Sobram narrativas, falta responsabilidade: estabelecendo a verdade sobre Uenf e Arquivo, e uma visão pessoal
Edmundo Siqueira 26/07/2023 12:22 - Atualizado em 29/07/2023 10:51
Essa é uma foto profisional de ua das reuniões sobre os recursos do Arquivo, adminstrados pela Uenf. Imagens assim são utilizadas para ilustrar, e mostrar o tempo que as tratativas acontecem. As pessoas aparecem de máscara, pois aocnteceu em épocas mais graves da panedmia. Em destaque aparecem Rafaela Machado, coordenadora do Arquivo e a historiadora Larissa Manhães.
Essa é uma foto profisional de ua das reuniões sobre os recursos do Arquivo, adminstrados pela Uenf. Imagens assim são utilizadas para ilustrar, e mostrar o tempo que as tratativas acontecem. As pessoas aparecem de máscara, pois aocnteceu em épocas mais graves da panedmia. Em destaque aparecem Rafaela Machado, coordenadora do Arquivo e a historiadora Larissa Manhães. / César Ferreira
 
 
Este aqui é um espaço de opinião. Portanto, com a parcialidade que qualquer opinião tem, mas sempre com padrões éticos inegociáveis. Um analista pode — e deve — separar sua opinião e predileção pessoal nos assuntos que trata, mas sempre, valendo para qualquer pessoa, há a visão pessoal nas opiniões.

Tudo que escrevo nesse espaço é de minha inteira responsabilidade. Tenho autonomia para falar o que entendo ser pertinente, sobre qualquer assunto, e sobre qualquer pessoa. Mas, recebo de certa forma a chancela da Folha da Manhã. Escrever com esse referendo impõe a mim um enorme cuidado e apego à qualidade, verdade e dedicação em pesquisa e consulta a diversas fontes.

A Folha é o principal meio de comunicação de Campos e região. Um grupo com mais de 45 anos de história, sempre atuando com competência, credibilidade e um enorme senso de responsabilidade com a notícia. A Folha da Manhã é uma referência no jornalismo sério e profissional, e o que é publicado aqui passa por um rigoroso crivo ético e de veracidade. Além do jornal, possui a Plena TV, Inter TV (afiliada da Rede Globo) e as rádios, a Hits 99,7 FM e a FolhaFM, 98,3.

Neste blog o leitor dificilmente se depara com assuntos de cunho meramente pessoal, ou de ataques. Aqui funciona como uma coluna dentro do Folha1, e como tal, não necessariamente reflete a opinião do jornal. É assim em espaços semelhantes em jornais de circulação nacional, ou quando algum analista é convidado para falar em um programa de TV ou internet.

Isso posto, considero este um espaço dedicado à cultura de Campos. Embora a política seja tema recorrente em minhas escritas, decidi me dedicar ao estudo e aprofundamento de temas que me são pessoalmente muito caros: história, patrimônio e cultura. Também por decisão pessoal aderi ao chamado New Journalism, ou Jornalismo Literário, como é chamado no Brasil, e também no jornalismo de divulgação científica, ou “matérias de fundo”.

Mas, vamos ao assunto.

O Arquivo
Arquivo Público e Solar do Colégio - simbiose
Arquivo Público e Solar do Colégio - simbiose

O Arquivo Público de Campos sempre foi pauta deste espaço. Por dois motivos muito simples: é um dos mais importantes equipamentos culturais da região e está instalado no prédio mais antigo de Campos que ainda está de pé, um solar jesuíta do século 17 em Tocos, na Baixada Campista, conhecido como Solar do Colégio.

Ainda no governo Rafael Diniz, apurei e informei ao público falta de energia no Arquivo por falta de pagamento, também os sucessivos cortes de pessoal e o risco que o acervo corria pela fragilidade na segurança. Cumprindo um papel essencial para a sociedade, o jornalismo factual serve justamente para isso, informar e cobrar das autoridades as providências em questões de interesse público.

Os 20 milhões

Em 29 de outubro de 2021 o blog Opiniões, do jornalista Aluysio Abreu Barbosa, também hospedado no Folha1, noticiou que o Arquivo Público receberia uma verba de R$ 20 milhões para o restauro do prédio e digitalização do seu acervo. O dinheiro viria de um acordo entre prefeitura de Campos e a Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj). A instituição escolhida para receber o recurso — e administrá-lo — foi a Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (Uenf), o que foi aceito pela mesma.

