Matheus Berriel
28/09/2021 18:22 - Atualizado em 29/09/2021 08:30
“O corpo a morte leva / A voz some na brisa / A dor sobe pras trevas / O nome, a obra imortaliza”. Os versos de “Súplica”, música composta por João Nogueira e Paulo César Pinheiro, encaixam perfeitamente nas homenagens póstumas ao artista plástico e arquiteto João de Oliveira, que morreu em 24 de maio, aos 65 anos. Do próximo dia 7 até o final do outubro, muitos dos seus trabalhos poderão ser vistos pelo público em uma exposição no Galpão da Arte da Femac Móveis, em Campos. A mostra é assinada pela arquiteta Martha Mignot, em curadoria conjunta com a viúva de João, Cláudia Oliveira. Filho do homenageado, o designer Uno de Oliveira colabora com a programação visual da mostra, sendo responsável também pelo texto de abertura.
— A importância da realização dessa mostra sobre a vida e a obra de João de Oliveira é muito grande. Ele foi um dos maiores artistas que a cidade já teve nos últimos tempos e deixou um acervo muito grande e importante. Estou selecionando, junto com a Claudinha e o Uno, que mora no Rio, algumas obras que representam as diversas fases do seu trabalho — afirma Martha Mignot, que era amiga do homenageado.
Conhecido como João do Índio graças ao sucesso da sua exposição “Índios”, que ocupou o Copacabana Palace, no Rio de Janeiro, e a Marsham Gallery, em Londres, em 1985, o campista também teve outros trabalhos com destaque nacional e internacional. Expôs, por exemplo, no Salão de Artes Contemporâneas do Museu do Louvre, em Paris, por duas vezes, e também em outros países, como Itália e Alemanha. Em Campos, fez várias mostras sobre a essência indígena, tendo como espaço mais frequente o Palácio da Cultura.
— João era uma pessoa que tinha muita força no seu traço. Além de “Índios”, fez “Criancices”, fez uma obra sobres músicos, começou a fazer um trabalho de perspectivas. Trabalhou no Rio, fez arquitetura, depois veio para Campos e conseguiu viver de arte, uma coisa que é difícil nesse país, principalmente numa cidade do interior. O trabalho dele é muito marcante, muito bonito — destaca Martha.
Em fevereiro do ano passado, João chegou a abrir seu próprio espaço, denominado Petit Galerie, onde expôs quadros que compõem uma retrospectiva da sua obra, iniciada no final dos anos 1960. Esta galeria será representada no Galpão de Arte da Femac, com proposta de levar ao público um pouco dos bastidores da produção do campista.
— Ele tem um trabalho bem variado, com giz pastel, óleo sobre tela e outros materiais. Fez uns trabalhos em 3D, tem girândolas... Não são só pinturas, há outros tipos de representação da arte. Acho que o trabalho dele é muito importante. A gente deve muita coisa a esse artista, que foi tão bom. Na exposição, tem muita coisa também do currículo dele em jornais, várias publicações. A gente quer mostrar um pouquinho da vida dele, do ambiente de trabalho, uma reprodução do ateliê dele. Vai ficar bem bonito — adianta a curadora.
A expectativa é a mesma do filho de João, que mora no Rio de Janeiro e integra a equipe de design gráfico da TV Globo.
— Papai deixou uma obra grande. Ele produziu bastante nos últimos anos, e aí tem peças de todas as fases. Há as peças dos índios, peças da fase “Criancices”, peças do período em que fez pinturas dos negros e várias da época do jazz. Então, isso tudo está sendo muito bem cuidado. Minha mãe está junto disso, e principalmente a Martha Mignot, que está colocando muito carinho nisso tudo. Eu estou dando apoio no sentido do conceito. Fiz um texto sobre o meu pai, o que foi bem difícil. Falei sobre o meu pai, a vida e a arte dele. Estou dando apoio moral — comenta Uno de Oliveira.
Para Uno, a exposição no Galpão da Arte pode representar o primeiro passo para uma homenagem maior posteriormente.
— A gente tem a intenção de fazer uma retrospectiva grande do meu pai. Esse seria o primeiro ensaio dessa história. Já conversei com algumas pessoas em Campos. Queria fazer isso no Palácio da Cultura, porque o Palácio sempre foi o palco dele. Me lembro de, quando criança, estar ali presente nas exposições dele. Não sei se existe um artista em Campos que expôs mais no Palácio da Cultura do que ele. Inclusive, o velório dele foi no Palácio da Cultura, porque não existia lugar mais oportuno. Então, eu tenho a intenção de, um dia, fazer uma grande exposição com quadros que estão disponíveis para venda e quadros que já estão nas casas de muitas pessoas. Papai fez um trabalho muito grande, tem muita obra com muita gente. A ideia é fazer um trabalho de pesquisa para achar esses quadros, identificar as fases do seu trabalho. E fazer essa homenagem a ele agora é muito importante. Para mim, é um ensaio do que pode vir para o futuro. Ele merece ser homenageado da melhor forma possível e, com certeza, está feliz, em algum lugar, vendo a gente se movimentando desta forma — enfatiza.
Amiga e admiradora de João de Oliveira, a historiadora Sylvia Paes é outra que está preparando um texto para lembrar a trajetória do artista durante a exposição na Femac.
— João é de uma fase de jovens artistas campistas que ousaram nos suportes, nos materiais e nos temas. Disseram um não às paisagens de Parreiras, às marinhas de Cassiano, aos casarios de Denanci e de Barroso. Foi mesmo uma opção pelo novo — recorda ela. — Mas, sem dúvida, o melhor trabalho do João não foi solitário, foi construído junto com Claudinha, não apenas sua namorada, mas companheira e cumplice. Essa obra foi o Uno, que lhe ofereceu a pequena Liz de presente — complementa.
A “Exposição em tributo à vida e obra de João de Oliveira” será aberta às 19h do próximo dia 7. Até 30 de outubro, será possível visitá-la em horário comercial: de segunda a sexta-feira, das 9h às 18h, e também aos sábados, das 9h às 13h. Idealizado pelo empresário Edvar Júnior, atual vice-presidente da Câmara dos Dirigentes Lojistas (CDL) em Campos, o Galpão da Arte funciona em uma área de 150m² na Femac Móveis, à avenida Alberto Lamego, 973, no Parque Califórnia. Até o momento, este é o único espaço aberto pela iniciativa privada voltado à exposição de trabalhos artísticos da região.