Dora Paula Paes e Joseli Matias
31/03/2023 17:46 - Atualizado em 03/04/2023 18:35
A pressão da vida dupla mantida há oito anos por Diogo Viola de Nadai, 39 anos, com a esposa e com Letycia Peixoto Fonseca, 31 anos, é considerada pela 1ª Promotoria de Justiça de Investigação Penal de Campos como possível motivação do assassinato da gestante e do seu filho, Hugo, no dia 2 de março (2), no Parque Aurora, encomendado por R$ 5 mil. Após a conclusão do inquérito policial, o Ministério Público (MP) apresentou, nessa sexta-feira (31), a denúncia contra quatro dos cinco presos por suspeita de envolvimento no crime, que completa um mês neste domingo (2). Proprietário da motocicleta usada no homicídio, João Gabriel Ferreira Tavares será colocado em liberdade nos próximos dias, já que não há provas que o liguem ao crime.
De acordo com o promotor Fabiano Rangel, Diogo era uma pessoa casada no civil e na igreja e extremamente moralista, e não pensava em se separar, mesmo após se envolver com Letycia. “Ele conheceu a Letycia e começou a ter uma vida dupla, que era ocultada da esposa, da própria Letycia, dos familiares de ambas e dos seus próprios familiares. Os pais do Diogo não chegaram a conhecer a Letycia, nem saber da gravidez, que agravou ainda mais a situação dele. E com a gestação já no final, o Diogo decidiu que matar a Letycia seria a única saída para o problema dele. E foi isso que aconteceu. Se a Letycia tivesse o filho, ele com certeza teria que revelar tudo aos seus pais e à esposa, o que levaria à separação e à partilha patrimonial”, explicou.
O juiz Adones Henrique Ambrosio Vieira acatou a denúncia contra Fabiano Conceição Silva, suspeito de ter atirado na vítima; Dayson dos Santos, que pilotava a moto usada no crime; Gabriel Machado Leite, apontado como interlocutor; e Diogo, companheiro de Letycia e pai do filho dela, suspeito de ser o mandante do assassinato. Eles responderão por homicídio triplamente qualificado contra a Letycia e o Hugo e, ainda, por tentativa de homicídio triplamente qualificado contra a mãe da gestante, Cintia Pessanha Peixoto.
A pedido do MP, Gabriel teve a prisão preventiva convertida em domiciliar, com uso de tornozeleira eletrônica, principalmente, pelo fato de possuir três filhos menores com graves problemas de saúde e, ainda, por ter confessado sua participação e revelado importantes detalhes sobre a dinâmica do crime, que contribuíram com as investigações.
Os outros três denunciados tiveram as prisões temporárias convertidas em preventivas, para garantir o andamento do processo e evitar risco à vítima Cintia e também às testemunhas, incluindo a esposa de Diogo, que afirma ter medo do acusado e que foi constrangida por ele a mentir no primeiro depoimento, para que não corresse risco de vida. Segundo a denúncia, Diogo tentou obstruir as investigações, manipulando testemunhas e destruindo provas, pois não havia entregue à polícia seu segundo celular, chegando a realizar pesquisas de como resetar um Iphone e apagar o Icloud.
O MP afirma também que há risco de fuga de Diogo, que possui negócios escusos e diversas fontes de renda, pois, além de servidor público, é empresário e possui casa de pôker, utilizando-se de dinheiro vivo por se tratar de jogo de azar, além de ser oriundo de outro estado e possuir parentes no exterior. De acordo com o promotor Fabiano, as investigações vão prosseguir, para analisar outros crimes, sem prejuízo da descoberta de outros partícipes.
Na decisão, o juiz Adones Vieira deferiu, ainda, o pedido cautelar de bloqueio de valores para garantia de indenização da vítima, limitada à quantia de R$ 3.254.160, e designou audiência de instrução e julgamento para o dia 18 de maio deste ano.
— Um dos presos será posto em liberdade, porque o trabalho de investigação não conseguiu produzir provas que possibilitassem a imputação dos crimes a ele, que seria o João Gabriel, proprietário da moto. Então, a gente está pugnando pela liberação do João Gabriel, que deve acontecer nas próximas horas ou nos próximos dias. Os demais estão sendo denunciados hoje ainda — informou o titular da 1ª Promotoria de Justiça de Investigação Penal, Fabiano Rangel.
De acordo com ele, muitas vezes o Ministério Público acaba entendendo que a classificação delitiva é um pouco diversa da que foi dada pela autoridade policial. “Então, neste caso, a gente entende que os réus devem responder pelo crime de homicídio triplamente qualificado contra a Letícia, tentativa de homicídio triplamente qualificado contra a mãe dela, a Cíntia, e a gente entende também que houve homicídio triplamente qualificado contra o menor Hugo, que acabou nascendo em virtude das agressões e logo depois morreu por conta da aceleração do parto. Ao atacarem uma mulher grávida de oito meses, os assassinos sabiam claramente que a agressão significaria ou o aborto ou a morte, caso houvesse o nascimento prematuro desse feto. É o que se fala no direito em dolo alternativo. Ou seja, a intenção foi premeditada com o objetivo de causar ou o aborto ou a morte da criança, e efetivamente causou o segundo”, ressalta Fabiano.
O promotor explica, ainda, que, além dos agravantes e das qualificadoras para cada crime, tem uma causa específica de aumento de pena, previsto no parágrafo 7º do artigo 121, inciso um, que é o fato de praticar homicídio contra gestante, assim como tem diversos agravantes do artigo 61 do Código Penal. Segundo Fabiano, as investigações vão prosseguir, para analisar outros crimes, sem prejuízo da descoberta de outros partícipes.
Nesta semana, Diogo foi colocado frente a frente com Gabriel Leite durante uma acareação no Ministério Público para confrontar inconsistências nos depoimentos, mas decidiu ficar calado, enquanto Gabriel confirmou ter sido contratado pelo professor para fazer a ponte com os executores do crime, que chegou a ser tentado no dia 31 de fevereiro e 1º de março, antes de ser consumado no dia 2. O comportamento adotado pelo Diogo na semana do homicídio, com frequência atípica na instituição na qual trabalhava, reforça a suspeita de que o companheiro da vítima tentou criar um álibi para acobertar a sua participação no crime.
O crime
Letycia, grávida de sete meses, estava no carro da empresa em que trabalhava conversando com sua mãe, que estava do lado de fora do veículo, na rua Simeão Scheremeth, quando, por volta das 21h, as duas foram surpreendidas por dois homens em uma moto, que pararam ao lado do automóvel. O carona disparou diversos tiros na direção da gestante, que foi atingida na face, no ombro, na mão esquerda e no tórax. A mãe de Letycia, por instinto, correu em direção aos criminosos, momento em que foi atingida na perna esquerda.
Na hora do crime, Letycia deixava a tia-avó Simone Peixoto, de 50 anos, em casa, após um passeio de carro que fazia sempre com ela para acalmá-la. No banco do carona, Simone, que tem Síndrome de Down, ficou coberta de sangue, e agora está em estado de choque.
Mãe e filha foram socorridas pelo tio da gestante e levadas para o HFM, onde Letycia morreu logo após dar entrada. Uma cesariana de emergência foi realizada e o bebê transferido para a UTI neonatal da Beneficência Portuguesa, mas ele não resistiu e morreu horas depois. Os corpos de Letycia e do filho foram sepultados no dia 3, no Cemitério Campo da Paz, onde Diogo chegou a carregar o caixão do bebê.