O valor total do acordo foi de R$ 30 milhões. A Alerj repassou à Uenf, após a aprovação da Lei 9.515/21, oito milhões para serem utilizados na Fazenda Campos Novos (também uma construção jesuítica do século 17), em Cabo Frio, dois milhões na própria universidade e os R$ 20 milhões restantes no Solar do Colégio.

De posse dos recursos desde 25 de janeiro de 2022, a reitoria da Uenf não efetuou a compra de nenhum equipamento de digitalização para o Arquivo, tampouco iniciou qualquer obra de restauro ou emergencial nas fragilidades do prédio, que concentram-se no telhado, na segurança e nas instalações elétricas e hidráulicas.

De janeiro de 2022, até hoje (26/07), o avanço em processos licitatórios acontecem, timidamente, em sintonia com o grupo de trabalho criado entre equipe do Arquivo, procuradoria do município e Uenf. Recentemente foi lançado edital para contratação de estagiários na área de História, Geografia e Ciências Sociais.

A Sabra

Na ocasião do acordo com a Alerj, a prefeitura de Campos tinha um Termo de Cooperação assinado com a Sociedade Artística Brasileira (Sabra), que se constitui como uma associação civil, sem fins lucrativos, com sede em Betim, Minas Gerais. A Sabra atuaria como captadora de recursos, e pretendia ser parceira na restauração de patrimônios materiais de Campos, como o Solar do Colégio e Solar dos Airizes, na BR 356, Campos X São João da Barra.

Quando as primeiras tratativas para aplicação dos R$ 20 milhões aconteceram, a prefeitura pretendia utilizar a parceria firmada com a Sabra, e sugeriu à reitoria da Uenf o mesmo. A Sabra possuía, além do termo assinado com a prefeitura, um projeto aprovado no Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), órgão federal que efetuou o tombamento do Solar do Colégio.

A princípio, a ideia era aproveitar o projeto aprovado no Iphan, e fazer valer o termo de parceria para acelerar o processo de aplicação dos recursos. Porém, dois impedimentos surgiram: o primeiro dizia respeito ao projeto aprovado. O Iphan autorizou a Sabra a intervir de forma limitada no telhado e nas ripas, onde caso se deparasse com telhas ou madeiramentos específicos, de época, não poderia continuar. Portanto, a obra deveria ser embargada. O segundo problema seria a ausência de licitação. O projeto que a Sabra apresentou tinha um custo elevado, e apesar de ser normal prever que intervenções em prédios históricos podem ter “surpresas” que venham a fugir do orçamento inicial, a Uenf entendeu que não havia possibilidade de incluir o projeto em caráter emergencial, dispensando o processo licitatório.

Apesar do Arquivo ter sido inundado nas últimas chuvas, a reitoria da Uenf avaliou bem. Trata-se de recurso público e a aplicação deve ser feita resguardados os princípios da impessoalidade e moralidade, e aderente à Lei de Licitações.

Porém, a mesma empresa, a Sabra, tem outro termo de parceria, de condições parecidas, com a prefeitura de Cabo Frio. E no patrimônio de lá, o processo foi diferente, apesar do mesmo problema alegado pela reitoria em Campos (a Sabra), existir. Em Cabo Frio as obras iniciaram há cerca de 10 dias.

A Uenf

Há outro princípio que a reitoria da Uenf deveria (a ainda deve) ter se atentado em relação ao Arquivo: a eficiência. Assim que a decisão de licitar o projeto fosse tomada, as providências para isso acontecer deveriam ter sido tomadas, assim como aconteceu em Cabo Frio. As condicionantes foram praticamente as mesmas, tendo como diferença a existência de um projeto do Iphan que foi utilizado como base para a licitação. Em Campos, era preciso licitar também o projeto.

Não há desculpa válida para a reitoria da Uenf manter, por quase dois anos, R$ 20 milhões parados. Caso a prefeitura insistisse ou impusesse a Sabra como executora (o que não aconteceu), a postura da Uenf deveria ter sido abrir uma licitação, devolver o recurso ou procurar a justiça. Mas, é fato que o “assunto Sabra” foi superado há mais de um ano, como confirma a coordenadora do Arquivo, Rafaela Machado.

