Desenvolvimento e futuro da região em debate no II Fórum Norte Fluminense
Carlos Gustavo Smiderle e Humberto Meza 06/03/2024 15:16 - Atualizado em 06/03/2024 16:02
Com a chegada do período eleitoral nos municípios, alguns eventos criam espaços para debater o atual curso e o futuro das cidades. Um deles está previsto para acontecer de 12 a 14 de março, na cidade de Macaé. Trata-se do II Fórum Norte Fluminense “Cooperação Intermunicipal e Capacidades Estatais: Desafios e Possibilidades para Ações Comuns” sediado no Pólo Universitário. O evento é organizado pelo Núcleo Norte Fluminense do INCT Observatório das Metrópoles, que integra pesquisadores da UENF, UFF, IFF, UCAM e UFRJ. A atividade conta com apoio da FAPERJ e é realizada em parceria com a Subsecretaria de Educação de Macaé.

O II Fórum se inscreve no propósito que os diversos núcleos do INCT Observatório das Metrópoles formularam desde o começo de 2024, de incidir com ideias e reflexões surgidas das pesquisas científicas, para o desenvolvimento urbano das cidades, no marco das eleições municipais deste ano. Trata-se de uma iniciativa decisiva, inclusive por pautar as possibilidades de atuação concertada em âmbito intermunicipal, o que normalmente não entra espontaneamente no debate. Este próprio espaço cedido pela Folha da Manhã é outra dimensão do nosso esforço.
Nossa pretensão é ao mesmo tempo modesta e ambiciosa. Modesta porque não se arvora qualquer senso de superioridade sobre outras vozes presentes ao debate. Ambiciosa porque cultiva a expectativa de colocar no debate público, os achados de uma pesquisa em rede que dificilmente estariam à disposição do debate regional de outra maneira.
O olhar acadêmico ajuda a mapear os interesses em jogo, os conflitos estabelecidos ou latentes e os riscos associados a certas decisões coletivas. Dependendo da perspectiva teórica que embasa os estudos, a academia ajuda a dar visibilidade a atores simplesmente desconsiderados em suas demandas e até mesmo no seu direito de continuar existindo.
Tudo isso tem a ver com o caráter político da nossa atuação, que é explícito e não se confunde com militância partidária. É político porque atuamos sob certos pressupostos de universalização do direito à cidade, de fomento à cidadania, de fortalecimento de grupos sociais tradicionalmente subalternizados nos conflitos urbanos. Por outro lado, somos movidos por uma perspectiva plural dos pontos de vista teórico-metodológico e ideológico, reconhecendo a multiplicidade de visões cabíveis em qualquer questão (para além da diversidade dos interesses pura e simplesmente considerados).
Nesse sentido, o II Fórum aborda as diversas pontas e possibilidades do desenvolvimento da nossa região. Os debates previstos analisam os impactos da economia extrativista na sustentabilidade e dinâmica ambiental, nas capacidades dos municípios para implementar políticas urbanas inclusivas, a importância da transparência pública e a participação da sociedade civil nos diversos ciclos orçamentários e a possibilidade de cooperação entre os municípios da região. O evento é aberto para todos os setores da sociedade, isto é, ativistas, estudantes, agentes do poder público e cidadãos em geral.
Além do conjunto de debates, o evento terá o lançamento do livro “Desenvolvimento Urbana e Governança: Para uma agenda do Norte Fluminense”, e a apresentação do repositório de Bases de Dados regional para auxiliar na formulação das políticas públicas. Ambos os produtos foram realizados pelo Núcleo Norte Fluminense do INCT Observatório das Metrópoles, através do projeto “Como se Governam as cidades? Os desafios institucionais para o desenvolvimento urbano do Estado do Rio de Janeiro, financiado pela Fundação de Amparo às Pesquisas no Rio de Janeiro, FAPERJ.
O modo de inserção do Norte Fluminense na economia nacional precisa ser pensado e debatido, ainda que a sociedade tenha limitado poder de interferência no processo. Em resumo, o atual padrão baseado em grandes empreendimentos (sobretudo petrolíferos, portuários e afins) tem tendência fortemente excludente, pois deixa fora das possibilidades de ganho amplos segmentos da população. Mais ainda, tende a aumentar a segregação socioespacial, levando a uma organização do espaço urbano estruturada em ilhas de prosperidade e bem-estar (das quais os condomínios horizontais de alto padrão são o emblema) cercadas por espaços dominados pela precariedade e muitas vezes por ilegalismos como o tráfico de drogas e as milícias.
Esse estado de coisas reflete, em grande medida, os dilemas mais amplos do nosso país, para quem “sobrou” esse padrão de crescimento econômico na divisão internacional do trabalho. Essa dimensão macro dos nossos problemas, que está na raiz da constituição da pesquisa em rede do INCT Observatório das Metrópoles, indica o quanto é difícil optar por caminhos diferentes, remando contra a maré; mas o reconhecimento do desafio não pode significar um conformismo e uma renúncia à prerrogativa de disputar narrativas e modelos de sociedade no espaço público.
Para dar exemplos próximos, a exploração e produção de petróleo na Bacia de Campos, a partir da década de 1970, foi uma decisão que ultrapassava o âmbito dos municípios da região, mas há testemunhos oculares de que a ida da base de operações da Petrobras para Macaé foi uma decisão política tomada em uma reunião da elite usineira campista. Quem mais participou desse debate? Que motivos levaram essa elite a rejeitar a presença da estatal? Outro exemplo: a implantação do Porto do Açu em São João da Barra se insere nessa já referida modalidade de inserção internacional do nosso país, mas se o poder público municipal não tivesse adequado sua lei de uso do solo, o empreendimento não teria sido viabilizado. Como foi tomada essa decisão? Houve debate? O empreendimento seria “bom para todo mundo”?
Será que vamos continuar apostando nossas tentativas de desenvolvimento regional em grandes empreendimentos como portos, refinarias e afins? O debate eleitoral será muito mais construtivo se conseguirmos pautar as questões e os dilemas que afligem a coletividade e assim superarmos a dimensão “paroquial” que tantas vezes reduz a disputa municipal a uma luta por hegemonia entre grupos descomprometidos com o interesse público.

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    O Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) Observatório das Metrópoles é uma rede nacional de 18 Núcleos de Pesquisas e Programas de Ensino de Graduação e Pós-Graduação que analisa os desafios metropolitanos para o desenvolvimento nacional. Integrado por mais de 400 pesquisadores e professores de distintas universidades brasileiras, o INCT se propõe, nesse espaço, incidir sobre a agenda pública sobre os temas centrais do destino das cidades no marco das eleições municipais de 2024. Visando dialogar com amplos espectros sociais, nosso objetivo é transferir conhecimento e informação qualificada, decorrentes das nossas pesquisas, para definir um futuro inclusivo, sustentável e redistributivo das cidades brasileiras. O Núcleo Norte Fluminense (NNF) do INCT, responsável pelos artigos publicados neste espaço, é integrado por mais de 25 intelectuais de diversos Programas da UENF, UFF, IFF e UCAM em Campos dos Goytacazes. Nossa intenção é apresentar propostas e chaves para pensar o desenvolvimento econômico e social da nossa região.