Intolerâncias religiosa, de gênero e étnica são temas trabalhados pela artista plástica campista Lilian Vieira na exposição “Nós”, que segue aberta até quinta-feira (7), na loja Artmanha, localizada na avenida Amaral Peixoto, 5.578, no Centro de Rio das Ostras. A mostra, aberta na última semana, tem entrada franca. O público pode apreciar as obras de Lilian entre esta segunda (4) e quinta (7), das 9h30 às 19h.
A artista — que é formada em Artes pela Escola de Artes Visuais do Parque Lage, no Rio, e fez parte da Associação de Artistas Plásticos de Campos dos Goytacazes — explicou que criou as telas que compõem “Nós” após ouvir, de uma amiga carioca, a seguinte frase: “A busca individual de cada um, para a paz ou tempestade, pode ou não ser inerente à espiritualidade”. — Achei a frase belíssima, e foi ela o gancho para começar a exposição — disse.
Com uma bagagem composta por leituras, músicas, cores, texturas e recortes — vindos de uma longa experiência —, Lilian Vieira imprimiu nos 13 quadros e uma instalação que integram a exposição ícones de fortes representações pessoais e do profundo estudo sobre religião e religiosidade.
— Minha inspiração partiu do intuito de provocar uma reflexão sobre para aonde estamos caminhando e como temos lidado com as diferenças, tão representadas nos labirintos expostos nas telas. Os negros, por exemplo, são os que mais morrem assassinados e, por meio de pesquisas, descobri que as religiões de raízes africanas são as que mais sofrem preconceito, com cerca de 73% dos casos de intolerância, bem maior que outras religiões — comentou.
Lilian falou, também, sobre a importância de se trabalhar um tema tão recorrente.
— Na verdade, isso, infelizmente, é reflexo do que a gente vive hoje. As telas têm visões críticas com o objetivo de fazerem as pessoas refletir sobre o assunto.
Para fazer os trabalhos, Lilian Vieira se inspirou nos também artistas plásticos Aluísio Carvão e Carlos Scliar, seus mestres. Nas telas, vários elementos, como cartas e naipes de baralho, tinta acrílica misturada ao papel, cordões e triângulos de cores e tamanhos variados, geometria do feminino, e tudo isso fazendo uma mistura com símbolos representativos de entidades da Umbanda, como o machado e a seta.
Uma das telas aborda o assassinato da vereadora Marielle Franco, que aconteceu no último dia 14 de março. Nela, a artista expressou as várias lutas de Marielle.
— O objetivo, com isso, era lembrar desta mulher, que fazia parte da comunidade LGBT, era negra e trabalhava em prol do fim da violência contra mulheres. As outras telas também abordam assuntos como a questão da sexualidade, a intolerância em questão de religião e a frase que deu origem à exposição. Já na instalação eu retratei a questão da Torre de Babel, onde vários idiomas eram falados e as pessoas não se entendiam. Também foi composta uma trilha especialmente para esta instalação, para o público ouvir enquanto está diante da obra.
A artista também explicou o porquê do título “Nós”.
— Quando você lê a palavra “nós”, com letras minúsculas, ao contrário e de cabeça para baixo, é possível enxergar a palavra “sou”. E é isso que penso, que a gente é nada mais do que o nós, o resultado do que a gente vive e convive.
Literata e curadora da exposição, a professora Analice Martins relata: — Dizer que a cor é o signo específico da pintura pode não ser uma questão consensual. Porém, é com ela que Lilian Vieira tem construído uma poética própria que dá forma às suas “ideias-labirinto”. Ela completa: — Sempre muito vivos e fortes em todas as suas telas, o azul, o verde, o vermelho e o amarelo são, nesta mostra, um grito de enfrentamento à dura realidade que nos circunda. Resistir pelas cores e sem lugares-comuns não é tarefa para iniciantes, coisa que definitivamente Lilian Vieira não é. (J.H.R.) (A.N.)