Meses passados desde a última publicação aqui no blog, volto com a sensação de novidade de quem perdeu a prática do que faz. Escrevo enquanto aguardo as últimas notas do curso de Letras serem publicadas no sistema, apesar de já ter comemorado o fato de que tudo acabou – pra ser bem exato, na última quinta, por volta das 20h, logo após uma análise comparativa do “Ensaio sobre a cegueira”, do Saramago.
Foi um último semestre intenso e, por isso, em branco no que se refere à criação de textos e a leituras não acadêmicas, o que serve de justificativa acanhada para o meu sumiço repentino deste espaço, “extraviando” minhas ideias para outros rumos.
Acontece que, enquanto eu escrevia os parágrafos anteriores, ainda sem saber ao certo o caminho que este texto poderia tomar, notei uma incongruência no meu relato: um (quase ex) aluno do curso de Letras acabou de justificar sua pausa na escrita em razão do curso, que é focado justamente em Língua Portuguesa e suas Literaturas.
Fato é que, em parte, é coisa minha esse negócio de suspender meu processo criativo enquanto me ocupo com a seriedade dos compromissos paralelos. Mas, para além das razões pessoais, sinto que foram raros os momentos de verdadeiro estímulo criativo ao longo da graduação, algo que, ao olhar em retrospecto, me surpreende.
Você pode pensar: é claro que não há esse tipo de estímulo, já que não é um curso voltado para a escrita e seus processos criativos, mas ao estudo analítico da língua e da literatura. Tudo bem, concordo.
Mas, sem qualquer pretensão de atribuir esse desestímulo ao curso de Letras do IFF, digo que não foram poucas, desde que entrei no curso, as vezes em que ouvi colegas falarem sobre a perda do prazer da leitura ou mesmo relatarem um bloqueio na escrita literária em razão do curso.
Reitero: não tem nada a ver com a qualidade da instituição nem com a abordagem dos gabaritados profissionais que compõem o colegiado de Letras: tendemos a desprestigiar a criatividade nos diversos níveis de ensino, independentemente de idade, curso ou instituição. Tanto é que raramente uma resposta criativa, capaz de revelar a ambiguidade de um enunciado avaliativo, vai ser pontuada por um professor que busca a gloriosa e objetiva resposta correta.
Isso diz pouco sobre o curso que fiz, mas fala verborragicamente sobre nossos processos pedagógicos de maneira geral. E é por isso que lamento por ter escrito, dentro das disciplinas do curso, apenas um poema para cada dez análises ensaísticas solicitadas pelos professores.
Os pragmáticos que chegaram aqui ao acaso podem dizer – cenho franzido e óculos na ponta do nariz – que escrever poemas não aprova ninguém em um concurso público e que dissertação de mestrado não se escreve em versos. Mas o que pouquíssimos vão dizer é que não se forma um profissional sensível apenas com a frialdade dos textos acadêmicos.
Me dói, portanto, constatar o que ouvi de alguns colegas, que se viram obrigados a substituir o prazer da leitura pela obrigatoriedade, assim como o estímulo criativo por respostas fundamentadas nos autores A ou B, pois é fato que a profissão e a academia tendem a nos afastar de certos processos empíricos – por razões óbvias, mas não menos lamentáveis.
Desses quatro anos, contudo, levarei os tantos ensinamentos e os grandes amigos que o curso de Letras me proporcionou. E digo que só aprofundei a imensa admiração que tenho pelo campus Campos Centro do Instituto Federal.
Por aqui, vou retomando a prática de experimentar com palavras, algo que eu espero jamais perder.
*Ronaldo Junior tem 27 anos, é carioca, é praticamente licenciado em Letras pelo IFF Campos Centro e escritor membro da Academia Campista de Letras. www.ronaldojuniorescritor.com