leopoldina, onde localizaram dois corpos no Rio Paraíba, no último domingo (9).
A população do Parque Santa Helena, por duas vezes nesta semana, fechou a BR 101 em protesto. Na primeira, o pedido era por justiça. "É impossível ficar tranquila quando um filho sai de casa. Meu casal de filhos, de 18 anos, gosta de passear do outro lado da cidade. Eles frequentam festas e barzinhos na Pelinca. Será que eles estão seguros?", questiona uma mãe, que passava pela manifestação e reside na área do Parque Novo Mundo. Ela, sem se identificar, conta que tem bairros em Guarus com hora marcada para a população voltar para suas casas. "Tem muitos lugares perigosos aqui. Do outro lado do Rio (na margem direita do Paraíba) também", completa.
Perante a possibilidade da população de alguma comunidade, dita violenta, ser prisioneira dentro dos seus próprios bairros, o sociólogo reflete: "É preciso olhar caso a caso. Por vezes, dada a inexistência de proteção social e de políticas públicas, o tráfico é, antes de tudo, espaço de geração de ocupação remunerada e até mesmo proteção de parte de comunidade que venha a assentir com este tipo de empresariado do crime. Por outro lado, pode sim haver um amplo aparato repressivo deste grupo organizado sobre a comunidade. Indo além, seja do narcotráfico protetor ou do narcotráfico opressor, pode ocorrer papel intercambiável entre lá e cá. Para não ser leviano, é preciso investigar e pesquisar se essa relação realmente existe nas comunidades concretas de Campos".

Sobre a área nobre da Pelinca - local citado pela mãe dos jovens do Parque Novo Mundo -, ponto de encontro na cidade, na opinião do sociólogo, talvez seja uma área de "disputa comercial não violenta".
"Note que friso o tempo todo ser o narcotráfico um mercado como qualquer outro e, pelo proibicionismo, um mercado selvagem, sem regulação e que faz uso da violência na disputa entre grupos e territórios. Voltando, dado o perfil socioeconômico do bairro, penso que o uso da violência aí traria problemas. O perfil do frequentador da Pelinca é justamente aquele que, quando vítima de homicídio, é o que atrai a atenção de todo aparato policial. Ao mesmo tempo, o perfil socioeconômico do bairro é de clientes preferenciais do narcotráfico. Os clientes das classes médias e altas são fundamentais para o financiamento da atividade", conclui.

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