Arthur Soffiati - Por uma história das baixadas fluminenses (I)
* Arthur Soffiati - Atualizado em 03/11/2023 11:05
O recorte progressivo que resultou no que hoje conhecemos como estado do Rio de Janeiro começou no século XVIII, com a capitania do Rio de Janeiro, resultante da fusão da capitania de Paraíba do Sul com parte da capitania de São Vicente. Esse recorte incluiu quatro áreas expressivas de planícies costeiras: Sepetiba, Guanabara, Araruama e Goitacá. Além dessas, formaram-se pequenas planícies costeiras no sul fluminense, geralmente na foz dos pequenos rios. Em 1934, Hildebrando de Araújo Góes redigiu um relatório para fins de intervenção nas planícies, examinando as quatro principais e mostrando que a maior delas é a Goitacá (“Saneamento da Baixada Fluminense”. Rio de Janeiro: Comissão de Saneamento da Baixada Fluminense, 1934). Tem lógica: ela foi formada pelo rio Paraíba do Sul, o maior dentro do recorte do estado, juntamente com o mar. Em grande parte, ela é formada por sedimentos carreados da zona serrana com arremate de areia aportada pelo mar.
Devia haver área continental antes dessas planícies do Holoceno, época atual. A linha do mar era então bem mais recuada. Várias ilhas costeiras ligavam-se ao continente. Entre 7 mil e 5 mil anos, o nível do mar subiu e submergiu terras até então emersas. Depois, recuou até se estabilizar na linha costeira atual. Já existem estudos pormenorizados sobre esse processo de transgressão-regressão marinha e retrogradação-progradação continental. Menciona-se, sobre a planície Goitacá, “Geologia do Quaternário costeiro do litoral norte do Rio de Janeiro e do Espírito Santo”, de Louis Martin, Kenitiro Suguiu, José Maria Landim Dominguez e Jean-Marie Flexor (Belo Horizonte: CPRM, 1997). O estudo da história das planícies costeiras deve incluir conhecimentos básicos de sua formação natural.
Consideremos também que essas planícies criaram espaço para a expansão dos povos nativos do Brasil. Sendo extensas áreas úmidas, a vida proliferava nelas. Os muitos rios e lagoas constituíram ricos ambientes. Nos estuários, formaram-se pujantes manguezais. Em todos esses ecossistemas, pululava vida. Se as sociedades que habitaram as planícies desenvolveram um modo de vida semissedentário, não era por preguiça ou incapacidade intelectual de construir culturas mais elaboradas. Em “O homem e a restinga”, Alberto Ribeiro Lamego tentou demonstrar que a restinga inibiu a criatividade e a atividade humanas, mesmo dos colonos europeus (“O homem e a restinga”. Rio de Janeiro: IBGE/Conselho Nacional de Geografia, 1946). Por outro lado, a parte aluvial da planície Goitacá teria estimulado tanto os nativos quanto os europeus na criação de uma civilização própria (LAMEGO, Alberto Ribeiro. “O homem e o brejo”. Rio de Janeiro: Conselho Nacional de Geografia, 1945). Nada disso aconteceu. Em ambos os territórios, os nativos desenvolveram modos de vida paleo-neolíticos devido à fartura de recursos.
Cabe ressaltar que a colonização europeia da América começou pelas planícies costeiras. Elas tanto assustavam, como no caso da planície Goitacá, por medo dos povos nativos e da natureza hostil, quanto atraíam pela facilidade de encontrar portos, contatos amistosos e recursos para explorar, como no caso das planícies de Araruama e do Rio de Janeiro. Pelos estuários ou por caminhos terrestres, colonos europeus alcançaram a zona serrana a partir de fins do século XVII.
As ordens religiosas tiveram papel preponderante na colonização das planícies costeiras, sobretudo a dos Jesuítas. Esses missionários fundaram conventos e igrejas nas planícies que atuavam na catequese de nativos e população pobre, assim como na atividade de drenagem. As fazendas de Muribeca, do Colégio, de Campos Novos e de Santa Cruz atestam ainda hoje a importância desses religiosos na colonização das planícies, com a drenagem periódica delas para o desenvolvimento de atividades agropecuárias. Quando eles foram expulsos do império colonial português pelo Marquês de Pombal, em 1759, essas áreas ficaram quase abandonadas. Sob o cuidado de proprietários rurais e de câmaras municipais, as planícies foram recuperando sua feição natural.
Um dos maiores informantes dessas planícies foi o capitão de infantaria e cartógrafo Manoel Martins do Couto Reis. Ele passou dois anos cartografando a planície goitacá, atividade que resultou numa obra monumental (“Descrição geográfica, política e cronográfica do Distrito dos Campos Goitacazes”. Campos dos Goytacazes: Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima; Rio de Janeiro: Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro, 2011). Existem alguns manuscritos dele sobre o distrito Goitacá que bem merecem publicação. Ele foi designado para dirigir a Fazenda Santa Cruz, na planície de Sepetiba, e deixou um relatório primoroso sobre ela. Outros cartógrafos mais também nos legaram cartas elaboradas da capitania do Rio de Janeiro.

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