Alberto Ribeiro Lamego, campista nascido em 1896, faleceu no Rio de Janeiro, onde morava, aos 89 anos.
Como pesquisadora em cultura popular, creio na fidúcia das falas como aquela que afirma: “Filho de peixe, peixinho é”. No entanto, Alberto Lamego não foi um “peixinho”, ele seguiu sendo um peixe ao lado do pai, Alberto Frederico de Moraes Lamego, que, embora tivesse nascido em Itaboraí, acredito eu até que por algum erro de cálculo da “dona cegonha”, foi um dos nossos mais notados memorialistas.
Alberto, o filho, viajou com os pais para a Europa e lá estudou em renomadas instituições, mas foi em Londres que concluiu o curso universitário, se graduando em engenharia.
A família retorna ao Brasil ainda nos primeiros anos do século XX, e Lameguinho, como foi carinhosamente conhecido, é admitido no Serviço Geológico e Meteorológico do Brasil, órgão precursor do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o IBGE.
Uma biografia sua publicada na internet nos leva a entender que suas primeiras obras vieram a público na década de 40 do século passado, mas na verdade ele lançou em 1934 “A Planície do Solar e da Senzala”, e já havia publicado um trabalho sobre geologia em 1923.
Nessa obra, ainda como o peixinho acompanhando de perto o pai e tomando dele muitas anotações, ele traçou um perfil de quem viria a ser o Alberto Ribeiro Lamego.
É na planície que ele vê e nos apresenta uma paisagem de lagoas, canaviais e solares que mais tarde será redesenhada pelos engenhos e usinas. É da planície que ele enxerga os cafezais na parte mais elevada do nosso município. É lambuzado de melaço que ele dança com a Mana-Chica e traça longas conversas com os mocorongos e muxuongos em noite enluaradas sopradas pelo vento nordeste.
Com a instalação do IBGE em 1936, Alberto Lamego iniciou um trabalho de pesquisas geológicas que o levam por toda parte do país, em um levantamento minucioso da nossa mineralogia.
Em 1944, publicou “A Bacia de Campos na Geologia Litorânea do Petróleo”, na qual antecipa o potencial petrolífero da nossa região. As prospecções sobre o petróleo na Bahia haviam começado 10 anos antes.
Durante essa temporada de viagens e estudos, ele acumulou conhecimentos importantes que foram publicados especificamente sobre o seu lugar entre os anos de 1946 a 1950. O quarteto de obras “O Homem e o Brejo”, “O Homem e a Restinga”, “O Homem e a Guanabara” e “O Homem e a Serra” é apresentado como composto por “quatro obras sociogeográficas, onde enfoca a geologia do Rio de Janeiro, as escarpas do entorno da Baía da Guanabara e a geologia de Campos dos Goytacazes e da planície costeira”. Nessa série, Lamego se apresenta não apenas como o geólogo, mas também como um sociólogo ou um geo humanista, pois nas obras a paisagem não está como única protagonista, mas o espaço foi posto como palco para a construção da história humana. Contudo, Lameguinho nunca deixou de publicar seus estudos geológicos nas diversas regiões do estado do Rio de Janeiro.
Em “O Homem e o Brejo”, Lamego nos proporciona o conhecimento do nosso lugar. É nessa obra que ele cuida do seu chão, do nosso chão. Aborda a formação dessa imensa planície quaternária trabalhada pelo rio Paraíba do Sul, o domínio indígena da paisagem, a chegada dos colonizadores, a importância do vaqueiro e do lavrador, cujo labor construiu nossa economia. Cada momento histórico foi desenhado sobre uma paisagem própria que acabou por influenciar ações e escolhas.
A obra “O Homem e a Restinga” lhe valeu o prêmio “José Boiteux” — medalha de ouro. Nela, ela empreende um trabalho de conhecimentos sobre a chamada Região dos Lagos, e, sim, perfila os municípios daquele litoral geográfico. Seus recortes são agora entre a enseada, a laguna, o pantanal e a planície. Assim como em sua obra anterior, ele não se descuidou do homem e de suas atividades pesqueiras e salineiras, próprias do lugar focalizado.
Como cartógrafo, o seu trabalho no IBGE foi de significativa contribuição. Devemos a ele muito da configuração limítrofe dos nossos municípios. Porém, essa cartografia foi realizada em gabinete, com poucas visitas ao campo, o que nem combina muito com o seu temperamento humanista.
Porém, esse trabalho resultou em algumas confusões que ainda se fazem presentes no território. Por exemplo, os moradores do município de São Fidélis na região do Parque Estadual do Desengano se reconhecem fidelenses, quando na verdade habitam território campista. Isso acontece, pois as populações não se reconhecem pertencendo a determinadas áreas geográficas, mas sim à região onde acontece a vida social do indivíduo. Contudo, o brilho de seu trabalho é impar.
Entre os anos de 1923 e 1960, Lamego nos presenteou com mais de 40 obras.
Mas não pensem que ele era um homem de claustro, fechado em seu gabinete envolvido por livros e estudos. Não. Foi um homem do seu tempo, vivendo globalizadamente. Vejamos o que diz Alberto Ribeiro Lamego no prefácio que fez em “O Homem e a Guanabara”, publicado em 1964:
“Irresolutos e perplexos estadistas não concebem planos do futuro, e esperançosamente, apenas se deseja que a ilusória Paz não se perturbe.
[...] Na política, opositores tenazes, permanentes, e mesquinharias partidárias antepondo-se à Nação. A insinceridade por princípio, o pistolão por meio e por fim a sinecura. (parafraseando a máxima positivista — O amor por principio, a ordem por base e o progresso por fim) Talentos na penumbra e nulidades em poleiros.
[...] É este o grande drama Presente. O da vigília dos que sentem, e olhando em torno o Mundo, a Pátria, o Estado, o Município, em tudo veem, no desvairo coletivo, o Guia Eterno ausente”.
Mas ele, não sendo um derrotista, nos anima com as seguintes palavras: ”Não é hora de prever, mas de esperar...”.
Alberto Ribeiro Lamego foi a personalidade escolhida em 1986, pelo Departamento de Difusão Cultural de Campos dos Goytacazes, então chefiado pela hoje homenageada professora e minha admirável mestra Diva Abreu Barbosa, como nome de honraria para outros que, como, ele se dedicaram, nas mais diferentes áreas, ao engrandecimento do nome do nosso município.
Coube ao Conselho Municipal de Cultura a difícil escolha para homenagear os nomes ícones da cultura campista nos anos de 2019 e 2020, eles que são: a professora Diva Abreu Barbosa e o jornalista Dr. Fernando da Silveira, e in memoriam o ator e professor Yve Carvalho e o músico e cantor Oswaldo Américo de Freitas, o nosso Dom Américo.