O Pontal em Atafona e o seu encanto místico
Saulo Pessanha 05/02/2023 08:15 - Atualizado em 05/02/2023 09:40

Por ADAHIRZINHA MOLL:
O meu Pontal engole as pessoas que eu amo, as casas que eu vivi e os peixes que eu como.
Estou aborrecida com o meu Pontal. Lindo, assoreado, irado, arredio e outras vezes calmo e sombrio. Em outras vezes alegre e cheio de crianças com cheiro de lembranças...
Foi-se o tempo em que lá se fazia festas! Tinha carnaval, piqueniques, almoços chiques e até despedida do farol.
Esse era o meu Pontal! Barcos de pau misturados com lanchas e escambau.
Tudo em uma harmonia talvez tão falsa... que revoltou o meu Pontal. Foi lá que me batizei vinda doente e amarelada de Ipanema, na Guanabara.
PRIMEIRO BIQUINI

Foi lá que perdi a minha virgindade com a cachaça provada em goles. Foi lá que vi meu pai jogar tarrafa, passar arrastão e colher tudo que vinha nas redes.
Foi lá que conheci artistas, ritmistas, sambistas e golpistas. Foi lá que rolei da areia pro mar e me senti sereia capaz de amar...
Foi lá que usei meu primeiro biquíni xadrez de rosa e branco com babadinho. Aliás, nada é demais dizer que sexo oral combina com o Pontal.
SEM MEDO

Já dormi no Pontal! Sem medo porque tinha braços fortes enrolados em mim... Tive medo das lacraias porque elas picam em quem sentam nelas...
Já enfiei as mãos na lama do mangue e sem medo comi caranguejos. E os ricos davam boas gorjetas para os cantadores, cantores e catadores...
Muitos chafurdaram nas lamas desse meu Pontal! Nem é bom falar... Carrões atolavam nas areias fofas e tudo não passava de uma aventura.
ASAS LONGAS

Na capelinha dois anjos do meu tamanho e de asas longas chegaram de um lugar falido pra ficar no Pontal e fincar suas preces.
Teve gente que enterrou até alguns dentes pra não deixar de existir!
Não queria ver mais esse lugar tão místico!
Mas... vira e mexe minhas lembranças voam até lá e, de vez em quando, encontro uma paz nesse cemitério de crianças e respiro seu ar com esperança.
DEU LAGOINHA!

Ah! Já ia me esquecendo de contar! Há pouco tempo os meus netos fizeram um piquenique sentados nos escombros do avô deles. Estavam felizes!
Um deles mandou um recado com foto pelo watzap: Vó vem pra cá! Hoje aqui em Atafona deu lagoinha!

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