Arlete Sendra - Striptease, a crise do masculino
Arlete Sendra - Atualizado em 11/10/2023 08:19
Falocentrismo em baixa. Feminicídio em alta.
A supremacia do “falo” vem sendo desequilibrada pela nova ordem emanada da força LGBTQI+ por vir.
Se entrássemos no território do masculino, lá onde o homem, em escaninhos, se guarda, se oculta, se esconde e se desvela, como se em um divã de Freud estivesse, submetido a um striptease existencial, veríamos seu self revelado como se através de um espelho quebrado estivesse sendo visto. E seu self revelaria sua face tóxica, desarmonizada com as novas potências existenciais em vivência.
Em seus rastros transtemporais estão as cicatrizes, denunciantes das leis além-metafisicas que, em estatutos pelo homem criados, eram à mulher impostos, impedindo-a de viver das metástases inerentes à vida, anunciadoras do futuro.
Semanticamente, lá atrás, o termo “homem” era designativo do ser humano, independente do carimbo do seu gênero. Assim, a mulher estava dentro do homem. Mas tempos se passaram. Hoje, homem é homem. Mulher é mulher, ainda que o homem esteja dentro da mulher, se hospede em seu útero, nele acarinhado, aconchegado, envolvido em intenso amor, hospedagem pela qual ele não se sente no dever de retribuir até mesmo com gestos universalizantes do conviver. Paradoxalmente, ele se sente proprietário dos corpos-fêmea, e busca submetê-los como se propriedade sua.
Designação de gênero, o falo e o clitóris são reconhecidamente e apenas e tão somente, signos de gêneros: masculino e feminino. Seria perfeitamente entendível se aceitássemos que há implicações que ultrapassam nossa biologia. Somos seres híbridos. Trazemos bagagens dentro de nós que nos envolvem, estão além, muito além de anatomias e mostram códigos outros não registrados pelas convenções que alimentam os tempos.
O “somos iguais nas diferenças”, popular e por muito tempo enganador adágio, nasceu, penso eu, de um desejo de inalcançáveis desejos, inacessíveis sideras pelas mulheres sonhadas.
Experiências atávicas mostram a mulher, objeto de cama e mesa, a serviço dos apetites eróticos dos homens. Era assim. Um dia foi assim. Mas não vai ser mais assim. Já não está sendo mais assim.
E tudo começou quando um dia, a mulher adentrou-se. Se olhou. E como se em espelhos totalmente quebrados se viu. Constatou o já sabido: todos os viventes dela eram nascidos. Reconheceu-se ser. Viu-se ora Lilith. Ora Eva. Em sua consciência de não mais ser o que não ser era, iniciou seu surfar ondas que lhe mostrava cenários tantos, cenários outros a serem neles vividos. Mostravam o como ser o que ser era ser. Iniciou sua abertura lilitiana de caminhos. E caminhos por atalhos transgressores foram homeopaticamente sendo abertos. E outros tantos atalhos. E outros tantos cenários.
Atônito o homem entra em crise. Seu poder fálico pelo LGBTQI+ vai sendo minado. A midia = aplausos e louvores à mídia = insistente e sistematicamente denuncia. E o faz em linguagens reveladoras do ainda império da força animal. Incrivelmente do único animal que pensa.
Em leitura equivocada de “macho” ser, o homem analfabetizou-se em relação ao compartilhamento do conviver. Paralelamente, ou não paralelamente, a mulher abriu espaços éticos e os ampliou e os vêm preenchendo. E a constatação vem dos ontens e hojes que estão abrindo as comportas do futuro. Reconhecidamente, a supremacia do “falo” vem sendo desequilibrada pela nova ordem emanada da força LGBTQI+ e outros tantos + guardados e a serem revelados à medida que o deus janu vai abrindo janelas, escancarando portas.
O modelo ser mulher, determinação do homem, foi rascunho. Há muito está rasgado. As máquinas hodiernas ressuscitaram o neutro. E todos estamos e somos nominativos — sujeitos assim vistos pelos romanos, entre os romanos e para os romanos. Outras vênus, outras minervas e outras junos assumiram os espaços que lhes foram sonegados. E o ser bela, ser inteligente, sábia ser e empreendedora de espaços de poder adentraram-se pelo olimpo dos tempos modernos.
E o “falo”? E o “clitóris”? Perderam sua hegemonia. Ficaram no “era uma vez”.

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