Alcimar Chagas - Contribuições para a transformação socioeconômica no território fluminense
Alcimar Chagas - Atualizado em 30/10/2022 10:33
Neste momento tão importante para a sociedade brasileira, em que a polarização política divide o país, acentuam-se as discussões acaloradas de pouca efetividade para o bem-estar da população. Porém, representa substancial oportunidade de reflexão sobre os verdadeiros caminhos que levam à transformação socioeconômica.
Este ponto de partida nos leva em direção à problemática da questão, a qual materializa elementos inibidores do avanço das políticas públicas voltadas para o aumento da produção, aumento do emprego, aumento da renda, redução da desigualdade social, redução da pobreza etc.
As fraquezas indicadas ocorrem no contexto da visão deturpada de que a solução para os graves problemas socioeconômicos do país depende, exclusivamente, das políticas macroeconômicas advindas do Governo Federal. Uma visão simplista, já que as mesmas políticas (cambial, fiscal, financeira) não chegam com a mesma dimensão em todos os territórios da nação. Tal fato fortalece a ideia de que jogar o foco somente para Brasília é um erro grave que alimenta a desigualdade e a pobreza.
Observem que, especialmente, as políticas de fortalecimento do comércio exterior privilegiam estados exportadores em detrimento dos não exportadores. Podemos confirmar esta afirmativa com os dados relativos a 2021. A parcela equivalente a 55,45% das exportações do país foi concentrada em 14,81% dos estados brasileiros com participação individual acima de 10% (São Paulo - 19,31%; Minas Gerais - 13,70%; Rio de Janeiro - 11,89% e Pará - 10,55%).
Já os outros 41,16% das exportações foram concentradas em 37,04% dos estados com participação abaixo de 10% até 1% (são 10 estados). Porém, os últimos 3,5% das exportações são geradas por 48,15% dos estados com participação de menos de 1% (são 13 estados).
Estes indicadores deixam evidente que uma política de desenvolvimento com foco no comércio exterior, por meio do gerenciamento do câmbio, não garante um maior equilíbrio entre os estados e, consequentemente, a redução da desigualdade social no país.
Por outro lado, uma política fiscal alimentada por fluxos financeiros também deixa dúvidas. O caso da política de distribuição de royalties e participações especiais da produção de petróleo, que nos últimos 20 anos irrigou de forma substancial os orçamentos dos municípios produtores, especialmente nos estados Rio de Janeiro, Espírito Santo, comprovam que esse incremento alimentou um substancial aumento do custeio. A referência da Bacia de Campos, como produtora de petróleo no país, é incompatível com a letargia econômica dos municípios beneficiados pelas rendas oriundas da mesma atividade. Veja (RIBEIRO, Alcimar 2020).
O mesmo autor analisou a trajetória da bacia Petrolífera de Campos, o padrão de dependência orçamentária dos municípios produtores às rendas petrolíferas e o declínio da produção e produtividade a partir de 2009, quando a bacia atingiu o seu ponto de inflexão com 87% da produção de petróleo do país.
Os resultados da análise confirmaram a hipótese de ineficiência da gestão pública e a ausência de planejamento na indução de uma melhor dinâmica econômica real no território. Como reflexo, observou-se a perda da capacidade de investimento tanto na região, quanto no estado do Rio de Janeiro.
Nesse paradoxal ambiente de exuberante fluxo de capital, desperdício e retração econômica, as atividades tradicionais da agropecuária são acentuadas como alternativa ao petróleo. Porém, os discursos repetidos não apresentam nenhum teor inovativo, condição esta que aborta as mesmas possibilidades, mesmo antes de sua implementação.
É neste contexto que surge, no âmbito da Universidade Estadual do Norte Fluminense (Uenf), o Núcleo de Pesquisa Econômica do Norte Fluminense (Nuperj). A instituição tem como objetivo motivar o debate econômico sobre o Rio de Janeiro e seus territórios, a partir da organização de dados e pesquisas científicas que possam apoiar a formulação de políticas públicas.
Entendendo que o combate à pobreza e à desigualdade passam por uma maior dinâmica do sistema econômico, a estratégia de planejamento da ampliação da oferta de bens e serviços deve ser priorizada.
Neste caso, está em construção uma estrutura analítica que visa a explicar os fundamentos do desenvolvimento local/regional. Trata-se de um modelo piloto, com diagnóstico a partir dos estudos elaborados pelos técnicos do Comitê da Bacia Hidrográficas do Baixo Paraíba do Sul e Itabapoana, cujo foco é a utilização dos recursos hídrica dos canais (Muriaé, Vigário, Paraíba do Sul, São Bento e Coqueiros) para irrigação agrícola ao longo do território.
Diversos elementos inovativos estão inseridos na presente estrutura. Inicialmente, o mapeamento dos recursos locais como vantagens comparativas e a incorporação de conhecimento na busca do padrão de vantagem competitiva, em substituição a ideia de vocação econômica.
Em um passo adiante, a unidade de produção mesoeconômica extrapola a visão micro, que apresenta dificuldades em relação a escala, planejamento, gestão, produtividade, uso de tecnologia e logística. A mudança é mais efetiva para o sucesso do território e da organização coletiva.
Entretanto, é preciso considerar o problema da confiança como gargalo importante do processo. A contribuição inovativa é o avanço do capital social (capacidade de cooperação e reciprocidade entre os atores envolvidos), a partir da implementação da metodologia da Pesquisa Ação.
Complementa o esforço a aplicação do método da Tríplice Hélice, materializada na integração entre a universidade-governo-empresa, a qual tem a responsabilidade de instituir uma estrutura de governança responsável por identificar e solucionar gargalos inibidores da competitividade regional. Esse processo de reestruturação dá vida aos elos de cadeias produtivas, responsáveis pela geração de trabalho para diferentes níveis de escolaridade, renda e bem-estar da sociedade.
Esta visão sistêmica no âmbito do desenvolvimento local permite a redução da desigualdade social, em função da integração multi e interdisciplinar e instituições de interesse que buscam um objetivo comum.
Essas contribuições são fundamentais para a transformação socioeconômica do território fluminense, já que o aprendizado coletivo possibilita, além da competitividade das atividades tradicionais, uma maior capacitação dos trabalhadores e empresas para a absorção de externalidades positivas, oriundas dos grandes projetos exógenos.
*Alcimar das Chagas Ribeiro, economista, professor da Uenf, diretor do Nuperj e membro da Academia Campista de Letras (ACL)

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