Joseli Matias
24/07/2021 09:03 - Atualizado em 24/07/2021 11:06
Em meio à crise, a esperança vem do campo, cujas terras alimentam desde as famílias de pequenos produtores rurais até as caldeiras da indústria sucroalcooleira e refletem a retomada de investimentos em Campos. O cenário, entretanto, ainda está aquém do potencial do município, segundo o secretário de Agricultura, Pecuária e Pesca, Almy Junior, que está otimista quanto ao futuro do setor. A aposta na vocação agropecuária foi um dos pontos de consenso entre os especialistas ouvidos na série de painéis realizada pela Folha, no ano passado, para a recuperação da economia.
Com auxílio de maquinário e suporte técnico disponibilizados pela Prefeitura, pequenos agricultores estão expandindo e diversificando a produção. Culturas tradicionais do vizinho São Francisco de Itabapoana, o abacaxi e o aipim têm ganhado espaço nas pequenas propriedades rurais de Campos.
Em contato com a terra desde os 7 anos de idade, quando acompanhava a mãe na lavoura na localidade de Pingo D’água, onde nasceu, o produtor rural Francisco Fortunato, de 63 anos, chega a colher do seu lote no Assentamento Zumbi 4, em Campelo, 100 mil pés de abacaxi por ano, além de mais de 80 toneladas de produtos como aipim, abóbora e melancia.
A produção é vendida nas Centrais de Abastecimento do Estado do Rio de Janeiro (Ceasa), além do fornecimento para merenda escolar nas unidades da rede estadual de ensino. E Francisco tem planos para ampliar os negócios. Seu objetivo é fornecer alimentos para as escolas da rede municipal e, ainda, para o Restaurante do Povo, reinaugurado em maio deste ano.
Francisco se dedica à lavoura (Foto: Rodrigo Silveira)
Francisco se dedica à lavoura (Foto: Rodrigo Silveira)
Francisco se dedica à lavoura (Foto: Rodrigo Silveira)
Francisco se dedica à lavoura (Foto: Rodrigo Silveira)
Francisco se dedica à lavoura (Foto: Rodrigo Silveira)
Na lavoura ou nas vendas, Francisco conta com o apoio da esposa e um casal de filhos. Os frutos garantem o sustento de dois núcleos familiares. Segundo sua filha, Natália Fortunato, de 25 anos, a vida de Francisco é a lavoura. “Ele passa o dia todo na roça, onde planta de tudo um pouco”.
— O que a terra dá eu gosto. Gosto de tudo. Sempre ando com sementes no bolso — conta Francisco, que, além de se dedicar à terra, se envolve com ações solidárias. — Vendo meus produtos e, sempre que posso, faço doações de alimentos a entidades — contou Francisco, que, só no ano passado, doou a colheita de 170 pés de laranja.
A produção leiteira e de derivados é outra força do município que vem do campo. Somente na localidade de Santa Maria, 600 mil litros de leite são produzidos por mês durante a safra e 350 mil/mês na entressafra por 297 produtores que integram a Associação dos Produtores Rurais de Santa Maria de Campos (Aprusmac).
O destino da produção são duas empresas do estado do Rio de Janeiro, a Cavil, que fica no município de Bom Jesus do Itabapoana, e a Italate, em São Fidélis.
Nos planos da Aprusmac está a diversificação da produção para aumentar a receita dos associados. “Em um futuro próximo, pretendemos industrializar nossos produtos e, ainda, instalar o sistema de energia solar para diminuir os custos da produção”, ressaltou o presidente da associação, Leandro Rodrigues Galaxe.
O leite também é a matéria-prima que movimenta a Imbelak, laticínio no Imbé que produz mensalmente 9 toneladas de queijos, movimentando cerca de R$ 500 mil em vendas e gerando oito postos de trabalho diretos e 50 indiretos. Os produtos abastecem churrascarias, churrasquinhos e lojas especializadas em Campos.
A indústria fabrica diversos tipos de queijo, incluindo os derivados do leite de búfala. O principal fornecedor de leite é o próprio dono do laticínio, Paulo Sérgio Guimarães Filho — que tem a maior produção de leite de búfala do estado do Rio de Janeiro, chegando a 800 litros por dia —, mas também conta com outros fornecedores de leite de Campos.
São 17 anos no mercado com a indústria de laticínio, mas o contato com o campo Paulo Sérgio, de 37 anos, tem desde pequeno, quando acompanhava o pai, que também é produtor rural. “Antigamente, meu pai já vinha fazendo o queijo e colocava no comércio que ele tinha. Aí eu peguei, fiz a parte da legalização e fui aumentando. Era pequenininho e foi crescendo, como todo negócio”, contou Paulo, ressaltando que o investimento inicial no laticínio foi de R$ 100 mil.
Laticínio no Imbé (Foto: Genilson Pessanha)
Laticínio no Imbé (Foto: Genilson Pessanha)
Laticínio no Imbé (Foto: Genilson Pessanha)
O empresário afirma que nos dois primeiros meses da pandemia da Covid-19 teve dificuldades nas vendas, mas logo depois a situação se equilibrou e hoje a indústria está a todo vapor e melhorando. “A intenção agora é trabalhar com produtos de valor agregado mais alto, como alguns queijos curados. Já estamos em testes de alguns produtos, como a burrata, que é um queijo tipo italiano”.
