Antunis Clayton
28/02/2017 16:45 - Atualizado em 02/03/2017 13:00
Um acordo com o governo federal pode significar a redenção econômica para o Rio de Janeiro, cujo governo atravessa uma das maiores crises de sua história recente. Para que tal acordo seja sacramentado, uma série de projetos encaminhados à Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) deverá ser aprovada, no sentido de se estabelecer garantias para as operações financeiras. Dois deles têm teor polêmico. O primeiro, já aprovado em plenário, autoriza o uso das ações da Cedae para viabilizar um empréstimo de R$ 3,5 bilhões. Outro determina elevação da alíquota previdenciária do servidor estadual de 11% para 14%. Entrevistados pela Folha, os deputados estaduais da região falam a respeito desse instante vivido pelo Rio e de suas expectativas para sua recuperação econômica.
Folha da Manhã — Como representante do povo fluminense, sobretudo do Norte/Noroeste, como o senhor vê esse instante de crise no Rio?
Bruno Dauaire — Como gravíssimo. E o pior é que o governo continua errando e deixando a conta para o povo pagar. Eles aprovam medidas recessivas que diminuem a circulação de dinheiro. Enquanto isso, a segurança pública, a saúde e outros setores vitais agonizam. Não encontro argumentos racionais e nem justificativa política para defender as medidas do governo.
Geraldo Pudim — Venho, desde 2014, alertando para o que iria acontecer na administração pública estadual. A diminuição da arrecadação e o aumento dos gastos resultaram no que acho ser a pior crise administrativa financeira de nossa história. Isso é uma bola de neve, pois quando o governo não cumpre com suas obrigações, há uma reação em cadeia que prejudica todo mundo. Quem me acompanha sabe do meu posicionamento, sabe que eu avisei, mas sou parlamentar, não tenho o poder de decisão do Executivo e também não adianta ficar apontando os culpados.
Gil Vianna — A crise é nacional, é grave e, claro, refletiu também no Estado do Rio de Janeiro. A recessão diminuiu a receita do país inteiro. Além disso, foram cometidos vários erros em governos anteriores, como a dependência do petróleo, que é volátil, para pagar dívidas fixas.
João Peixoto — Para o Rio de Janeiro não tem jeito. Se não entrar o governo federal, o Estado não consegue sair disso. E não é uma realidade do governo Pezão, vem rolando de vários governos. O Marcelo Alencar pegou o Estado esfacelado pelo Nilo Batista. Foram diversas privatizações para tirar o Rio do buraco e eu votei a favor em todas elas, e tenho coragem de dizer isso, porque era uma necessidade do povo fluminense. O Garotinho pegou o Estado do Rio sanado e entregou quebrado para a Benedita.
Folha — Como analisa a decisão do governador Luiz Fernando Pezão de buscar ajuda junto ao governo federal?
Bruno — O governador confiou muito na União, mas, enfraquecido politicamente, em vez de ajuda financeira, trouxe um pacote com medidas penosas que não resolvem a crise. A União não liberou recursos, não reduziu dívidas, apenas adiou o pagamento dela, em troca de um imenso sacrifício para o cidadão. O governador deveria antes ter tomado as medidas saneadoras que pudessem acabar com o desperdício e que combatessem a corrupção. Fortalecido, conseguiria um acordo melhor e evitaria a humilhação imposta ao Rio.
Pudim — Todos sabem que o Estado do Rio está com sua capacidade de endividamento acima do limite prudencial. Para que possamos amenizar o sofrimento e sair da crise, precisamos da ajuda do governo federal. Só que para receber essa ajuda, é preciso arrumar a casa, cortar gastos, equilibrar as contas para que possa ter capacidade de cumprir com o compromisso assumido com a União. O Banco do Brasil ou qualquer outra instituição financeira somente irá emprestar o dinheiro se houver garantias.