Em reuniões que eu estive presente e que fontes minhas estiveram, foi deixado claro ao reitor da Uenf que ele não precisaria considerar o projeto da Sabra, que seguisse os trâmites que ele achasse necessário. Mesmo não sendo preciso, uma vez que era prerrogativa do reitor aplicar os recursos que estavam na conta da Uenf como ele entendesse ser certo.

Em reunião na Alerj, em 29 de novembro de 2022, que eu também estive presente para cobrir, como jornalista, portanto, ficou ainda mais explícito que o reitor da Uenf insistia em alegar um problema que não existia. Daquela reunião ficou acordado com ele e com outros presentes, que a licitação deveria acontecer no prazo de 30 dias, e que deveria englobar o projeto e as obras, feitas em licitações separadas, e que após o prédio ter condições, as compras dos equipamentos, por pregão.
Reunião da Alerj que estive presente como jornalista e ativista cultural.
Reunião da Alerj que estive presente como jornalista e ativista cultural. / Edmundo Siqueira


Ficou acordado, em resumo, que o reitor fizesse o que já deveria ter feito, sem nenhuma alteração significativa da época em que o recurso foi depositado na conta da Uenf.

A prefeitura
Wladimir Garotinho e o projeto de restauro do Solar
Wladimir Garotinho e o projeto de restauro do Solar / .
 
Outra alegação do reitor diz respeito à falta de diálogo com a prefeitura de Campos. Ela não se sustenta na medida que a equipe do Arquivo, liderada por Rafaela Machado, em conjunto com o advogado Luiz Francisco Boechat, da procuradoria do município, manteve contato constante com a reitoria da Uenf, fornecendo tudo que era necessário.

Se a queixa do reitor diz respeito ao contato direto com o prefeito Wladimir Garotinho, também não se sustenta. Wladimir foi orientado e atualizado por Rafaela em relação ao andamento das tratativas, não o contrário. Em relação a Sabra, após a conclusão que a liberação dada pelo Iphan não seria suficiente, foi acatado pelo prefeito.

O reitor ainda alega que não tem conhecimento da situação atual do Arquivo, quais seriam as necessidades e quais as emergências. Diz ainda que a prefeitura mentiu sobre as condições que a Uenf encontraria a instituição e o prédio. Da mesma forma não caberiam essas alegações uma vez que não houve nenhuma alteração significativa para o andamento atual pela Uenf.

Havia projeto aprovado pelo Iphan (mesmo que apenas para telhado), havia termo de parceria com uma associação (a Sabra), havia urgência (e ainda há) e todas as informações necessárias estavam de posse da equipe do Arquivo, a mesma há mais de 20 anos (andamento do Iphan aqui, consulta pública)
SEI/Iphan
SEI/Iphan
A prefeitura, por outro lado, deveria cobrar de forma mais efetiva a aplicação dos recursos, uma vez que a demora e omissão da Uenf poderiam custar o essencial acervo que o prédio guarda. Ações judiciais poderiam ter sido iniciadas, e reuniões deveriam ser resolutivas, com atas e prazos.

A verdade

Este espaço não se propõe a assuntos particulares, e não é o que trago aqui. Arquivo, prefeitura, Uenf e Alerj são órgãos públicos, do interesse de todos. Outro princípio que deve reger essas instituições é a publicidade. Portanto, os atos, e principalmente as omissões, devem ser trazidas ao público, que é a sociedade.

Mesmo sem pessoalidades, este é um espaço de opinião. E minha opinião é a mesma desde que percebi o atraso da Uenf, a diferença de tratamento entre o patrimônio de Cabo Frio e o de Campos, e declarações públicas do reitor que insiste em alegar o descabido.

Trata-se de incompetência da reitoria da Uenf em aplicar R$ 20 milhões dos cofres públicos depositados em sua conta. Incompetência que o tempo de execução, que ainda corre, comprova. Outros motivos não posso citar, pois carecem de provas que não tenho, e sigo princípios éticos e profissionais que não me permitem ilações.

Entre narrativas e inverdades, o Arquivo segue em risco, e 20 milhões de reais seguem parados. Para estabelecer a verdade é preciso coragem, e para cumprir obrigações é preciso apenas responsabilidade, coisa que vem faltando.

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