O nascimento de Buda foi cercado de acontecimentos extraordinários, verdadeiramente milagrosos, segundo muitos estudiosos. É na antiga Índia, do século VI a.C., que assinalamos o seu surgimento. Segundo as escrituras budistas, tiveram lugar um terremoto e trinta e dois milagres, incluídos nestes curas de cegos, surdos, mudos e aleijados do país.
Teria Buda existido? Há críticos que põem em dúvida sua existência. É natural que isso aconteça, uma vez que muitas figuras ilustres da História também têm sido postas em dúvida: Homero, Moisés, Zoroastro, Shakespeare, e até mesmo Cristo, além de muitas outras personalidades. Muitos consideram esses vultos históricos como simples convergência de lendas populares, negando-lhes a individualidade real.
No entanto, a arqueologia tem demonstrado à saciedade que a existência de Buda não é fictícia, uma vez que muitos documentos quase contemporâneos da época a que se atribui o seu nascimento têm sido recuperados e estão à disposição dos interessados e estudiosos, em museus e diversas organizações afins.
Buda nasceu no seio de uma família nobre e opulenta. Nada lhe faltou na infância e mesmo na juventude. Segundo o relato dos historiadores foi franzino, apontado mesmo como muito delicado de corpo.
Segundo alguns de seus biógrafos, ele viveu a primeira quadra de sua vida em palácios, e seu pai lhe ocultava todas as cenas de infortúnio e de pobreza, deixando-o na ignorância do sofrimento humano.
A primeira grande atitude que surpreendeu os seus parentes e amigos foi sua histórica e impressionante renúncia. Isso ocorreu logo que decidiu dar um passeio fora da área de seu palácio e visitou lugares de miséria e morte.
Quando tomou conhecimento de espetáculos diferentes de sua rotina residencial, tais como velhice, doenças, cadáveres, e toda sorte de infortúnios, quedou-se profundamente impressionado.
Por mais que os familiares procurassem distraí-lo, tornou-se uma pessoa triste e taciturna.
O conhecimento da miséria do mundo foi uma das causas primordiais de ter renunciado a tudo e tomado a decisão de deixar o lar. Já casado há 10 anos, abandonou a jurisdição paterna e todo o carinho do lar e ausentou-se de todo o conforto de sua vida.
O que causa perplexidade em todos os seus biógrafos é o fato de seu afastamento do lar ocorrer exatamente na semana em que seu primogênito Rahula nasceu.
Viajou para bem longe, despiu-se de suas vestes reais e tudo devolveu, até mesmo seu animal Chandaka. Vestiu uma capa amarela e transformou-se de imediato num monge romeiro, um verdadeiro indigente.
A exemplo de muitos santos canonizados pela Igreja, que usaram o cilício para a sua mortificação ou penitência, Buda passou a alimentar-se em pequenas quantidades, numa espécie de ascetismo, o suficiente para encher a concha de sua mão, e tornou-se extremamente magro.
Percebeu que, através dessa severa mortificação, não lograra atingir o conhecimento e a visão sobre-humana e verdadeiramente nobre. Observou que deveria haver outro caminho para o esclarecimento e que este deveria chegar através de uma mente sã num corpo são. Sentiu que deveria evitar os extremos para encontrar a verdade e que esta deveria estar no caminho do meio, no caminho da temperança, como sentenciavam os romanos: “virtus in medium est”.
O seu famoso primeiro sermão, chamado Sutra do Virar da Roda da Doutrina, é talvez uma compilação de muitos sermões, assim como o Sermão da Montanha de Jesus, segundo alguns estudiosos. Seja como for, o primeiro sermão de Buda contém as verdades fundamentais do budismo, demonstrando ser uma clara descoberta sob a árvore conhecida como Bo. São as chamadas Quatro Verdades Nobres:
Todo o viver é doloroso; o sofrimento advém da cobiça ou do desejo; a libertação do sofrimento advém da cessação do desejo; o caminho para a supressão do sofrimento é através da Senda das Oito Vias.
As oito vias: *Opiniões exatas; *Intenções boas; *Palavras verdadeiras; *Ação reta; *Ocupação digna; *Esforço puro; *Senso exato; *Concentração virtuosa.
No budismo original não encontramos alusões a preces ou cerimônias, a Deus ou a qualquer ser sobrenatural. Alguns estudiosos afirmam que o budismo é, na verdade, uma psicologia filosófica ou uma filosofia psicológica.
Buda formou grupos de seguidores e os enviou ao mundo para pregar a sua doutrina de redenção.