Gil — A Cedae não foi vendida. As ações da empresa foram apresentadas como garantia à União, para contrair antecipação de empréstimos e, com isso, minimizar os impactos da crise na vida da população, principalmente do servidor. Que fique claro que a Cedae foi a única garantia aceita pelos bancos em troca de crédito imediato.
Peixoto — Altamente positiva. Única maneira de salvar o povo do Rio de Janeiro. No início do governo Pezão, o barril de petróleo era R$ 145. Hoje, o mesmo barril é vendido a R$ 35. Para um Estado onde a economia é calçada na produção de petróleo... O governador está sendo sensato em aceitar o apoio de Brasília neste instante, assim como estão fazendo outros governadores, de Minas Gerais e Rio Grande do Sul, por exemplo.
Folha — Como analisa a série de medidas que esse acordo estabelece como exigência?
Bruno — Tecnicamente elas são recessivas, desumanas e focam no confisco do salário, que tem natureza alimentar, e na entrega do patrimônio público. Além da crítica, dei a minha colaboração para diminuir o problema. A única medida de ajuste fiscal estruturante até agora foi uma lei de minha autoria dando um basta na farra de R$ 138 bilhões não arrecadados em ICMS nas suspeitas isenções fiscais. O povo está cansado de pagar a conta.
Pudim — Primeiro quero dizer que a Alerj não irá receber as medidas de ajuste fiscal enquanto o governador Pezão não colocar os salários dos servidores em dia. Como já disse, o governo estadual só consegue sair da crise com a ajuda do governo federal, sem essa ajuda não há como inverter a situação. Mas, para receber essa ajuda, primeiro há que rever a Lei de Responsabilidade Fiscal, para que o Estado possa ficar sem pagar o que deve por três anos e ainda contrair o empréstimo, resolver a insolvência da previdência, diminuir seus gastos, etc.
Gil — Antes de mais nada, é preciso dizer à população que o “provável” lucro da Cedae, como alegam alguns, é muito questionável, pois grande parte dos investimentos feitos na empresa são de cofres públicos. Por meio dessa operação será possível garantir o 13º do servidor público, colocar os salários em dia, aliviar o sofrimento de milhões de pessoas, que estão com contas de água e luz atrasadas, creches dos filhos, etc.
Peixoto — O governo federal não deveria exigir tanto de um Estado tão importante para a economia nacional. A produção nacional de petróleo é calçada naquilo que oferecem os campos do estado do Rio. Mas, se a única maneira de liberar os recursos é essa... O governador Pezão, que está precisando, que vê o seu Estado e seu povo agonizando, é obrigado a aceitar.
Folha — Como votou no projeto que autoriza o uso das ações da Cedae para viabilizar o empréstimo? Por quê?
Bruno — Meu voto é contrário ao pacote do governador Pezão. A Cedae é o único ativo superavitário do Estado. Além de tudo, não houve transparência. Pergunte ao governo qual é o valor da Cedae. Nem eles sabem. Mesmo prestando serviços que precisam ser melhorados, a Cedae atende a muitos municípios, dá lucro e aumenta a receita do Estado para custear serviços, sem contar a prestação de atendimento social. Tudo isso deveria ser, no mínimo, respeitado. Tem que vender o que dá prejuízo.
Pudim — Votei conforme acho o que seja a única saída para a crise. O parlamento precisa fazer sua parte e ajudar o governo estadual a sair dessa situação que prejudica a todos. Para pegar o empréstimo de R$ 3,5 bilhões junto ao Banco do Brasil, o governo precisa dar garantias e a única forma foi autorizar a alienação das ações da Cedae.
Gil — Votei a favor da população, a favor dos servidores públicos, que beiravam o desespero. Quero ressaltar que a Cedae, em nossa região, já não prestava serviço de qualidade há muito tempo. Na Baixada Campista, a qualidade desse serviço é ainda pior. Além disso, grande parte dos seus funcionários já está apta para a aposentadoria.
