Felipe Manhães: Cardápio digital em restaurantes, pode isso?
Durante a expansão da Covid-19 pelo mundo, algumas práticas se fizeram necessárias para tentar controlá-la, e o cardápio digital nos bares e restaurantes foi uma delas. No entanto, mesmo com o fim da pandemia, isso virou moda e permanece até hoje, o que tem gerado reclamações de muitos consumidores.
Sabemos que nossos hábitos estão cada vez mais virtuais, mas somos mais de 200 milhões de habitantes e essa não é a realidade de todos os brasileiros. Nem todo mundo possui um smartphone, e mesmo que fosse o caso, temos o direito de, pelo menos na hora de comer, estarmos desgrudados do celular. Inclusive por questões de segurança, muitas pessoas também evitam sair com o telefone à noite ou de dia em locais mais vulneráveis.
Por isso, a exclusividade de cardápio virtual acessado via QR Code tem criado constrangimentos e transtornos para pessoas idosas e demais cidadãos que não estão com celular no momento da refeição ou mesmo dependem da conexão de internet, muitas vezes sequer disponibilizada pelo estabelecimento, o que faz com que o cliente tenha que se retirar do local.
A tecnologia deve ser aplicada apenas como forma de oferecer mais conforto ao consumidor, não de restringir ou dificultar o seu acesso às descrições e preços dos produtos. Suprimir os cardápios físicos é ruim para o próprio restaurante, que perde a clientela “raiz” e aqueles desprevenidos.
Por isso, foi sancionada no estado do Rio de Janeiro a Lei nº. 10.032/2023, que obriga bares e restaurantes do estado a disponibilizarem cardápio físico. Dessa forma, fica proibido que só seja oferecida a versão digital ou por QR Code. A medida se estende ainda a lanchonetes, hotéis, motéis e similares que comercializam bebidas, refeições ou lanches.
O texto estabelece que os estabelecimentos deverão dispor de cardápio impresso, em papel, plastificado ou não, além do QR Code ou cardápio digital. A norma ressalta que os custos da impressão do menu não poderão ser repassados ao consumidor, o que é óbvio.
Na elaboração do cardápio, deverá constar, obrigatoriamente, o nome do prato e o preço, de forma “legível e ostensiva”. Os valores e as aplicações de multas em caso de descumprimento caberão ao Poder Executivo.
Outros estados seguem a iniciativa fluminense, como Ceará, Distrito Federal, Goiás, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Paraná e São Paulo, e já aprovaram leis ou estão em fase de tramitação de projetos.
No âmbito federal, essa regra está a caminho. A Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara dos Deputados já aprovou projeto de lei que obriga restaurantes, lanchonetes, bares e similares a disponibilizarem cardápios impressos aos consumidores nos atendimentos presenciais.
Conforme a proposta, será admitido o uso de cardápios digitais desde que haja oferta simultânea de cardápios impressos. O texto proíbe os estabelecimentos de exigirem cadastro prévio para cliente acessar os cardápios.
Estabelecimentos que optarem oferecer equipamentos eletrônicos para acesso do cliente ao cardápio deverão garantir que esses aparelhos sejam de fácil manuseio e que o conteúdo digital apareça de forma clara e legível.
Segundo o substitutivo, ficarão fora das novas regras os estabelecimentos que praticam exclusivamente o autoatendimento pelo cliente. Eventuais infrações estarão sujeitas às sanções previstas no Código de Defesa do Consumidor.
Respondendo, portanto, à pergunta feita no início da coluna, não, nenhum estabelecimento do estado do Rio de Janeiro pode oferecer cardápio apenas de forma digital, mesmo que o local forneça um tablet ou similar.
*Felipe Manhães é advogado