É digno de observação que ele pregava a doutrina da transmigração, embora ela não seja criação sua. Mas, soube desenvolvê-la consideravelmente. Afirmava que os homens já viveram antes e viverão muitas vezes, num samsara de reencarnações quase infinitas.
A libertação do samsara ocorre quando se atinge a Iluminação, o Nirvana, e para Buda a forma de conseguir isto é meditar e seguir o caminho das 8 vias, ou o caminho óctuplo, que corresponde à quarta nobre verdade do budismo. Ele deixou claro que essa é a conditio sin qua non para se alcançar o estado de claridez celestial do Nirvana, isto é, a salvação.
Quando se atinge a extinção de todo o desejo humano, através da melhora gradativa, então se encerra o ciclo de vidas sucessivas e faz-se jus à abençoada paz do Nirvana. A vontade tem um caráter insaciável e cada desejo satisfeito gera um novo desejo, cuja ânsia eternamente ávida alcança limites indizíveis. Por isso, dentro de um contexto moderno puramente econômico, nós, ocidentais, podemos dizer que a evolução em nosso mundo social consiste no aumento de necessidades a serem satisfeitas. No contexto budista, pelo contrário, a evolução da alma consiste na diminuição paulatina dos desejos e necessidades que, em tumulto, assaltam a vida humana.
Não estamos satisfeitos com a nossa existência, sempre aspiramos a algo mais, cheios de desejos e de necessidades a serem atendidas. Nenhum homem se sente perfeitamente feliz. Daí o conceito do nirvana budista.
Segundo essa doutrina, quando um homem de bem se defronta com o sofrimento, a causa pode estar nesta vida ou muito provavelmente numa existência passada, enquanto que homens de vida pecaminosa, quando conseguem safar-se do sofrimento nesta existência, serão punidos em vidas posteriores, inevitavelmente. Essa ideia de justiça é sempre mais bem aceita pelo homem comum, que naturalmente crê que nenhum mal cometido escapará da punição divina, assim como nenhum bem praticado deixará de ser recompensado por Deus. Tal explicação para a origem do mal é sempre mais aceitável do que a que se apresenta levando em conta a unicidade das vidas.
Buda recorria a esta doutrina várias vezes em suas lides doutrinárias. As suas peregrinações levaram-no a aproximar-se de seu antigo lar, e sabe-se da conversão de sua esposa e de seu filho.
Buda faleceu cercado de discípulos, teve seu corpo cremado e seus ossos preservados como relíquia sagrada. Depois de sua morte, ergueram-se templos para a pregação de suas ideias, embora em vida ele sempre fosse contra tais práticas. Hoje é adorado por muitos como um verdadeiro deus, e sua imagem disseminou-se pelo mundo, tanto quanto suas ideias.
Sua pregação era referta de histórias e parábolas, como foi a de Jesus. Conta-se que foi procurado por uma mulher com o filho morto no colo e que procurava remédio para ressuscitar seu filho. Buda a recebeu gentilmente e lhe disse: “Fez bem em procurar-me para obter um remédio para o filhinho morto. Vá à cidade e obtenha uma semente de mostarda daquela casa onde ninguém haja morrido.” Não tinha a mulher visitado muitas casas quando afinal atinara com a proposta de Buda. Foi até o cemitério e deitou o corpo da criança no solo e disse: “Filhinho, eu pensei que a morte veio só para ti e vejo agora que ela é comum a todos.” Voltou-se do cemitério e tornou-se sua discípula.
Era muito grande a sedução que Buda exercia sobre o povo. Embora de origem nobre, ele se transformou em pobre e sua convivência com a indigência era muito evidente, dando-lhe o conforto e o esclarecimento de sua palavra, sem que, todavia, deixasse de exortar a todos sobre a necessidade de seguir as oito trilhas da redenção.
Durante cerca de 40 anos, pregou as suas ideias e preparou um grupo de monges pregadores para disseminá-las e levar bem longe o novo evangelho.
É interessante observar que a Índia foi o berço do budismo, mas, segundo o Censo de 2011, somente 0,7% da população são seus seguidores, o que representa um percentual baixíssimo. A religião que predomina naquele país é o hinduísmo, abrangendo cerca de 80% da população.
O budismo chegou ao Brasil no início do século XX, trazido por imigrantes japoneses. Segundo seus seguidores, essa filosofia milenar tem como principal escopo melhorar nossas vidas.
*Membro da Academia Campista de Letras