Peixoto — É preciso que se deixe bem claro que a Cedae não está sendo vendida. Suas ações ficarão como garantia do empréstimo, que é a única saída para tirar o Rio da crise de hoje. Trata-se de uma ação para o bem do povo fluminense, como foram as privatizações do Banerj, da Cerj, da CEG.
Folha — Como vê a possibilidade de aumentar a alíquota previdenciária do servidor, que hoje recebe o salário em atraso e em parcelas?
Bruno — Vejo como absurda. Isso é confisco e eu voto contra. É um tapa na cara do servidor ver diminuído o seu salário, que é resultado do seu suor, para cobrir rombo por má gestão e corrupção. A crise foi construída em 10 anos pelas mãos desse governo. Não sou contra uma atualização previdenciária, mas com causas, efeitos e objetivos diferentes e provocada pelos mais interessados, que são os contribuintes.
Pudim — Essa discussão vem desde o ano passado e nós, naquele momento, acordamos que iríamos ter um aumento escalonado de 1% ao ano saindo de 11% para 14%, ou seja, em três anos. Esse é o entendimento da maioria dos deputados. Nosso objetivo é diminuir o impacto no bolso do servidor, que é o mais penalizado nesta situação.
Gil — A matéria da alíquota ainda não chegou à Casa, mas vamos olhar com muito carinho e fazer sempre o que é melhor para a população. Sou servidor também, sou policial militar e jamais vou querer prejudicar os servidores públicos. Ao contrário, estamos buscando meios concretos para ajudá-los.
Peixoto — Tenho consciência da pressão que isso terá na Alerj. Meu voto será favorável sim, pela necessidade atual, mas acho que o trabalhador precisa de uma contrapartida para compensar essa elevação. Acho que a elevação deve ser gradativa, assim como acredito na possibilidade de um gradativo reembolso quando a situação econômica do Estado do Rio estiver revertida e equilibrada.
Folha — As votações estão contando com protestos na área externa da Alerj. Com as redes sociais, críticas e elogios se multiplicam em questão de horas. Até que ponto o senhor acredita que elas vão interferir na votação de alguns parlamentares neste cenário?
Bruno — Eu espero que os deputados escutem os movimentos sociais. Hoje, o eleitor acompanha em tempo real a nossa postura política, que fica arquivada e não é esquecida. Acolher para o debate a opinião popular é bom para o eleitor, que se sente representado, e para o político, que divide responsabilidades. Meu voto é minha digital e sempre estarei na Alerj para lembrar o que diz a voz das ruas.
Pudim — O parlamento é a casa do povo, nós somos seus representantes legítimos, recebemos suas demandas e votamos mediante a necessidade do coletivo. As manifestações são legítimas e fazem parte do processo democrático, só não concordo com o vandalismo. Analiso que os deputados irão votar conforme a necessidade da população, respeitando as críticas e cobranças. Não há como agradar a todos, o remédio é amargo, mas necessário.
Gil — Os protestos são pertinentes, legítimos, são um direito da população. Mas, também acredito que os deputados já tenham traçado seu caminho. As votações estão acontecendo com base na serenidade e no bom senso, a fim de contemplar a maioria da população. Há muitas pessoas de bem nos protestos. Vamos em frente, porque teremos muitos discursos emblemáticos ao longo do mandato e, digo mais, estaremos juntos, brigando pela nossa classe, mas não com discursos raivosos na Tribuna e, sim, nos bastidores para que avancemos com passos concretos a favor da nossa população, dos servidores públicos e, principalmente, da nossa Polícia Militar.
Peixoto — Isso não me preocupa, faz parte do processo democrático. Já passei por isso em 1996 e 1997, nas outras privatizações, e sou o único deputado daquela época em evidência, continuo lá, sem tremer. Tenho meu trabalho de base e aqueles que me conhecem acreditam em mim e nas minhas ações. Não perco tempo falando mal de ninguém, faço o meu trabalho.