Além disso, sua missão na gestão do município precisará ser muito mais “lulista” que “bolsonarista” no segundo biênio. Wladimir terá — principalmente após perder o controle da Câmara para a oposição — que governar na conciliação; não no conflito.
A relação do Executivo com a Câmara não foi “conciliatória” nos dois primeiros anos. Temas como o Código Tributário, aprovação das contas da ex-prefeita Rosinha, eleições nacionais e uma arrastada eleição da mesa diretora, além de rachar a base, dificultaram o diálogo necessário entre os poderes.
Wladimir se distanciou do estilo de seu pai, Garotinho, aderindo uma forma de governar e fazer política menos belicosa. Chegou a ser criticado pelo próprio genitor em setembro passado, por apoiar “gente de fora” e “virar as costas” para ele e sua irmã, Clarissa.
O prefeito de Campos faz bem em impor sua forma de governar, preferindo o diálogo ao confronto constante, como fazia (e faz) Garotinho. Mas ao mesmo tempo expõe uma divisão em seu grupo político, colocando parte de seus apoiadores em dúvida sobre quem seguir, qual “lado” do grupo aderir.
Assim como Lula, Wladimir tem missões primordiais para os próximos dois anos de governo. A primeira é a governabilidade. Sem um aliado na presidência da Câmara de Vereadores, não poderá se dar ao luxo de manter-se distante do legislativo. Terá que compor e dialogar muito mais. A seu favor tem o remanejamento orçamentário de 20% conquistado e menos um voto na Casa, já que o presidente não vota em algumas matérias. Mas, pauta os trabalhos.
A segunda é azeitar a base. Assim como Lula, precisará diminuir os atritos nos subgrupos internos. E, como o próximo governante federal, possui em seu staff gente que pensa diferente, que tem visões de mundo opostas e posições políticas diversas (situação evidenciada no último pleito, onde o primeiro escalão da prefeitura se dividiu entre Lula e Bolsonaro).
A terceira (e talvez mais importante) é entender o momento histórico. Aqui Wladimir se distancia de Lula, uma vez que não precisará fazer um governo de transição e de reconstrução democrática. Mas assim como o petista, precisa aceitar que é refém de conjunturas. Campos precisa, urgentemente, perder a dependência dos recursos vindos de royalties e participação especial, e consolidar seus potenciais econômicos e vocações.
Os potenciais
As áreas de agricultura, cultura e comércio precisam não apenas ser fortalecidas, mas convergir. Essas pastas precisam reconhecer que muitas de suas ações são correlatas e impulsionadoras do desenvolvimento local, pois utilizam como matéria prima os maiores potenciais que Campos possui.
Na agricultura, pensar em infraestrutura e nas cadeias produtivas é essencial. Para isso, é preciso comercializar e escoar a produção local, chegando às redes de supermercados mas também nas feiras.
Na cultura, é preciso que se pense nos patrimônios, igrejas e equipamentos culturais como ativos, não como problemas. O potencial turístico que podem trazer é enorme.
No comércio, é preciso diálogo e aproximação com as entidades de classe para saber os gargalos que o setor produtivo enfrenta e reformular, para que os entraves diminuam e empregos sejam gerados. Além disso, possibilitar formas de parcerias público privadas com regulação e espírito público, mas também com sustentabilidade.
Um exemplo prático
Tomemos como exemplo o Mercado Municipal. O complexo comercial possui a feira, o camelódromo e no meio um prédio centenário de alto valor histórico-cultural. Este, invisível e sem uso; desperdiçado. A convergência das três grandes áreas citadas traria ganhos enormes à cidade.
Levar a feira para a praça da República, atrás do terminal rodoviário do centro, poderia dar melhores condições de trabalho aos feirantes, e também aos consumidores. De quebra, abre-se o prédio do Mercado, com sua bela torre do relógio, com um edital de ocupação comercial, como vários exemplos de mercados exitosos. Agricultura, cultura, comércio e turismo caminhando juntos.
Em conjunto, um Banco de Alimentos, na mesma praça, poderia trazer desenvolvimento e diminuição das desigualdades, trabalhando agricultura e comércio. São ideias já pensadas, projetos que já existem, basta trazê-los à realidade.
As dificuldades
Qualquer governo, federal, estadual ou municipal, enfrenta a dificuldade de conciliar interesses e definir prioridades. Muitas vezes o cobertor é curto, e alocar recursos em uma iniciativa significa retirar de outra.
Porém, além de ser o papel do gestor público contornar essas dificuldades, Campos possui particularidades positivas. É um município grande, com população em número considerável, localização privilegiada e potencialidades ainda pouco exploradas.
Mas, é preciso mudar a cultura, a forma de pensar da gestão pública como um todo, e isso é sempre difícil e custoso. O que não faz com que deixe de ser essencial. Para os próximos dois anos, Campos precisa se encontrar com ela mesma, reconhecer seu potencial e trabalhar suas demandas. Poder público, sociedade civil, setor produtivo e legislativo precisam entender isso.
Fazer com que a cidade e as secretarias de governo andem na mesma direção não é tarefa fácil, pelo contrário. Mas assim como o Brasil, é o que exige o momento histórico. E o conflito não está nesse rol de exigências.