“A arte aproxima as pessoas. Mas, a gente vive numa cidade que parece não reconhecer seus artistas, que não assiste aos seus intérpretes. Uma cidade que vive devorando coluna social, e porque vive se procurando ali. Uma cidade em que os artistas que atuam não vão assistir aos seus colegas de classe, os que escrevem não vão a lançamento de livros, os que fazem música não vão a shows. É tudo muito louco, uma cidade muito doida, e por isso eu chamo de Sucupira. A gente está vendo pessoas de fora, e isso é muito bom, porque há uma troca. Acho extremamente necessário que isso seja feito. Mas, antes de mais nada, e eu não sei qual é o processo, pois não tenho essa mágica, a gente deve dar força, chance e possibilidade de imagem para essas pessoas (da própria cidade). Acho que os festivais nos dão esse presente, nos direcionam a ver a arte. E a arte do nosso quintal não é menor do que a arte do quintal do outro. Então, ela precisa ser regada pela presença, pelo aplauso e pelo reconhecimento. Essa é a importância dos festivais, e é urgente que aconteçam”.
A declaração é da atriz, professora e poeta Adriana Medeiros, clamando pela realização do FestCampos de Poesia Falada e do Concurso Nacional de Contos José Cândido de Carvalho simultaneamente ao Festival Doces Palavras (FDP!), o único dos três já confirmado no calendário cultural de Campos para 2021, em setembro. Na última segunda-feira (19), durante entrevista ao Folha no Ar - 1ª edição, da Folha FM 98,3, a diretora executiva de Arte e Cultura da Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima (FCJOL), Kátia Macabu, disse que existe interesse para que ambos os tradicionais eventos aconteçam, mas ainda não há definições quanto aos detalhes. Consultada pela Folha da Manhã na quarta-feira (21) sobre possíveis novidades, ela voltou a comentar o tema.
— A gente vai realizar o Concurso de Contos e o FestCampos de Poesia Falada. Há até a possibilidade de a gente verificar se poderiam ocorrer no FDP!. Mas, nós ainda não fizemos a programação final do FDP!. Então, ainda não está definido. Nesse momento, ainda não tenho essa definição. Não posso dizer data, nada, porque não está definido como vão acontecer. Para premiação, a gente precisaria ter uma previsão orçamentária, e eu teria que verificar, porque a previsão foi do ano passado. A gente não tem muita possibilidade de premiação, por isso tenho que analisar com nosso financeiro e com a presidente (da FCJOL, Auxiliadora Freitas) — declarou Kátia.
Auxiliadora, por sua vez, disse que um dos projetos integrantes do programa de gestão “Cultura, Campos — com horizonte!” é o de manter ativos os eventos do calendário cultural, como o FDP!, realizado em anos ímpares, e a Bienal do Livro, que tradicionalmente acontece em anos pares.
— Sobre outros eventos, assim que seus planos concretos de realização estejam agendados, os mesmos serão divulgados. Reafirmamos o nosso compromisso com a efetivação dos sete eixos do nosso programa ao longo dos anos. O Concurso Nacional de Contos José Cândido de Carvalho, o FestCampos de Poesia Falada, festivais de bonecos e de músicas estão no nosso radar de prioridades — afirmou a presidente da FCJOL.
Criado em 1989 com objetivo de fomentar a produção literária em Campos, o Concurso de Contos passou a integrar o projeto “O Coronel e o Lobisomem” em 2000, como forma de homenagem à obra do escritor campista José Cândido de Carvalho. A 29ª e mais recente edição aconteceu em 2019, reunindo 376 participantes de todas as regiões do Brasil e que teve como campeão André Kondo, de Taubaté/SP, com o conto “Cerejeira”.
Já o FestCampos de Poesia Falada surgiu em 1999, atraindo poetas nacionais, mas também dando ênfase à produção local. Nomes como Antonio Roberto de Góis Cavalcanti, o Kapi; Adriana Medeiros e Aluysio Abreu Barbosa, este diretor de redação da Folha, fazem parte da lista de vencedores do festival, que chegou à sua 21ª edição em 2019. Nela, foram premiados com o primeiro lugar de cada categoria o niteroiense Alberto Antônio Sobrinho, autor de “New Gothan”, e a campista Lívia Barbosa Prado, que interpretou sua poesia “Cinzas”.
