Entre fortunas, erros e virtudes, Campos decidiu reeleger o príncipe
Edmundo Siqueira 07/10/2024 20:19 - Atualizado em 07/10/2024 20:27
Arte digital criada com IA
Arte digital criada com IA / Edmundo Siqueira


Foi em primeiro turno. Em votos válidos, Wladimir recebeu 69,11%. Uma vitória esmagadora que provou que o prefeito de Campos não teve apenas habilidade política ou o bom uso do sobrenome que carrega. Quem acompanhou o jogo pôde perceber que ele soube trabalhar com dois fatores essenciais da política: a “virtù” e a “fortuna”.

Essa coisa de virtude e fortuna foi explicada na política por Nicolau Maquiavel — que era tudo, menos um ingênuo —, quando escreveu sua obra seminal “O Príncipe”, em meados de 1500. Em suma, o governante precisa de talento para liderar (virtù) e sorte para aproveitar as oportunidades (fortuna).

Wladimir, que não nasceu ontem, soube jogar com os dois. De um lado, ele carregou a política local nas costas, fazendo o que sabe fazer melhor: articulação. De outro, teve a sorte de navegar por um cenário onde seus adversários somados não conseguiram chegar a 10% dos votos, com exceção da Delegada Madeleine, que conseguiu 24,22% dos votos válidos, e mostrou forte consistência em todas as zonas eleitorais.

Em Campos, uma cidade com problemas endêmicos de infraestrutura e serviços públicos deficitários, principalmente em transporte, ele conseguiu o que parecia improvável: alta popularidade, alta taxa de conhecimento e a reversão de uma impopularidade histórica de seu grupo na chamada “pedra”, na zona 98. Isso não é pouco. Maquiavel aplaudiria.

Ele soube usar a máquina pública para agradar o povo com programas sociais, melhorias pontuais e espetacularização do fazer político. E ainda mais importante: Wladimir conhece o cheiro do poder e, como bom estrategista, sabe quando avançar e quando recuar. E demonstrou uma baita habilidade em gestão de crises.

A exceção, que confirma a regra, foi a relação com a Câmara, que não soube manejar e acabou perdendo a presidência em um momento crucial para seu governo, momento onde também recebeu questionamentos agressivos da oposição.
Folha1
A “fortuna”
A sorte (fortuna) sorriu para ele quando seu xará, o presidente da Rússia Vladimir Putin, iniciou contra a Ucrânia, um de seus países vizinhos, uma invasão militar, marcando uma escalada para um conflito que começou em 2014. Entre outros fatores, a guerra elevou o preço do barril de petróleo, e a petrorentista Campos viu seus cofres gordos novamente. Soma-se a isso uma retomada natural da economia no pós-pandemia, e o cenário é bastante favorável.

A sorte foi dele, e ele soube aproveitá-la. Maquiavel dizia que a “virtù” do governante é sua capacidade de se adaptar às circunstâncias. O resultado eleitoral refletiu a sorte e a virtude Wladimir, mas também foi permitida por uma oposição que não soube se organizar. Parecia que todas as forças estavam fora de lugar na campanha. Os números estampados nos bonés muitas vezes eram diferentes da atuação partidária. Havia bipolaridade em uma oposição que deveria estar plenamente sadia. Além da campanha, a “pacificação” de antes, entre o grupo Bacellar e Wladimir favoreceu o prefeito, que fez cara de paisagem e colheu os frutos dela.

Contrariar as estatísticas é o desafio
Wladimir Garotinho navegou com destreza entre a virtù e a fortuna. Ele fez o que precisava, jogou com as cartas que tinha e venceu a partida. Mas o problema de brincar de príncipe é que o castelo, uma hora ou outra, pode começar a ruir. Não será o primeiro, nem o último a ver a “fortuna” mudar de humor.

Campos dos Goytacazes, esse feudo resistente, pode ser generosa com seus líderes, mas é impiedosa quando as promessas não resistem à realidade. Wladimir, esperto como o clã lhe ensinou, sabe que o jogo não acabou. Se Maquiavel estivesse por aqui, talvez dissesse que agora começa o verdadeiro teste: sobreviver à própria sombra.

E aí, meu caro Wladimir, quando a “fortuna” cansar de você, seu verdadeiro feito vai ser contrariar o que lhe favoreceu nessa eleição: as estatísticas. Precisará fazer um segundo governo melhor que o primeiro.

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