Edmundo Siqueira
02/04/2022 10:30 - Atualizado em 02/04/2022 10:35
“Eu só vou ao Centro quando preciso — do contrário, vou à Pelinca”.
Essa é uma frase facilmente entreouvida por um morador de Campos, em algum elevador, ou quando passa por um grupo de conterrâneos conversando ao sair do trabalho. Talvez ela tenha algum sentido hoje, principalmente se pensarmos na oferta de vagas de estacionamento, ou na qualidade de nosso transporte público. Mas nem sempre foi assim em terras goitacá.
Confesso que sou um desses campistas que se rende ao conforto e estrutura do “Baixo Pelinca”; de contornar o Palácio da Cultura (mesmo fechado), passar pelos flamboaiãs em frente à Santa Casa, lembrar-se das consultas ao pediatra no prédio do CDT, ou dos passeios no Parque Centro nos tempos de escola. Além da segurança e oferta de lojas de departamento e de grife, dos bons restaurantes, agências bancárias e outros tantos serviços a um atravessar de faixa de pedestre onde os carros param (talvez o único em Campos).
Mas ao mesmo tempo sou também um entusiasta do Centro. É por lá que a verdadeira Campos acontece. Onde temos a convivência entre os diferentes, onde a diversidade convive em relativa harmonia. É no Centro — em suas principais praças e espaços públicos — que a população campista pode manifestar sua territorialidade e ocupá-la física e socialmente. Ali, andando no Boulevard Francisco de Paula Carneiro, os fiéis podem demonstrar sua fé, os ambulantes seus produtos e cremes milagrosos, onde os poderosos mostram seu poder, e os pobres, sua pobreza. Expostas, ali estão, as potencialidades e as mazelas de uma cidade.
Em Campos, não se pode falar em praça pública (como toda praça é de fato) sem que sejamos apresentados à imagem mental da ‘Praça do Santíssimo Salvador’, à margem do Rio Paraíba do Sul de “mágica torrente" — apesar de haverem outras tantas praças e logradouros de importância vital para a formação da cidade. Na Campos colonial ela cumpria um papel emancipador, sendo palco de muitas manifestações dos costumes e hábitos dos primeiros campistas que se reconheceram organizados como uma cidade, de fato.
"Podemos citar vários bairros nobres e suas peculiaridades, mas devemos entender que é no centro que as coisas acontecem. Ali mora a grande parte da saúde vital da cidade. Observar como as grandes cidades fazem e aplicar aqui. Temos tanto a explorar...imaginem como seria legal termos um evento com uma roda de samba ali, com músicos locais e comida de rua?! É o simples que dá certo." (Juliana Ribeiro)
Sim, a Praça foi descaracterizada, sobrando apenas o chafariz belga e aquele soldado. Toda beleza bucólica e árvores centenárias foram extraídas do local à revelia. Mas estão lá de pé vários prédios históricos, inclusive a igreja central, de grande beleza, representativos, e que são um passeio arquitetônico pelos séculos. E temos um museu, em pleno funcionamento, instalado no Solar do Visconde de Araruama.
Mas a cidade é algo mais do que um amontoado de indivíduos. Para definirmos uma cidade é preciso entender seu modo, sua cultura, seus costumes, tradições e suas determinações históricas e também as contemporâneas. A cidade é, essencialmente, as pessoas que nela vivem, o que ultrapassa — em muito — a frieza de um simples amontoado de instituições administrativas, de tribunais, hospitais, escolas, polícia e funcionários públicos.
Make o Centro Great Again
"<br>Quem ganha com o evento “Centro Fashion Day” é a população que teve acesso gratuito a um grande evento de moda, gastronomia e arte. Ganhou também todo comércio da área central que precisa cada vez mais evoluir e investir" (Edvar Jur.)
É preciso inverter a lógica de que só se vai ao Centro quando precisa. É preciso fortalecer um ambiente plural e magnífico como o nosso Centro Histórico. O comércio, os serviços, restaurantes e agências bancárias também estão ali, e não perdem para a Pelinca.
