O Coppam é um conselho que tem como obrigação "regimental" a independência. Por isso mesmo, a composição deve ser o mais plural possível e contar com representantes de diversos setores da sociedade, incluindo governo, cultura e classe empresarial. O objetivo primeiro do órgão é a preservação do patrimônio histórico, e as questões decididas no Coppam são feitas através do voto — e assim devem ser respeitadas pelo colegiado.
Mas o que se viu nesse domingo, no Museu Histórico — que deveria ser apenas de palestras, discussões propositivas sobre política de preservação patrimonial e eleição dos novos conselheiros — foi uma tentativa de tumultuar o processo. Representantes de setores que não participavam ativamente do órgão anteriormente, pleitearam cadeiras e acusaram a comissão eleitoral de não permitir a participação deles.
A eleição para os membros do Coppam aconteceu ao final da Conferência, onde foram cumpridos os ritos definidos pela Comissão Eleitoral. O bate-boca começou quando houve a definição de quais entidades concorreriam classificadas como "culturais", e quais seriam “empresariais”.
Conversando com esse espaço, a presidente do Coppam, professora Auxiliadora Freitas, que também preside a Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima (Fcjol) — representando o governo, portanto —, disse que está “estruturando todo sistema de cultura de Campos”, e que o Coppam “não possui regimento interno, que deve seguir a legislação de 2013”.
— Organizamos a conferência com base na lei (Lei Municipal 8.487, de 2013), e o Coppam fez um esforço durante o ano para dar mais representatividade ao órgão. Diferente do que era antes, onde o setor empresarial ficava com três cadeiras, das seis disponíveis para a sociedade civil, e todos os outros segmentos culturais e das universidades ficavam com o restante, abrimos nesse processo eleitoral para maior representatividade da cultura. Precisávamos dar mais representatividade aos setores culturais, e assim todas as instituições do setor poderiam ser candidata. — disse Auxiliadora.
Uma das instituições que saíram do processo sem uma cadeira e contestando o resultado foi a JCI, antiga Câmara Júnior. Também conversando com esse espaço, o presidente eleito da JCI, Alonso Barbosa, disse que não houve a “inserção da JCI no quadro das entidades concorrentes para uma vaga”:
— Mesmo tendo expedido um ofício com todos os dados pedidos no edital, não conseguimos concorrer. Nos inscrevemos para a área da cultura, pois era onde a gente mais se enquadra, visto que nosso Estatuto diz que também somos voltados para a cultura. De início, conseguimos concorrer, mas por decisão exclusiva da Comissão Eleitoral, que foi totalmente parcial, ficamos concorrendo junto com a CDL, ACIC e outras entidades empresariais. Indo para a concorrência com essas entidades empresariais, perdemos qualquer chance de ter uma cadeira no Coppam. A maioria (das entidades) foi classificada de forma errônea como entidade empresarial, como exemplo a entidade de classe dos taxistas.
Perguntado sobre qual seria o interesse real da JCI em participar do Coppam, Alonso disse a JCI está passando por uma “renovação”, e que a instituição “busca ocupar todos os espaços possíveis de participação na cidade, cumprindo o que preza nossa Carta de Princípios, sermos cidadãos ativos e buscar melhorias para os cidadãos campistas". Alonso citou o uso do Centro histórico de Campos como objetivo: "temos interesse que o centro volte a ser bem frequentado, como eventos a noite, e temos que repensar algumas coisas”.
O que diz a Lei e o Edital
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A Lei Municipal 8487, que rege o Coppam, faz uma única citação sobre o processo eleitoral: “os membros da sociedade civil, representando entidades afins, serão eleitos nas conferências de preservação do Patrimônio Histórico e Cultural, a cada quatro anos” (artigo 5º, § 4).
Em 2018, a mesma lei sofreu alterações na redação, e definiu que quem está na presidência da Fundação Cultural (atua na prática como a secretaria de Cultura de Campos) deve acumular a presidência do Coppam.
Já o edital publicado no Diário Oficial do município em 21/11, determinou que as entidades participantes deveriam “enquadrar sua atuação em uma das seguintes áreas: instituições públicas e privadas de ensino superior; instituições de arte e cultura; entidades de classe, obrigatoriamente de Arquitetura, Engenharia ou Direito; e entidades empresariais.
E ainda decide que: “caberá à Comissão Eleitoral coordenar, padronizar, orientar e definir as atividades relativas à eleição dos representantes da sociedade civil no Coppam”.
Coppam é órgão de preservação do patrimônio, não de uma entidade
A ideia central em compor um órgão colegiado, de pluralidade de representações, é justamente impedir que interesses particulares ou de apenas uma classe se sobressaiam ao interesse coletivo.
É preciso que entidades empresariais sejam o mais transparentes possíveis quando pleiteiam um cargo em um Conselho de Preservação de Patrimônio, principalmente em uma cidade como Campos, que vem destruindo — e deixando destruir — seu patrimônio histórico-cultural.
É preciso lembrar que “interesses comerciais” foram a justificativa para que prédios de grande simbolismo e beleza viessem ao chão. A antiga Santa Casa de Misericórdia (transformada em estacionamento) e o antigo Teatro Trianon (transformado em agência bancária) são exemplos concretos de absurdos em nome do interesse financeiro.
O que não exclui a necessidade de ser sustentável a preservação dos patrimônios. Além do uso cultural, um patrimônio histórico deve ter a capacidade de se sustentar economicamente — ou ao menos ficar às custas do poder público quando o interesse coletivo assim determinar.
O Coppam deve se reestruturar e ser cada vez mais plural e independente. Em casos como o Mercado Municipal, o órgão deixou muito a desejar. Para isso, é preciso construir um regimento que atenda ao interesse coletivo e a preceitos éticos. Interesses particulares não fazem parte deles.