O que foi aprovado, a toque de caixa, na Câmara dos Deputados na última terça (13), com pouca transparência e interesse coletivo, foi um projeto que altera o texto do ordenamento que é conhecido como “Lei das Estatais”. Em vigor desde julho de 2016, essa lei tem como objetivo barrar interferências políticas nas empresas vinculadas ao governo federal.
Caso o que foi decidido na Câmara na terça seja acompanhado pelo Senado (possivelmente no próximo ano), o prazo de quarentena para os dirigentes partidários, ou que tenham participado de campanhas, exercerem a chefia de estatais é alterado substancialmente. Passa de 36 meses para apenas 30 dias.
A alteração foi aprovada por uma maioria significativa dos deputados: 223 votos a 123. O PT e outras legendas de esquerda foram majoritariamente a favor, e integrantes das bancadas do PSDB e Novo votaram em sua maioria contra.
E o Centrão? E os bolsonaristas?
Mas não se tratou de uma disputa ideológica. O que estava em jogo na Câmara era a busca de uma forma mais livre e eficiente para fatiar o poder, e permitir políticos “profissionais” no controle das estatais. Nessa, na disputa real, o chamado Centrão (ou centro fisiológico) demonstrou que continua ganhando.
Bolsonaristas radicais como Carla Zambelli e Eduardo Bolsonaro votaram a favor da alteração do texto, assim como muitos outros dos partidos mais à direita. Mostra que a ideia central de alterar a Lei das Estatais não é favorecer o PT; mas aumentar a participação do Centrão no próximo governo, no modelo petista.
Modelo que tende a voltar a ser como era antes nos governos petistas, onde o poder foi dividido com o Centrão e com uma grande quantidade de partidos. O mensalão do início do governo Lula foi uma forma de controlar o Congresso pelo dinheiro. Não deu certo. Lula precisou governar com o Centrão efetivamente.
Dilma tentou algo diferente. Se isolou do legislativo e quis governar sozinha. Sofreu impeachment. Bolsonaro tentou algo diferente, através da retórica “anti-establishment”. Não conseguiu, e precisou entregar o orçamento do governo a Arthur Lira, presidente da Câmara, para não ser impichado.
O que a mudança da Lei das Estatais prova é óbvio: no sistema político em vigor no Brasil, não se governa sem o Centrão. Ele é inevitável.
E o Mercadante?
O que talvez tenha sido um erro político do Lula (ou uma estratégia, ou um teste, vai ser preciso maturar) foi a indicação de seu ex-ministro, Aloizio Mercadante, para o BNDES ter sido feita exatamente quando se aprovava uma lei que iria beneficiar a sua escolha.
Sem o anúncio coincidente, talvez a discussão estivesse focada na ação dos deputados em aumentar seu poder, mas voltou-se a Mercadante, com toda razão de ser.
Lula oscila entre a necessidade premente de fazer um governo realmente de frente ampla, com a escolha de ministros petistas e identitários (como no recriado Ministério da Cultura, conversa para a próxima publicação). Mercadante representa a velha guarda do PT: gente que teve oportunidade de definir os rumos do país e muitas vezes não fizeram a coisa certa.
Mas talvez Mercante não precisasse da mudança na Lei das Estatais para assumir o BNDES. Juridicamente existem brechas, uma vez que Mercadante atuava enquanto presidente da Fundação Perseu Abramo e atuou na transição como voluntário.
Se insistir em governar o Brasil com olhos de 2006, Lula não terá entendido nada. Arrogância, imposições de nomes que apenas o PT aprove e desvincular o cuidado social do fiscal, não é o que se espera do novo governo. Fazer isso não é atuar politicamente. É politicagem.