O western é um gênero influente dentro do cinema dos Coen. Desde seu primeiro longa, os irmãos empregam elementos do gênero, seja na construção de suas histórias ou no desenvolvimento de seus personagens. Mesmo que futuramente eles tenham refilmado de fato um western clássico, “Onde os fracos não têm vez” é definitivamente o grande western realizado pela dupla.
Baseado no livro de Cormac McCarthy, o filme é uma modernização dos westerns, para tempos atuais, em um universo extremamente violento e cheio de desesperança. Com um humor ácido e inesperado e diálogos afiados (características comuns do universo dos Coen), os irmãos adaptaram a obra original com uma certa fidelidade, justificando a escolha de a obra ser a primeira adaptação da dupla.
O filme conta a história de Llewelyn (Josh Brolin), um caçador que, sem querer, encontra os restos de uma transação de drogas que deu muito errado e, junto ao cenário de morte e violência, se depara com uma mala com muito dinheiro. Essa situação o torna alvo de uma caçada, onde ele passa a ser perseguido por gangues de traficantes e pelo implacável e impiedoso assassino Chigurh (Javier Barden).
Paralelo ao rastro de violência deixado pela situação, o xerife Ed Tom (Tommy Lee Jones) busca ajudar Llewelyn, resolvendo a situação, enquanto, já no final da sua vida, busca entender como tudo mudou e transformou aquela região em um cenário de guerra e violência.
Com o título original de “Onde os velhos não têm vez” (uma mudança aparentemente pequena, mas que faz muito mais sentido dentro da obra), o filme traz essa história de caçada e sobrevivência em torno de uma mala de dinheiro para ilustrar a situação envolvendo drogas e dinheiro na região, enquanto o xerife tenta ressignificar seu lugar naquele mundo, buscando compreender onde foi que tudo se perdeu.
Narrando a jornada de três personagens em torno daquela situação, o filme trabalha o conceito da aleatoriedade do destino na vida das pessoas. Esse conceito é trabalhado no código pessoal muito peculiar do assassino Chigurh. Retratado como uma personificação do mal, são os diálogos com o frio assassino que trazem essa ideia, que é reforçada sobre como Llewelyn se envolve na situação e principalmente no desfecho do assassino.
Trabalhando aquele universo de forma crua, os Coen não fazem uso de nenhum tipo de trilha sonora; trabalham apenas sons diegéticos (que fazem parte do universo do filme), uma escolha que ressalta a tensão nos sons mais simples (a cena do papel de bala é perfeita para ilustrar esse efeito) e torna a violência do filme ainda mais impactante, em um trabalho sonoro primoroso.
Repetindo a parceria com Roger Deakins (diretor de fotografia de quase todos os filmes dos irmãos), os realizadores trabalham uma paleta de cores que ressalta o desgaste daquele universo. Com uma decupagem minuciosa, são os movimentos de câmera e a montagem certeira dos irmãos que constroem a tensão durante todo o longa, fugindo das muletas técnicas e tornando a experiência poderosa.
Com um desfecho anticlimático, que não só quebra as expectativas, como muda o ponto de vista da história (uma decisão corajosa, que prova a preocupação dos Coen com sua narrativa e não com a construção de um espetáculo), o filme encerra com um diálogo aparentemente banal, mas cheio de simbolismos, que escancara o tom de desesperança e pessimismo da obra.