Por óbvio, é preciso criar infraestrutura, e depende do poder público. Mas um “primeiro passo” muito interessante foi dado nesta última quinta (2). O Centro Fashion Day foi um evento que aconteceu na Praça principal do Centro, com exposições artísticas, artesanato, praça de alimentação com food trucks e cerveja artesanal, apresentação musical e vinte lojas expondo suas coleções outono/inverno em um desfile com modelos profissionais.
O Centro estava grande, outra vez.
Muitas pessoas e instituições participaram do evento. Prefeitura, CDL, Sebrae, Senac, Acic, Carjopa, Sindvest, Sindivarejo e outras. Conversei com dois dos principais personagens envolvidos. Edvar Jr. e Juliana Ribeiro falaram um pouco sobre o que viveram ali e da energia de estar no Centro da cidade fazendo história — o evento foi prestigiado pelo secretário de Desenvolvimento Econômico e Turismo, Marcelo Mérida, e por influenciadores digitais de Campos, entre eles Gabriel Farhat e Lucas Ranfer, este muito atento às questões culturais e de patrimônio histórico (veja aqui os vídeos sobre Campos que ele produz).
Edvar e Juliana tem muitas características em comum, mas a simpatia, capacidade de trabalho, paixão por Campos e hiperatividade não-patológica criativa se fizeram presente no Centro. Eles deram um testemunho sobre o que viram e sentiram por lá:
"Queremos ampliar o acesso a mercados e geração de negócios. Queremos ampliar a visibilidade das marcas locais e fazer uma integração entre diversos segmentos, com uma agenda onde a conexão das lojas, das confecções, das empresas e do artesão, seja cada vez mais aproximada com seu público-alvo em agendas que encantem a sociedade e promovam o ambiente onde estamos.
Quem ganha com o evento “Centro Fashion Day” é a população que teve acesso gratuito a um grande evento de moda, gastronomia e arte. Ganhou também todo comércio da área central que precisa cada vez mais evoluir e investir em novas formas de vender seus produtos e serviços para enfrentar todos os desafios que são colocados diariamente na frente do empresário.
"Nós estamos investindo e realizando diversas ações contínuas para que o empresário local possa cada vez mais ampliar seu faturamento, se capacitar, ter acesso a crédito e principalmente gerar resultados positivos, que vão proporcionar uma economia cada vez mais fortalecida" — Edvar Chagas Jr., empresário, presidente da CDL Campos e organizador do evento.
"Vim morar aqui quando criança, e naquela idade eu não tinha o direito de opinar absolutamente nada, no entanto, senti que Campos me escolheu. Anos se passaram e eu posso afirmar que não demorou muito para que eu escolhesse Campos também.
Minha família é comerciante. O primeiro negócio do meu pai aqui, foi no centro, na beira rio, ao lado do extinto banco BANERJ. Meu carinho pelo centro vem de outras gerações. Fiquei extremamente feliz em participar de um evento nessa semana onde a grande cena era a Praça São Salvador. Podemos citar vários bairros nobres e suas peculiaridades, mas devemos entender que é no centro que as coisas acontecem. Ali mora a grande parte da saúde vital da cidade.
Gostaria de ver e viver um projeto de revitalização no nosso centrão, que deveria acontecer independente do poder público. Lojas de departamento e restaurantes sempre trazem fluxo de gente, e consequente gira a economia local. Mais infraestrutura e segurança também. Observar como as grandes cidades fazem e aplicar aqui. Temos tanto a explorar...imaginem como seria legal termos um evento com uma roda de samba ali, com músicos locais e comida de rua?! É o simples que dá certo. Para olharmos a cidade como um todo, primeiramente é preciso olhar para o centro.
Sigo otimista e aberta a promover eventos e oportunidades de negócios nessa cidade que me acolheu, e principalmente no centro, onde entendi que a simplicidade é o último grau de sofisticação" — Juliana Ribeiro, publicitária e influenciadora digital.