— Durante sua existência, o FestCampos oportunizou muitos invisíveis, como eu, por exemplo, a colocarem à mostra seus talentos. Muitas vezes o talento da escrita, outras também como intérprete. Foi um movimento que deu voz e vez a muitos jovens, criou um intercâmbio formidável entre poetas e muitos contistas. E o Concurso de Contos foi criado para fomentar a criação literária. São pontos importantes e que não podem ser esquecidos — comentou Adriana Medeiros. — Acredito ser tão fácil fazer como no primeiro FDP!, acoplando o Festival de Poesia e o Concurso de Contos nesse evento. Verba para isso há, gente para liderar esses projetos também. Artur Gomes está aí, temos tantas outras pessoas, como Adriano Moura, Analice Martins, a Talita (Batista), enfim, pessoas da área de literatura muito dispostas e que podem estar à frente de maneira imparcial. Mas, a gente precisa, sobretudo, fomentar plateia. Depois dessa destruição que a gente teve nesse período tão doloroso de pandemia, essa vai ser uma coisa com que a gente vai ter que lidar — complementou.
A professora e escritora Analice Martins também é favorável ao retorno tanto do FestCampos quanto do Concurso de Contos neste ano, desde que respeitando as recomendações sanitárias para prevenção à Covid-19.
— É muito bem-vinda a notícia de que o FDP! se realizará no segundo semestre de 2021, adequado às atuais normas de segurança para eventos dessa grandeza. Mais do que nunca, precisamos pensar a cultura e o mundo das palavras como formas de resistência não só à dor, ao luto e ao isolamento impostos pela pandemia de Covid-19, mas muito especialmente como formas de reflexão sobre nosso presente devastador em todos os cenários. Como já nos ensinou o poeta João Cabral de Melo Neto, “um galo sozinho não tece uma manhã” — declarou Analice. — Na esteira dessa boa notícia, que se confirmem também a realização do FestCampos e do Concurso de Contos José Cândido de Carvalho. Precisamos retomar as agendas, acertar os ponteiros desse tempo suspenso — acrescentou.
Os discursos de Adriana e Analice vão na mesma linha adotada pela professora e literata Arlete Sendra. “Os seres humanos são, por natureza, seres de festa. Explicável. Ela, a festa, nos oportuniza encontros não agendados. Nos traz música. E seus fogos, em sons, luzes e cores, acendem o céu. Assim vejo o FestCampos de Poesia Falada. É preciso revitalizar o que um dia, através da palavra, revelou sutilezas da alma e, em ritmos singularmente plurais, coreografou emoções, enquanto sons outros ribombavam pela cidade. Cidade que um dia foi palco das sedutoras artimanhas da dona Esmeraldina, na conquista do Coronel Ponciano de Azeredo Furtado, de amores. Aplausos às iniciativas”, enfatizou Arlete.
Festival Doces Palavras — A única coisa já oficializada quanto aos principais eventos da Cultura campista em 2021 é o retorno da Prefeitura à realização do FDP!, que só aconteceu em 2019 graças à mobilização de entidades e produtores independentes. Neste ano, a FCJOL fará o festival de 15 a 26 de setembro, em parceria com a Associação de Imprensa Campista (AIC) e a Academia Campista de Letras (ACL), que também compõem a curadoria. Chegou a ser estudada a possibilidade de que a programação fosse híbrida, com determinadas atrações presenciais e outras on-line. Porém, diante da ameaça da variante Delta do coronavírus, foi definido que todos os bate-papos e as mesas temáticas serão exclusivamente virtuais, com transmissão no canal de YouTube da FCJOL, abordando temas relacionados aos doces e à literatura campista. Além disso, durante todo o mês deve haver publicações alusivas ao evento nas redes sociais, propostas por outras entidades do município como complemento da agenda temática. Personalidades do setor artístico-cultural de Campos que morreram durante a pandemia da Covid-19 serão homenageadas.
— Perdemos muitos artistas. Então, nós vamos fazer questão de colocar mesas que falem justamente desses artistas que se foram, como Gilberto Assad, João de Oliveira. E também vamos trazer uma mesa para rememorar a história do Kapi, visto que houve uma polêmica recente sobre o anfiteatro do Parque Alberto Sampaio, que leva o seu nome. Então, a gente vai fazer uma mesa para lembrar a atuação de Kapi no teatro de Campos, citar a importância dele. Teremos ainda mesas abordando a jovem literatura, a renovação dos escritores campistas; e o bate-papo etílico, em que vamos homenagear este ano o Ao Gato Preto, único bar tombado pelo Conselho de Preservação do Patrimônio Histórico e Cultural de Campos (Coppam) — adiantou o presidente da AIC, Wellington Cordeiro.