O negócio vai de vento em popa, mas ainda tem na qualidade das estradas o maior obstáculo, apesar das melhorias realizadas nos últimos meses. Neste ano, a Prefeitura recuperou, por meio do programa Estradas do Produtor, cerca de 150 km de estradas vicinais e demandou a construção de 43 novas pontes, que são essenciais para o escoamento das produções.
— Estou sempre com o secretário Almy Junior. Ele vem ajudando na questão das estradas e pontes, que é uma dificuldade grande aqui na nossa região. Outro suporte que recebemos da Prefeitura é o selo de inspeção municipal, sem o qual não consigo vender — ressaltou Paulo.
De acordo com o secretário Amy Junior, entre os projetos da Prefeitura para o setor estão, no curto prazo, reconstruir a infraestrutura de estradas e de canais de irrigação; no médio, viabilizar o máximo possível de regularização fundiária; e no longo prazo, ampliar a diversificação rural e melhorar as condições de comercialização, principalmente via restabelecimento de uma Ceasa.
— Entre as ações da secretaria, estamos criando o programa Campos Leite e um programa de agricultura urbana; temos planejado, já no orçamento da União, mais de R$ 13 milhões em equipamentos para atendimento no campo; e temos planejamento para oferta de cursos em parceria com o Senar (Serviço Nacional de Aprendizagem Rural) e a criação da Casa do Produtor Rural, que vai auxiliar os agricultores desde a emissão de uma DAP (Declaração de Aptidão ao Pronaf) até a criação de associações que fortaleçam o setor. Também cadastramos o município no programa Titula Brasil, cujo objetivo é dar a posse de terra aos assentados rurais aqui existentes. Precisamos recriar a nossa capacidade de empreender e olhar para o campo como a nossa maior possibilidade. O nível de abandono no campo, com a ausência de estradas, de pontes, de internet e de assistência técnica, inviabiliza qualquer retomada. Precisamos melhorar sempre e em tudo. E temos que aproveitar nossa potencialidade no agroturismo — ressaltou o secretário.
Reativação da usina Paraíso vai movimentar R$ 150 milhões em 2022
Força produtiva histórica no município de Campos, o setor sucroalcooleiro vem se recuperando nos últimos anos, depois de décadas em crise. E na safra de 2022 terá mais um reforço, com a reativação da produção da usina Paraíso, paralisada no ano passado. A previsão é processar já na próxima safra 350 mil toneladas de cana, gerando um faturamento adicional ao setor que pode ultrapassar a casa dos R$ 150 milhões.
Paraíso se prepara para reabertura (Foto: Divulgação)
Paraíso se prepara para reabertura (Foto: Divulgação)
Paraíso se prepara para reabertura (Foto: Divulgação)
— A Paraíso é uma usina centenária, que sempre operou de forma ininterrupta, mas nesses últimos anos buscou, como forma de sobrevivência do segmento na cidade, estabelecer parcerias. E essa parceria foi contratada com a MPE Agronegócios no ano passado, quando a Paraíso, numa espécie de associação com a usina Sapucaia, deixou de operar para direcionar a cana da região para ela, até que pudesse criar uma escala de produção interessante para a Sapucaia, para num momento seguinte direcionar os investimentos para a usina Paraíso e viabilizar o retorno da operação, com volume de cana que fosse satisfatório para as duas unidades. Essas etapas foram vivenciadas e chegou o momento, então, desses investimentos — ressaltou o proprietário da Paraíso, Geraldo Hayen Coutinho.
De acordo com ele, em função da crise, a Paraíso estava há mais de 10 anos sem investir em atualização de seus equipamentos, sem fazer as reformas adequadas, o que está demandando hoje um investimento muito alto, mas a reforma já está acontecendo, com um programa de investimentos da ordem de R$ 30 milhões.
A reativação da unidade, que neste primeiro ano vai produzir apenas etanol, vai gerar em torno de 250 postos qualificados de trabalho diretos na indústria e, ainda, um estímulo de geração de emprego na lavoura que pode chegar a 1,5 mil novas vagas. “E tão importante quanto comemorar essas novas vagas é registrar que a Paraíso está tendo um projeto futuro que até hoje não foi possível em nenhuma unidade industrial no estado. Nós tínhamos na década de 1970 18 usinas operando em Campos e municípios vizinhos e dessas, 16 usinas fecharam totalmente e não conseguiram o retorno da operação. A Paraíso é a única que está com esse planejamento sendo levado a efeito. Então, é uma façanha a se comemorar, porque, para além das novas vagas, tem a manutenção das vagas que ainda estão sendo trabalhadas nesse período. O que não aconteceu com as outras unidades industriais. Todas as outras usinas fecharam e criaram esse vácuo na vizinhança imediata. A Paraíso está tendo um destino diferente”.